Por Fernanda Pestana
Vestígios do passado, indicadores do futuro… Camadas sedimentares se adensam nos testemunhos coletados no solo para estudos paleoclimáticos e paleoambientais. São muitas as variáveis (coloração, densidade, teor de água, composições químicas, etc) que dão aos cientistas pistas de um passado milenar e permitem revisitar os ecossistemas sedimentados no tempo que se acumula na superfície terrestre. A partir deste passado que se desenha pela análise das camadas sobrepostas, é possível encontrar ainda indícios para um modelo climático futuro.
Na tese Incêndios florestais e mudanças ambientais na Amazônia Sul. Comparativo entre alterações recentes e registros paleoclimáticos, defendida pela Universidade Federal Fluminense (UFF), o autor Renato de Aragão Ribeiro Rodrigues (coordenador da Sub-rede de Agricultura da Rede CLIMA) busca, nos testemunhos coletados, informações sobre a frequência e a intensidade de incêndios na Floresta Amazônica, na região de Alta Floresta (norte do Estado de Mato Grosso) e no Lago do Saci (sul do Pará). Apesar de os locais de coleta serem bem próximos (aproximadamente 100 km de distância entre Alta Floresta e o Lago do Saci), o que diferencia as regiões é a ação antrópica, que se intensifica na década de 1980 em Alta Floresta com a exploração mineral, agropecuária e madeireira, em contraste com o Lago do Saci, que permanece preservado. Os testemunhos coletados no Lago do Saci dão pistas de uma Amazônia desde 30 mil anos atrás. Neles, a argila subterrânea gera fatias de tempo, camadas de cores de fogo, água e vegetação que datam os acontecimentos climáticos da região. A argila “recentemente” escurecida denuncia a intensificação da presença do carvão e as queimadas na floresta em escala milenar. A tese faz uma comparação com os testemunhos coletados na região de Alta Floresta, analisando, em uma escala de 3 décadas (de 1975 a 2008), os impactos das mudanças no uso da terra, e constatando uma frequência muito maior e mais acelerada de incêndios na região em relação à análise milenar do Lago do Saci que não sofreu as mesmas alterações.
Das profundezas do solo para a superfície, imagens de satélite também dão testemunho sobre o desmatamento causado pelo centro urbano que começa a surgir em Alta Floresta e se expande com a construção de estradas que envolvem as atividades econômicas da região. Imagens de uma floresta verde que se recolore em rosa (ou se “descolore” em rosa), pois nas imagens o rosa é a cor do desatamento, cor do contraste entre a vegetação e o solo exposto. Rosa que demarca a conversão da floresta em áreas abertas que emitem para a atmosfera o mercúrio que restou da mineração, o carbono das queimadas e outros gases do efeito estufa (GEE) presentes no solo. Testemunhos de episódios passados, os registros sedimentares e as imagens de satélite são também importantes para o desenho de um modelo climático futuro, com o qual a tese visa contribuir analisando como as atividades humanas “afetam (e irão afetar) as ligações fogo-clima-vegetação em todas as escalas espaciais”.
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