Desvios do "ambiental"



Dossiê Desvios do “ambiental”

| ano 11, n. 27, 2024 |

Numa música, o que é que mantém junto tudo isto que componho, toco ou ouço? Sem dúvida existe um ponto do qual vale nos afastarmos por algum momento, aquele em que compor é tecer uma sequência teoricamente explicada de efeitos ou gestos ou símbolos ou truques, e buscar um outro modo de ver as coisas…  

(Sílvio Ferraz, 2018, p. 23) 

A Educação Ambiental, embora configure um campo disciplinar em seu modo de funcionamento, aparece nos documentos oficiais da Educação Básica brasileira como tema transversal. Ainda assim, vê-se que muito de sua operação limita-se a algumas áreas consideradas de caráter “ambiental”, e mesmo nelas adquire a forma da informação – é necessário saber sobre a “natureza”, o “ambiente” e suas complexas relações internas para deixar de agredi-los. Entretanto, muitos pensadores ao longo dos séculos XX e XXI criticaram e ainda criticam a ideia desse “saber sobre”, advogando que o saber, por si só, já não garante qualquer transformação. A crise da experiência, já anunciada por Walter Benjamin (2012) nas primeiras décadas dos anos 1900, segue sendo colocada em discussão por autores de distintos campos do saber, das ciências à filosofia e às artes e delas à própria educação, e em todos eles se relaciona de algum modo a uma outra crise, a da informação – a ideia de que basta estar informado sobre as causas e consequências de uma ação ou acontecimento para transformá-los ou evitá-los. Grande parte da comunicação, de acordo com Maurício Lazzarato (2006), normatiza a existência de maneira intencional ao disseminar a informação como um dispositivo moderno que limita a criação de possíveis a uma simples transmissão, agindo no sentido de reduzir o imprevisível e o desconhecido ao já sabido e esperado e inaugurando um novo terreno de luta entre as lógicas e práticas da informação e as da expressão. 

Afastando-se das lógicas informacionais e caminhando em direção às lógicas expressivas, pensadores contemporâneos como Bruno Latour, Lynn Margullis, Ana Primavesi, Ana Tsing, Emanuelle Coccia, Donna Haraway, Estefano Mancuso, Ailton Krenak e tantos outros, todos transitando entre por entre campos distintos do conhecimento, vêm ganhando destaque ao afirmar que é necessário, para além do “sobre”, pensar com, escrever com, fazer com, sentir com, viver com, saber com. O que se coloca como urgência em todos eles é a necessidade de uma mudança no modo de fazer e de pensar que seja capaz de afetar o modo de sentir e de se relacionar com as coisas, e que retire a primazia da informação como redenção dos problemas sociais, ambientais, psíquicos, emocionais, relacionais etc. Entretanto, se a informação, como nos mostram Ana Maria Preve e Guilherme Corrêa (2007), se mostra insuficiente para responder aos tempos em que vivemos por plasmar o pensamento à uma “ecologia de rebanho” moral e simplificadamente recostada na ordem do “sobre” do vivido, há de se pensar o que surge como contraponto. Nesse sentido, a insistência do presente parece exigir uma mudança profunda na sensibilidade, como sugere Franco Berardi (2020), a qual, necessariamente, toca o campo educacional. 

Editoras | Michele Fernandes Gonçalves e Ana Maria Hoepers Preve

Editoração | Susana Oliveira Dias, Larissa Bellini, Leo Arantes Lazzerini e Natan Rafael Neves da Silva

Capa | Grande | Elisângela Mira

Pequenas | Ananda Casanova

 

Leia Mais…

ARTIGOS

Narración y cuidado de mundos: tramas en torno a la fragilidad de la existencia | Carlos Skliar e Pablo Cosentino

A pedagogia da bolsa de sementes | Marilia Mello Pisani

Educação, ecologia, o bem e o mal | Guilherme Carlos Corrêa

Por que não infanciar a educação ambiental? Por corpos que dancem, sintam, descubram, brinquem, imaginem com o mundo | Júlia Flecher de Andrade

Pedagogia da teia: arte e educação como emaranhado afetivo | Daniela Cassinelli e Isabel Carneiro

Uma escola ribeirinha em Manaus/AM e outra em São Lourenço do Sul/RS: reflexões sobre educação ambiental ancoradas na educação dos sentidos e nos estudos da performance | Francisco de Paulo D’Avila Júnior

Cultivando outras relações, outras convivências e outros mundos possíveis: a experiência do Programa de Extensão ConViva! | Aline Campos, Edinelma Alves de Sousa Resplandes, Maria Victória Lima dos Santos e Pedro Lucas Nunes Lopes

Reencantando a educação ao verdejar o aprender: uma experiência sentipensar e agir ecossistematicamente em um jardim sensorial | Mariana Bassetto Peres, Paulo Sérgio Calefi e Gabriela Salvador de Amo


RESENHAS

Desvios ambientais possíveis a partir de um texto literário: uma resenha do livro “A mulher pássaro”, de Carolina Becker | Ariana Sousa de Moraes Sarmento


ENSAIOS

[deserto] imagem, meio e cartografia: notas sobre o movimento e a relação com o não conhecido[1] | Ana Godoy

A ursa: quando uma imagem morde | Camila Benatti Policastro

Farinhar: memórias subterrâneas | Vatsi Meneghel Danilevicz, Romari Alejandra Martinez Montano e Christiana Cabicieri Profice

Cosmopolíticas da polinização: uma ecologia de práticas da flor nas artes da presença | Vinicius Huggy

