Diante do desastre… 10 dicas incertas para escrever apesar de. | Nathália Terra Barbosa e Victoria Cardin Alfano Raposo


Nathália Terra Barbosa[1]
Victoria Cardin Alfano Raposo[2]

 

O que você faria se só te restasse esse dia?
(Billy Brandão e Paulinho Moska, 1995)

Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar!
(Assis Valente, 1938)

 

E agora?!

Se o receio produzido por essa pergunta pudesse ter nome, daríamos o nome de Paranoia – assim como a gata do livro A Extinção das Abelhas de Natalia Borges Polesso, lançado em 2021 pela Companhia das Letras. Gata essa que, mesmo depois de morta, não deixava de aparecer mesmo não aparecendo.

Vi Paranoia passar rápido atrás de uns vasos plásticos vazios. O pote de ração continuava cheio. Chamei. Troquei a ração. Fiz barulho com o saco. Não apareceu. Não apareceria. Mas Paranoia me acompanha. O bicho está sempre comigo. É muito ansiosa. Assustada. Qualquer barulho a faz esbugalhar os olhos e procurar alguma sombra, um rastro. Somos quase uma. A simbiose perfeita do delírio. Eu, desengonçada demais. Como se ela fosse capaz de corrigir o meu desequilíbrio. Uma mulher que é um bicho. Medrosa. Uma coisa avançada demais, uma mutação que ninguém foi capaz de prever: a mulher de quarenta anos; felinos em geral; orangotangos; ciborgues. (Polesso, 2021, p. 204)

E se começamos por esse roubo do livro de Natalia, é porque esse é um texto que poderia iniciar de diferentes formas e seguir por diversos caminhos, de maneira que achamos prudente dizer logo, de pronto, quais questões o animam. 

Esse texto “é descentralizado e sem fechamento [perguntas como onde começa ou termina um Texto? são impossíveis ou mesmo tolas]” (Costa, 2017, p.29). Entre idas e vindas, trata-se de uma tentativa de conversa às voltas com os pensamentos passageiros que nos perpassam em face da iminência do desastre, da inquietante convocação acerca da nossa respons-habilidade em viver e morrer juntos (Haraway, 2023) e dos desafios da escrita nesse mundo em ruínas. Logo, ele não é um texto sobre, mas um texto escrito nas cercanias de (Trinh Min-Ha, 1988), cuja tessitura se desenrola perante o inviável, e que insiste em falar mesmo diante da impossibilidade de dizer. Nele deixamos fermentar interesses interessados em questionar o que fazer quando “aquela invenção velha de mundo colapsou na nossa cabeça” (Polesso, 2021, p. 295). Ou “como se vive quando tudo o que conhecemos cai por terra?” (Polesso, 2021, p. 253). Ou ainda, Como se escreve?

De início, talvez seja prudente também destacar que se trata de um exercício do pensamento que se desdobra em ensaio. Um exercício em teste. É tentativa. Tentativa não de dar conta das perguntas citadas e/ou outras afim que porventura apareçam, mas de experimentar esse “E agora?!” como a questão mais profunda, aquela que “sendo palavra inacabada, apoia-se no inacabamento” (Blanchot, 2010, p. 43), palavra plural “que o fato de declarar incompleta realiza” (Blanchot, p. 43). Enquanto substituição no vazio da afirmação plena, “ela se formula como a questão que não se formula” (Blanchot, 2010, p. 52). Ao se manifestar, permanece fugidia, sendo a fuga uma de suas maneiras de estar presente” (Blanchot, 2010, p.52). Questionar é, portanto, “jogar-se na questão” (Blanchot, 2010, p. 53), uma espécie de convite ao salto no desconhecido, quem sabe até mesmo movido por ele, “o salto, a partir e fora de qualquer firmeza” (Blanchot, 2010, p. 53). Nesse sentido, “a questão é o desejo do pensamento” (Blanchot, 2010, p. 43), e “a resposta é a desgraça da questão” (Blanchot, 2010, p. 43).

E agora?!

1, 2, 3 testando…

Esse texto é ensaio e só e somente só ensaio, já que sem ensaio, não há inspiração. (Corazza, 2008).

(…)

(Leia o ensaio completo em PDF)

 

Recebido em: 15/10/2023

Aceito em: 15/11/2023

[1] Licenciada em Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Educação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).  Email: nathalia_tb@hotmail.com
[2] Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutoranda também pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma universidade. Bolsista CAPES. Email: victorialfano@live.com

Diante do desastre… 10 dicas incertas para escrever apesar de.

 

RESUMO: Esse ensaio experimental escrito a quatro mãos diz de interesses em comum acerca do pensamento e da escrita. Acompanhadas de diferentes intercessores desde a literatura contemporânea brasileira até as ecologias queer, buscamos exercitar um texto que se vê diante do desastre e para tanto se pergunta e agora? O que nos resta? Pensar e escrever? Sem almejar dar conta dessas perguntas ou de outras que porventura possam aparecer, mas também desaparecer, escrevemos apostando em um deslocamento entre pensar diante do desastre, mas também apesar dele. Para tanto elaboramos 10 dicas incertas para escrever apesar de. Tem interesse? Aqui dizemos como!

PALAVRAS-CHAVE: Desastre. Escrita. Pensamento.

 


 

Facing the disaster… 10 uncertain clues to write despite it.

 

ABSTRACT:This experimental essay written by four hands says about common interests concerning thinking and writing. With different intercessors from brazilian contemporary literature up to queer ecology, we look for to exercise a text that sees itself facing the disaster and so it asks what now? What is left for us? Think and write? Without aiming to live up to these questions or many others that can eventually come up, but also disappear, we write betting in a displacement between thinking facing the disaster, but also despite it. Therefore, we elaborate ten uncertain clues to write despite it. Are you interested? Here we tell you how!

KEYWORDS: Disaster. Writing. Thinking.


BARBOSA, Nathália e RAPOSO, Victoria — Diante do desastre… 10 dicas incertas para escrever apesar de.. ClimaCom – Desastres [online], Campinas, ano 10, n. 25., nov. 2023. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/diante-do-desastre/