DesComEtc@ – Desconecta, a rádio

Título: DesComEtc@ – desconecta, a rádio (série transgênicos)

 


Programa 1: Controvérsias, oposições e moralidades

Nesse episódio, buscamos explorar a forma narrativa da novela de rádio, a qual acreditamos estar perpassada pelos temas que aqui nos propomos a discutir, isto é: as controvérsias, as oposições e as moralidades. Nesse tipo de narrativa, há um papel preponderante do narrador, que apresenta ao público não somente o contexto das cenas que virão à seguir, mas muitas vezes o que o público sentirá com essas cenas e, quase sempre, traz mais elementos narrativos do que a própria cena. Esse contraste entre a narração da cena e a cena sonora nos parece interessante para pensar os referidos temas. A ideia é envolver em uma trama típica (isto é, contendo rompimentos abruptos, descobertas inesperadas, mistérios prolongados para garantir o suspense) elementos da discussão realizada em torno dos transgênicos (e do seu consumo ou não). Ao invés de uma “história de amor e sofrimento” (como o narrador anuncia um dos programas de rádio relacionados como referências), uma “história de amor e transgênicos”.

Programa 2: Sonoridade do risco (comunicação e ciência do risco)

O “clima”  e a sensação de que há algo “arriscado” em andamento, nesse programa, foi inspirado no seriado Twin Peaks (1990), de David Linch, especialmente na sua trilha sonora (composta por Angelo Badalamenti) – que deverá ser utilizada como música incidental para a gravação – e no personagen principal: um jornalista com ares investigativos, que conversa com um gravador, como faz o personagem do detetive Dale Cooper, no seriado. Esse jornalista está organizando e reunindo seu arquivo sonoro, para um programa de rádio sobre os riscos dos transgênicos…Ele vai ouvindo e comentando esse material e fazendo registros num gravador (um desses gravadores de mão que usam pequenas fitas K-7), interagindo com ele. A proposta é de o programa ser composto por retalhos de pedaços e trechos das gravações, marcados por avisos, precauções, medos, paranoias, controles, ações – que são sintomas de uma comunicação e ciência de risco – ganhando corpo pelos sons e vozes presentes na própria pesquisa do jornalista. A própria ação de registro, de pesquisa e de gravação vai sendo contaminada por todos os sintomas de uma comunicação de risco, trazendo seus perigos e impossibilidades. Ao longo das gravações começam surgir inquietações. Apostando em, assim, abrir espaço para uma “sonoridade do risco”, o próprio registro sofreria do risco; ora o jornalista se depararia com trechos faltando, ora com trechos que nunca ouviu, e comenta isso com o próprio gravador que o trai, buscando assim sempre fazer da escolha narrativa a própria contaminação da narrativa.

Programa 3: Ciência e Sociedade

A proposta deste programa é jogar com o problema da construção da notícia, e a busca pelo fato jornalístico. A narrativa gira ao redor de um jornalista que precisa fazer um texto de apresentação de um dossiê, publicado pela revista em que trabalha, sobre transgênicos. Ele decide, então, procurar material nas matérias que conseguissem resumir e dar “uma cara” ao tema abordado. A fala do programa é o monólogo de um homem trazendo a pressa, seus comentários, agendando suas atividades: “preciso terminar essa matéria logo”, “preciso encontrar alguém que resolva essa pauta”… assim por diante, buscando trazer a dificuldade de se construir um texto jornalístico. No decorrer da narrativa ele entra em matérias que sempre levam a outros temas: sociologia, filosofia, história, letras, filmes. Sempre que tenta pegar a face do transgênico “puro” ele escapa para outra coisa. O jornalista lê em voz alta trechos de textos que ele está pesquisando, sempre descontente com a sua busca tortuosa. A ideia do programa é: se isolar o conceito de transgênico, vai acabar por produzir uma definição completamente sem sentido, vazia, sem poder de agir no mundo. É preciso entrelaçar com o mundo para fazer funcionar.

