Reflexões sobre o Antropoceno e seus desastres através de Quincas Borba | Talita Gantus Oliveira e Jefferson de Lima Picanço


 

Talita Gantus-Oliveira [1] 

Jefferson de Lima Picanço [2]

 

Estamos vivendo no Antropoceno?

Em uma contabilização dos grandes desastres socioambientais a nível mundial que ocorreram desde 1900, é possível observar uma curva que ascende rapidamente em 1950, atingindo um crescimento exponencial a partir da década de 1990 (Crozier; Glade, 2005). Existem diversas formas de entender esses dados. Por um lado, pode-se argumentar que o maior número de desastres em tempos recentes se dá pela facilidade de seu inventário, num mundo onde a informação é mais rápida. Por exemplo, a grande erupção do Monte Tambora em 1815 na Indonésia, que provocou o “ano sem verão” em boa parte do Hemisfério Norte, mal foi relatada fora da Ásia. Quando houve a erupção do Krakatoa em 1883, no mesmo arquipélago, levaram alguns dias para que todo o mundo ligado ao telégrafo soubesse de sua existência (Winchester, 2004). Hoje podemos ter notícias e imagens em tempo real de qualquer fenômeno desse tipo.  Em consonância aos dados do The International Disaster Database (EM-DAT), nota-se que esta curva ascendente de acontecimentos, com expressivo aumento a partir de 1990, não é exclusiva da ocorrência de desastres (Guha-Sapir et al., 2012). Diversos trabalhos apontaram a extrema coincidência de curvas do mesmo tipo para a produção de alimentos, a geração de energia, a degradação de terras agrícolas e a quantidade de dióxido de carbono lançado na atmosfera.

Em consonância aos dados do The International Disaster Database (EM-DAT), nota-se que esta curva ascendente de acontecimentos, com expressivo aumento a partir de 1990, não é exclusiva da ocorrência de desastres (Guha-Sapir et al., 2012). Diversos trabalhos apontaram a extrema coincidência de curvas do mesmo tipo para a produção de alimentos, a geração de energia, a degradação de terras agrícolas e a quantidade de dióxido de carbono lançado na atmosfera. O conceito de “Grande Aceleração” foi concebido a partir da análise conjunta desses diferentes dados. Ademais, a ocorrência de desastres revelada pelos dados do EM-DAT parece seguir de perto o crescimento populacional, cujo aumento exponencial provocou, como efeito colateral, a explosão de habitações em áreas com urbanização precária, ambientalmente sensíveis e geologicamente instáveis.

 

(Leia o ensaio completo em PDF)

 

Recebido em: 15/10/2023

Aceito em: 15/11/2023

 

[1] Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo | Universidade Estadual de Campinas. Email: tgantus@gmail.com

[2] Instituto de Geociências | Universidade Estadual de Campinas. Email: jeffepi@unicamp.br

Reflexões sobre o Antropoceno e seus desastres através de Quincas Borba

 

RESUMO: As discussões em torno da Grande Aceleração, conceito que marca o aumento exponencial da extração de recursos naturais, e do Antropoceno como produto e produtor dos desastres são os temas disparadores do presente ensaio. A atual crise sistêmica é uma consequência direta de um modelo civilizatório insustentável do ponto de vista ecológico. Contudo, a visão homogênea sobre a espécie humana na perspectiva do Antropoceno é, no mínimo, simplificadora. O que a narrativa por trás dos cenários de terra arrasada pode ocultar não somente sobre a construção social do desastre, mas também sobre os caminhos que apontam para saídas alternativas? Visto isso, este ensaio encena uma revisão crítica do Antropoceno, no intuito de reposicionar a ação humana na produção dos desastres não como central, mas como desdobramento de um determinado modo de organização social, que nos leva àquilo que nomeamos como “a dialética da espiral do desastre”. Diante desse problema, este ensaio percorre uma travessia a partir da literatura machadiana em Quincas Borba e do Humanitismo, passando por reflexões que apontam para caminhos alternativos no Antropoceno. Olhar para o passado pode ser uma chave-reflexiva para projetarmos outros futuros possíveis?

PALAVRAS-CHAVE: Antropoceno. Desastres. Grande Aceleração. Futuro. Humanitismo 


 

Quincas Borba, the Anthropocene and its disasters

 

ABSTRACT: The discussions around the Great Acceleration, a concept that marks the exponential increase in the extraction of natural resources, and the Anthropocene as a product and producer of disasters are the triggering themes of this essay. The current systemic crisis is a direct consequence of an ecologically unsustainable civilizational model. However, the homogeneous view of the human species from the perspective of the Anthropocene is simplistic. But, what the narrative behind the scorched earth scenarios about the social construction of the disaster? And about the paths that point to alternative solutions? This essay stages a critical revision of the Anthropocene, with the aim to repositioning human action in the production of disasters not as central but as an unfolding of a certain mode of social organization, which leads us to what we call “the dialectic of the spiral of disaster.” Faced with this problem and starting from Machado de Assis’ literature in Quincas Borba and of his Humanitism, this essay proposes alternative ways for Anthropocene. The central question is: Will looking at the past can be a reflective key for us to project other possible futures?

KEYWORDS: Anthropocene. Disasters. Great Acceleration. Future. Humanitism.

 


OLIVEIRA, Talita Gantus; PICANÇO, Jefferson de Lima. Reflexões sobre o Antropoceno e seus desastres através de Quincas Borba. ClimaCom – Desastres [online], Campinas, ano 10, n.25., nov . 2023. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/quincas-borba/