Pena Branca e Sete Flechas: caboclaria em defesa da vida | Carolina Noury
Carolina Noury [1]
Você sabe, curumim, que nós vem acá primeiro para resgatar a ancestralidade de vocês. Que os caboclos, os preto velho, que as entidades que vem acá no terreiro que são de manifestação dessa ancestralidade. Então quando eu conto a história, eu conto a história da minha ancestralidade. Não importa se sou eu Pena Branca acá ou se é outro Pena Branca em outra oca, o importante é que a história que nós carrega na nossa trajetória. A minha ancestralidade vem das aldeias, sou cacique de aldeia de onde as comunidades se faziam presentes acá. De onde o sangue que formaram essa terra se encontraram. De quando os homens branco vieram acá que dizimou nós, nós voltou acá pra mostrar que nossa vida não depende dessa materialidade acá. Nossa história, nossa ancestralidade é o que nos faz vivo, é o que nos faz forte. Eu e os espíritos que estão acá, não precisa ter tido uma vida de luta de fato acá nessa terra, isso não é mais importante. O importante é lembrar os curumins que ainda estão acá na terra, de onde veio as origens dele. E de mostrar que as coisas acontecem no terreiro, lá fora, reconhece as origens de cada ancestralidade que formou isso acá. Eu sou parte dessa origem, eu sou um pedaço dessa ancestralidade que forma isso acá. Já até que os curumins acá na terra que as hierarquias que vocês fazem acá, das diferenças que vocês constroem acá, de tentar apagar a história original, que os curumins acá na terra gostam de falar que é todo mundo igual, mas olha o que fazem com nós, com nossos ancestrais vivos. E olha como é que nós mesmos dentro da religião foi tratado durante muito tempo. Porque os ancestrais que se manifestam acá, os curumins que fazem a religião, muito foi cortado, como se fosse atrasado, mas não é porque a espiritualidade estava falando isso, é porque a cabeça dos curumins, já formada de um jeito para apagar a ancestralidade, né curumim. Então eu to acá, curumim, de cacique de um terreiro pra mostrar que nossa história é viva. É pros curumins acá na terra entenda que não é possível de fazer caminhador passando por cima de quem fez a história de construção dessa terra acá. Nós vem acá para mostrar que tem um passado para acertar.
(Leia o ensaio completo em PDF)
Recebido em: 01/03/2024
Aceito em: 01/06/2024
[1] Pesquisadora do Programa Nacional de Pós-Doutorado da CAPES na Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado Rio de Janeiro (Esdi/UERJ) vinculada ao Laboratório de Design e Antropologia (LaDA). Email: carolinanoury@gmail.com
Pena Branca e Sete Flechas: caboclaria em defesa da vida
RESUMO: Neste ensaio apresento o pensamento afroindígena construído pela aproximação entre os povos africanos e indígenas no continente americano a partir das escutas-escritas do caboclo Pena Branca e do caboclo Sete Flechas. Em uma transfluência de cosmologias africanas e indígenas, este texto busca inserir narrativas ancestrais no campo da pesquisa acadêmica para guardar mundos e modos de pensar e existir que foram e continuam sendo violentamente atacados. A urgência da vida diante os desastres do Antropoceno nos coloca em luta por outros mundos abrindo caminhos para uma política terrestre. Através das escutas transformadas em escritas dessas entidades busco recuperar cosmovisões e narrativas de povos silenciados para enfrentar o desencanto do mundo moderno colonial aniquilador de corpos, saberes e linguagens. Fazer alianças com seres da terra é urgente para combater o terror colonial e sua política de aniquilação para sustentarmos a queda do céu.
PALAVRAS-CHAVE: Escutas-escritas. Caboclo. Antropoceno. Ancestralidade. Território.
Pena Branca y Sete Flechas: caboclaria en defensa de la vida
RESUMEN: En este ensayo presento el pensamiento afroindígena construido a partir del acercamiento entre pueblos africanos e indígenas del continente americano a partir de los escritos de escucha del caboclo Pena Branca y del caboclo Sete Flechas. En una transfluencia de cosmologías africanas e indígenas, este texto busca insertar narrativas ancestrales en el campo de la investigación académica para proteger mundos y formas de pensar y existir que han sido y siguen siendo atacados violentamente. La urgencia de la vida ante los desastres del Antropoceno nos pone en lucha por otros mundos, abriendo caminos para una política terrenal. A través de la escucha de los escritos de estas entidades, busco recuperar cosmovisiones y narrativas de pueblos silenciados para enfrentar el desencanto del mundo colonial moderno que aniquila cuerpos, conocimientos y lenguas. Es urgente hacer alianzas con los seres de la tierra para combatir el terror colonial y su política de aniquilamiento para sostener la caída del cielo.
PALABRAS CLAVE: Escuchar-escribir. Caboclo. Antropoceno. Ascendencia. Territorio.
NOURY, Carolina. Pena Branca e Sete Flechas: caboclaria em defesa da vida. ClimaCom – Territórios e povos indígenas [online], Campinas, ano 11, nº. 26. jun. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/pena-branca-e-sete-flechas/