Corpos variantes: abecedários, errâncias e travessuras | Sheila Hempkemeyer


Sheila Hempkemeyer [1]

Anticorpo

“A poesia faz alguma coisa acontecer, de fato.
Faz com que você aconteça.
Faz a sua vida acontecer”
(Audre Lorde, 2020, p. 106)

Ser variante ou variação, fazer travessias ou travessuras. Jogar com sentidos e intencionalidades. Produzir outros pontos e temporalidades. Ziguezaguear entre linhas e espaçamentos, metáforas e metamorfoses. Ser mão e contramão, joelho, cotovelo, calcanhar, pálpebra, coração. Através da escrita desse texto há uma busca por reelaborar o presente para além da tragédia humana e nacional. Após um ano de pandemia de coronavírus, mais de 280 mil mortes no Brasil, a permanência de um governo genocida e seu plano de morte sendo executado sem restrição alguma, construir anticorpos, sobretudo ficcionais, é uma estratégia de guerra para combater a letalidade subjetiva na qual partilhamos. “Os vivos morrem logo, os mortos morrem devagar” (Becker, 2020). Enquanto vivos (sobre)vivem a morte virulenta e asfixiada, entre infindáveis ondas, outras sonoridades, tons e movimentos germinam e respiram no jardim, no quintal, no canteiro, no asfalto, no campo, nas periferias, nos rios e na floresta.

 

Apostando na transição da percepção e na recriação íntima com as instabilidades cotidianas, a composição do texto tem como apoio o jogo das palavras, das ideias, de existências e da ficção. Ao lado de tudo é um treino de alteridade e de produção da diversidade. Para isso, diálogos  incomuns são ar-riscados com um único propósito: defender a garantia de outros modos de existir.

 

Esse é um exercício de impermanência e descontinuidade, próximo dos fluxos de vida. Isso não significa desconexão entre fragmentos e corpos, tampouco menosprezo com as políticas de morte, muito pelo contrário. Fazem parte de uma estratégia de vida para evidenciar que enquanto uma história é contada e vivida, outras também vivem e contam sobre suas existências. Acionando outros filtros, fluxos, fluidos e costurando com diferentes linhas, agulhas e panos, o texto nutri diálogos entre cantos e encantos. Não há méritos, convicções ou julgamentos. Há ruídos, rimas, trechos e reflexões pensadas diante do impossível. Das impossibilidades do vivido.

 

(Leia o artigo completo em PDF).

 

Recebido em: 20/03/2021

Aceito em: 15/04/2021

 

[1] Formação em Psicologia, Mestra e Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, pesquisadora pelo Coletivo TECENDO: cultura arte educação. E-mail: she.hempke@gmail.com

Corpos variantes: abecedários, errâncias e travessuras [1]

 

RESUMO: Este artigo é uma obra sobre experimentos de pesquisa em educação. Traz em sua estrutura e corpo reflexões para além da centralidade humana, ou que impliquem diretamente nela. O principal objetivo é deslocar a percepção, criando rachaduras no pensamento hegemônico que solidifica nossos corpos, engessam nosso olhar e restringem nossas relações. Entre jogos de palavras e variações de si, con-versa sobre alguns efeitos da colonialidade nas estruturas sociais e na construção da subjetividade, jogando ativamente com a ficção para pensar de outro modo. Além disso, defende a prática da errância, sobretudo no texto, enquanto ato de combate ao utilitarismo e aceleracionismo contemporâneo. Tecendo uma escrita não linear, fragmentada e processual faz no e do texto um exercício sobre aquilo que se propõe a discutir, apostando na potência da desordem como uma estratégia de enfrentamento estrutural em defesa da vida.

PALAVRAS-CHAVE: Educação. Errância. Corpo.

 


 

Variant bodies: abecedaries, wanderings and mischief

 

ABSTRACT: This article is a work on educational research experiments. It brings in its structure and body reflections beyond human centrality, or that directly imply it. The main objective is to displace the perception, creating cracks in the hegemonic thought that solidifies our bodies, plaster our gaze and restrict our relationships. Between play on words and variations of oneself, he talks about some effects of coloniality on social structures and on the construction of subjectivity, actively playing with fiction to think differently. In addition, it defends the practice of wandering, especially in the text, as an act to combat utilitarianism and contemporary accelerationism. Weaving a non-linear, fragmented and procedural writing makes in and of the text an exercise on what it proposes to discuss, betting on the power of disorder as a structural coping strategy in defense of life.

KEYWORDS: Education. Wandering. Body.


HEMPKMEYER, Sheila. Corpos variantes: abecedários, errâncias e travessuras. ClimaCom – Coexistências e cocriações [Online], Campinas, ano 8,  n. 20,  abril.  2021. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/corpos-variantes/