Programa 4: Escolha e Consumo

A proposta deste programa é trabalhar com diálogos, devido à possibilidade das coisas se perderem em sua dinâmica rápida e, com isso, introduzirmos elementos relativos às possibilidades de escolha. Tomamos como referência central o diálogo presente na peça “A cantora careca”, em que um casal conversa sobre uma família em que todos os membros têm o mesmo nome (Bobby Watson); esse “problema” comunicativo faz com que eles tenham que desdobrar a árvore de relações para que se saiba de quem estão falando, embora, no final das contas, tais informações sejam irrelevantes (afinal, “todo Bobby Watson é caixeiro viajante”). Assim, parece-nos que essa dinâmica coloca em jogo a falta e o excesso de informações envolvidos nos processos comunicativos relativos à escolha e ao consumo. Por se tratar de dois temas bastante complexos, e em relação aos quais não pretendemos nos posicionar, parece-nos que o diálogo tal como o apontamos pode possibilitar certa indefinição nas afirmações, ao mesmo tempo que nos permite olhar o tema da perspectiva dessa falta/excesso que o permeia.

Programa 5: Divulgação Científica

A ideia de uma carta sem destinatário nos põe a pensar o que seria uma divulgação científica sem destinatário; viemos trabalhando esse tema, na maneira de discuti-lo, a construção desse programa de rádio se fará na tentativa de esboçá-la. A carta é um gênero bastante popular, de tal forma que trabalhar a partir de seus limites – tencionando-os – traz à vista uma série de questões políticas e textuais; isso acontece, por exemplo, quando propomos uma “carta sem destinatário”, quando é conhecido que, no gênero carta, é imprescindível haver um destinatário. Experimentar com esses limites parece-nos uma interessante estratégia para pensar a divulgação científica, tema desse programa. Assim, aproximamo-nos ainda mais da temática “carta”, e uma imagem bastante forte passou a rondar nossas investigações: a dos escritores de cartas que, geralmente sentados na ponta de filas em lugares de passagem (como rodoviárias e praças), escrevem para pessoas que, embora não-alfabetizadas, apostam na escrita como possibilidade para se comunicar com o distante. Trata-se de uma figura amplamente utilizada em filmes (como “A central do Brasil”) e livros (como O amor nos tempos do cólera), e que ressoa certa simplicidade e certa relação com o tempo afim das cartas.

Programa 6: Feitiço do tempo

A proposta do programa é criar um jogo com o formato jornalístico bastante popular da “previsão do tempo”. Um “homem do tempo” está contando sobre um novíssimo mapeamento tecnológico e coisas inusitadas começam a ocorrer, escapando ao controle do programa de rádio que acontece “ao vivo”. A gravação do programa deve sugerir um certo clima de improviso – como se ele fosse feito em ambiente aberto, em que ruídos imprevistos e erros interferem, o tempo todo, na transmissão; depois outras interferências acontecerão no ambiente fechado do laboratório. Várias “texturas” de som, sugerindo autoridades e tempos distintos das falas das personagens.

 


 

Ficha Técnica:

Trata-se de um projeto de pesquisa e criação radiofônica onde experimentamos as apostas do grupo de pesquisa multiTÃO: prolifer-artes subvertendo ciências, comunicações e educações (CNPq), expandindo o conceito de divulgação científica para além de uma lógica pedagógica de explicação, esclarecimento e ensinamento. Investimos em encontros com a filosofia e a arte na busca por possibilidades e impossibilidades de pensar e problematizar a linguagem e os signos (imagens, sons e palavras) que convocam e provocam conexões entre ciências, públicos e culturas. Nesse sentido, os programas objetivaram, na relação com o público, não estabilizar o pensamento pela produção e circulação de respostas e soluções prontas para os temas abordados (ainda que tais respostas e soluções sejam formuladas segundo opiniões de especialistas da área). Essa escolha é importante, pois apostamos no público também como parte modificadora da própria comunicação, já que o que está em jogo não é o convencer o público, mas promover novas formas de pensar e provocar desestabilizações nas significações já dadas no que diz respeito às ciências. A primeira série de programas – “Trangênicos” foi desenvolvida numa parceria entre a Embrapa Meio Ambiente, através do projeto LAC-Biosafety.

Argumentos e roteiros

Carolina Cantarino

Sheyla Cristina Smanioto Macedo

Renato Salgado de Melo Oliveira

 

Decupagem, mixagem, edição e gravação

João Arruda

Raphael Oliveira Picerni Pinto

Susana Dias

 

Concepção e coordenação geral

Susana Dias

 

Grupo de pesquisa

multiTÃO: prolifer-artes sub-vertendo ciências, educações e comunicações (CNPq)