Jardim dos saberes ancestrais | obra coletiva – Faculdade de Educação (Unicamp)

Título | Jardim dos Saberes Ancestrais

O “Jardim dos saberes ancestrais” é uma roda de troncos coloridos que se erguem sobre um chão de pedras de rio. Redes de diversas cores unem os troncos e nos lembram que nascemos numa terra, onde a maioria dos povos indígenas, todas as noites, dormem e sonham enredados. Um espaço circular acompanha os desenhos de grandes árvores que ali vivem há décadas. Um lugar de descanso, convívio, encontros, aulas, brincadeiras… Um lugar para nos lembrar das ancestralidades que nos compõem e, em especial, daquelas que por séculos foram silenciadas e invisibilizadas em nosso país de violências coloniais. 

As referências que nos orientaram nessa criação foram as artes e os saberes ancestrais de povos indígenas e comunidades afro-diaspóricas e suas diversas formas de conviver, criar, ensinar e aprender. Um lugar para celebrar as artes, os conhecimentos, as experiências, os modos de vida de povos e comunidades que nos últimos anos passaram a compor de maneira perene a comunidade universitária da Universidade Estadual de Campinas, com o Programa de Cotas Étnico-raciais, aprovado em 2017 e resultado de lutas dos movimentos negros, indígenas e estudantil. Esse necessário gesto político, embora tardio, tem criado profundas marcas nos espaços da universidade.

O “Jardim dos Saberes Ancestrais” está situado na Faculdade de Educação e tomou forma como obra coletiva em abril de 2024. O espaço foi sonhado inicialmente por um grupo de estudantes indígenas, em 2021, quando ainda estávamos nos cuidados da pandemia da COVID 19. Realizamos, durante aquele ano, encontros nas áreas abertas, para diminuir os riscos de contágio e podermos ficar sem máscara. Desse convívio semanal com o jardim, na ocasião sem uso algum, foram surgindo ideias de fazermos um espaço com redes embaixo das árvores. Passamos os anos de 2022 e 2023 elaborando a proposta, dialogando com setores administrativos, professoras e professores e escrevendo projetos de financiamento. 

Ao final de 2023, conseguimos aprovar um projeto (Prêmio Dcult – ProEC – Unicamp) e iniciamos as obras. Foram dois meses de reforma para a instalação dos troncos e pedras e outros dois meses de pinturas realizadas pelos estudantes indígenas, estudantes de coletivos negros da Unicamp e outras(os) artistas de diversas ancestralidades que se juntaram ao projeto. A história do nascimento dessa obra mostra que a ocupação cotidiana dos jardins e espaços externos da universidade possibilita uma intimidade com o lugar e com os seres viventes que o habitam. 

Semanalmente, desde a sua inauguração em abril de 2024, o Jardim tem sido ocupado por estudantes, servidoras(es) técnico-administrativos, professoras(es) e comunidade externa. É habitado para descanso, reuniões, conversas, eventos… Também têm acontecido muitas aulas, diurnas e noturnas, com o uso das redes de nylon colorido que integram o projeto. Em um fim de tarde inusitado, crianças de uma escola transformaram o espaço em um lindo parquinho: as redes se transformaram em coloridos balanços. É perceptível que estamos sentindo a necessidade de sair das quatro paredes, sentir o sol, a sombra, o vento e partilhar nossa vida com outros seres. Uma necessidade coletiva dos nossos tempos. 

Cada tronco foi criado por um coletivo de estudantes pertencentes a um povo, a um conjunto de povos ou a um coletivo. A maior parte das pinturas traz grafismos ancestrais de povos indígenas, povos africanos e desenhos de importância para as comunidades afro-diaspóricas. Também há obras de povos originários da Índia (povos Hindu), da Japão (povo Ainu), da Noruega (povo Sami), da Nigéria (povo Yoruba), povos ciganos, povos andinos e amazônicos que vivem fora do território brasileiro. Os 47 artistas, autoras(es) dessa obra, são, em sua maioria, estudantes de graduação e pós-graduação da Unicamp, que presentificaram no espaço suas ancestralidades na forma de imagens e cores. Os povos indígenas são: Kuikuro, Waujá, Tukano, Dessana, Tikuna, Guarani-Mbyá, Kaiowá, Aymara, Atikun, Pankará, Kariri-Xocó, Kaingang, Terena, Baré, Baniwa, Yawánawa, Sami, Ainu, Nasa… Cada artista e cada coletivo ofereceu imagens que contam histórias ancestrais. 

Jardim remete ao cultivo, ao cuidado, ao manuseio e à coexistência e ganha diversos sentidos quando pensamos em seu sentido ancestral. Nos últimos anos consolidou-se a ideia de que as florestas, como a Amazônia, são grandes jardins oriundos de longos séculos de relação dos seres humanos com os animais, vegetais, fungos… Nesta perspectiva, jardim remete menos à ação humana sobre a natureza e mais a uma convivência: maneira de habitar o mundo em comum. Caminhar por esse jardim é entrar em contato com uma ampla rede de conhecimentos e sentidos de vida. O “Jardim dos Saberes Ancestrais” é uma instalação viva, colorida e multiétnica, para celebrarmos a multiplicidade ancestral que compõe a Unicamp hoje. É a potência dos encontros na diferença que esta grande obra coletiva celebra com alegria.


| FICHA TÉCNICA |

Produção e pintura |

Ahuaugu Kuikuro

Alik Wunder 

Ana Kely Paema da Costa 

Andrea Desiderio Silva 

Antonio Ariclenes Cassiano da Costa 

Bianca Camargo Alves 

Carmen Lúcia Rodrigues Arruda

Cleomar Gaspar Melgueiro 

Cora Desiderio Poltronieri

Dayana Silvério Machado

Fabio Cesar Luiz da Silva 

Gabriel Jesuíno Flores Filho 

Giselle Assunção Barreto 

Hatsue Narita 

Ibison Cruz de Aguiar 

Ismênia Alfredo Carvalho 

Jamille da Silva Lima-Payayá 

Janilton Pinheiro Ferreira

Jaraky Kuikuro

Jocilane Moura Lopes 

Jorge Orjuela  

Kaylan Rodrigues 

Kelly Sabino

Larissa Yepadhio Mota 

Leandro Silveira Guarani Mbya

Leonardo Luiz da Silva 

Lilly Baniwa

Lucinalva Moura Lopes 

Marcelo Soares da Silva 

Maria Clara Santos de Oliveira 

Marilia Chupel Freire Carvalho dos Santos 

Marli Wunder

Mawanaya Waujá

Miki Narita 

Monique Laura Pena Pontes

Nalberth Alberto Barreto

Naldo Tukano 

Natalli Jennifer Tancredo de Oliveira 

Nicolas Felipe da Silva 

Nishta Nishta 

Quirino Pinto Lucas 

Rafael Caetano Nascimento

Rayane Barbosa Kaingang 

Sidney Alemão Cordeiro

Susana Oliveira Dias 

Tania Rosana Carita Sahire 

Vera Lucia Aguiar Moura 

Victor Hugo da Silva Iwakami 

 

Fotografias | 

Alik Wunder

Malu Arruda

Mawanaya Waujá

Miki Narita


 

Obra coletiva – Faculdade de Educação (Unicamp). (Des)astre. ClimaCom – Territórios e povos indígenas. [online], Campinas, ano 11, n. 26. jun. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/jardim-dos-saberes-ancestrais/

SEÇÃO ARTE | DESASTRES | Ano 11, n. 26, 2024

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