El nombre de la tierra | Daniela Elisa Alvarez

Em viagem | Lígia Mara Santos e Maria Eliza Chierighini Pimentel

Escrevivendo[1] e registros visuais e sonoros em torno da instalação Them, de Daniel Lie | Marcos Reigota

Imagens invertidas em águas turvas | Ananda Casanova

Diário de muitas alianças: entre crianças e plantas, entre docentes e discentes, entre palavras e imagens | Diogo Pereira de Souza, Fernanda Omelczuk, Wenceslao Machado de Oliveira Jr

Conversas com ecologias e educação infantil: um convite para emaranhar com bebês e crianças num mundo em ruínas | Bárbara de Mello e Natasha Pitanguy de Abrantes

Educação ambiental libertadora e pluriversal: como educar-nos uns aos outros mediatizados pelo mundo de muitos mundos? | Matheus Henrique da Mota Ferreira

A biodiversidade como dupla-fratura: caminhos para o refúgio | Rebeca Verônica Ribeiro Viana, Anne Caroline de Freitas, Gabriel Barco Silva, Paulo Takeo Sano e Ronaldo Andrade dos Santos

A psicologia indisciplinada como uma po-ética na produção de bons encontros | Vitor de Sena Moraes, Jennifer Elizabeth Vieira e André Luiz Strappazzon


FLUXO CONTÍNUO

Amoa hi a Árvore dos cantos como meio para narrativar e aprender a falar com as plantas | Keyme Gomes Lourenço


JORNALISMO

A exposição Cosmopolíticas Vegetais convidou para relações entre múltiplos saberes e plantas | Emanuely Miranda

Entrevista com Astrid Barfod: “O processo criativo requer ruminação da vida” | Wallace Fauth

Crise climática e seus riscos para a saúde | Emanuely Miranda

Corpo-linha-selvagem: uma aposta política perante o Antropoceno | Emanuely Miranda

A Rede Latinoamericana de Divulgação Científica e Mudanças Climáticas participa de residência artística | Tatiana Massaro e Emanuely Miranda

“Experimentando a relação entre a modelagem climática, os saberes indígenas e a ciência do amor” – entrevista com Paulo Nobre | Emanuely Miranda

Caminhos para a descarbonização | Emanuely Miranda


IGBIN OBÀTÁLÁ

O jogo de Ifá e a antecipação de futuros | Faseyi Dada (Oba Oribato)


ENTRE MUNDOS

Quando as palavras se apagam, o que brilha? | Daniela Feriani

Entre mundos ou existências-outras: experiências demenciais e neurodivergentes | Daniela Feriani


PEGADA HÍDRICA

Pegada hídrica | Diana Zatz

Entrevista com Susana Dias | Diana Zatz

Entrevista com Lilian Maus | Diana Zatz

Entrevista com José Antônio Marengo Orsini | Diana Zatz

Entrevista com Yvonilde Dantas Pinto Medeiros | Diana Zatz



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ARTES

Plantas epimecóticas – Phalaenopsis Peregrina | Mateo Jaramillo Velásquez

Fabulações de uma ilha flutuante ou como fazer—com a maré | Bruno Novaes

É demasiado isto, não o bastante aquilo | Gustavo Torrezan

Código y Primigenia | Luz Alvarez e Mateo Jaramillo

Borda como centro | Elis Mira

A carne de Gaia – um dispositivo vivo | Béa Meira, Rayane Kaingang, Larissa Ye’pa, Claudia Baré

Corpo-trilha | Débora Steffen e Guilherme de Abreu Machado

Verdear | Adrián Cangi

Ninho-Território: Abuelas | Flaviana Benjamin

Impactos das queimadas para os animais silvestres no Bioma Cerrado | Kátia Gomes Facure Giaretta, Camila de Paula Teixeira, Bruna Davi Alves, Giovanna Tannous de Sousa, Michel Muiller Pereira, Vanessa Fonseca Gonçalves e Celine de Melo

Em/tre arte(s)aúdes: pensa(movi)mentos radicais, cosmicidades, __voracidades e ter(r)apêuticas | Sebastian Wiedemann & Alexis Milonopoulos

Cultivando las artes de prestar atención y de respons-abilidad | Sebastian Wiedemann e Natalia Perez

Alimentos Inadvertidos, una cartografía-banquete multiespecies | América Larraín, Natalia Pérez e Sebastian Wiedemann (Coord.)

SPIN #2 | Daniel Chaves de Carvalho

Buscando arraigos en el paladar | Leonardo Andrés Campo Menco


LABORATÓRIO ATELIÊ

Convoco as bio-logias | Weuller de Oliveira Santos

O seu verde, em minha vida ecoa | Mike Nascimento dos Santos

Celebrando o cerrado: perspectivas sobre um bioma em resistência | Coletivo Goiabal Vivo

Criar com pássaros e plantas | Larissa Bellini, Emanuely Miranda e Susana Dias

Devir com os vírus em mesas de trabalho | Tiago Amaral Sales e Susana Oliveira Dias


RESIDÊNCIAS CLIMACOM

Tierra (catálogo)

ARQUIVO FLORESTA

Morada floresta (lançamento)

Metamorfoses do Antropoceno

Na floresta dos signos e das coisas – a escrita como prática da lentidão – parte 1 e 2 | Eduardo Pellejero

Cosmopolíticas vegetais

Descolonização da paisagem | Daniel Caballero

Devir com os vírus nas ruínas do Antropoceno – Ramon Fontes, Thiago Ranniery e Tiago Sales

LABORATÓRIO ATELIÊ