Tuane Eggers | Um episódio de cegueira coletiva ou o que sobrou do planeta depois dos humanos

Título: Um episódio de cegueira coletiva ou o que sobrou do planeta depois dos humanos


O termo “pós-verdade” foi escolhido como a palavra do ano de 2016 pelo dicionário Oxford, referindo-se, principalmente, ao contexto político que elegeu o atual presidente dos Estados Unidos, o ultradireitista Donald Trump. O dicionário define a palavra como aquilo que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais os fatos objetivos têm menos importância do que crenças pessoais. Ou seja, cada indivíduo vive inserido em sua ficção pessoal.

Nesse contexto, fatos dados como verdade única e absoluta possuem cada vez menos credibilidade, com ênfase para o jornalismo, ainda que a própria ideia de neutralidade jornalística também seja uma grande ficção. Recortes de jornal noticiam, agora, as eleições de 2018, que elegeram o ultradireitista Jair Bolsonaro como presidente do Brasil. De que forma a ficção impacta e se mescla com a realidade? Ou, ainda, é possível diferenciar realidade e ficção?

Sentimo-nos agora vivendo um momento em que os fatos noticiados como realidade superam o absurdo da ficção. Estamos, confusos, em meio a um constante jogo de percepções. Ainda que a verdade das relações humanas seja considerada sempre relativa, podemos aplicar esta mesma lógica para a relação dos humanos com o planeta? Por quanto tempo as nossas ficções serão capazes de conter a nossa própria destruição? Talvez, agora, a ficção esteja situada em acreditar que nossa existência acontece de maneira isolada, sem necessidade de integração com o todo.

O antropólogo Bruno Latour, em seus estudos sobre o conceito de cosmopolítica proposto por Isabelle Stengers, declara que na concepção de uma divisão entre natureza e política, a civilização se surpreende com a crise ecológica. Mas, nos surpreendemos com o que deveria ser óbvio: nós vivemos na Terra, onde mais poderíamos residir? Para ele, a modernidade criou um sistema em que os indivíduos estão completamente à parte das relações de causa e efeito. E, talvez, o universo e o cosmos não estejam sob verdadeira ameaça, mas sim a humanidade.

Nesse sentido, os recortes de jornal utilizados no trabalho “ Um episódio de cegueira coletiva ou o que sobrou do planeta depois dos humanos”, sejam eles dados como verdade ou ficção, podem ser observados como resquícios de uma civilização cada vez menos preocupada com a continuidade de sua existência no planeta. Ainda assim, o planeta seguirá seus próprios fluxos, com tantos outros habitantes, espécies e reinos. Depois dos humanos, toda a vida que sobrou, seguirá existindo – porque, na lógica dos fluxos da matéria no mundo, decompor é recompor.

 


FICHA TÉCNICA

Autora: Tuane Maitê Eggers

País de produção: Brasil

Ano de produção: 2018

 


 

Tuane Maitê Eggers

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

E-mail: tueggers@gmail.com

Telefone: (51) 98433-2103

 

 

 

EGGERS, Tuane M. Um episódio de cegueira coletiva ou o que sobrou do planeta depois dos humanos. ClimaCom – Fabulações Miceliais[online]Campinasano. 6n. 14. Abr2019 . Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/?p=10878


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SEÇÃO ARTE | FABULAÇÕES MICELIAIS | Ano 6, n. 14, 2019

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