Paula Pellejero | Matéria carregada de tempo

TÍTULO: Matéria carregada de tempo 


Sobre as obras e o procedimento por detrás das obras 

As primeiras obras realizadas em Epecuén foram realizadas durante um período de dois dias nas ruas das ruínas, pelo qual os desenhos conservam as marcas das superfícies gastadas pela água, numa espécie de frottage não intencional. A ideia por detrás dos trabalhos era desenhar com os escombros, os elementos achados nas ruínas, a barro do lago, as ramas encontradas no lugar. Nos trabalhos com tijolo o traçado de linhas sem objeto estava associado a um movimento corporal constante, que procurava transpor intuitivamente o movimento da água. Em Buenos Aires o trabalho continuou em formatos maiores, tentando manter a incomodidade própria do trabalho na intempérie, ao que agora se somava a impossibilidade de ter uma perspectiva completa do que estava sendo construído. O cuidado formal cedia assim à natureza dos elementos em jogo, transbordado qualquer possível cuidado formal – o papel começa a romper-se, as linhas tornam-se incontroláveis. Mesmo na consciência de que a obra estava comprometendo-se (inclusive materialmente), o intuito era continuar a desenhar com o tijolo até que este se desgastasse por completo. O impulso, o procedimento, era mais importante que a representação. Quando tudo finalmente acabou, surgiu o trabalho, e o trabalho falava do que Paula Pellejero sentira e vivera em relação à perda de Epecuén e à perda em geral.  

Vídeo com imagens do processo:

“Sobre a linguagem poética e a contingência 

Nas obras iniciadas a partir de minha viagem a Epecuén acho que a contingência começa a ser explícito. Eu sinto que se trata de algo que não posso apalpar, que não é possível racionalizar, algo que surge, simplesmente. Tanto nos desenhos realizados nas próprias ruínas, onde realizava linhas com um bocado de tijolo que ficara do desastre, sobre um papel, como nos ‘papeis rasgados’, onde traço linhas com cacos das próprias ruínas sobre papeis pintados, é a contingência a que rege. 

Se bem não encaro como um tema a contingência, a impossibilidade da sua apreensão e a sua busca constante são uma parte importante do meu trabalho. Não consigo escapar a isso, à procura disso que sinto que está dado e, ao mesmo tempo, barrado. Por exemplo, no desenho ‘Azul’ a procura silenciosa do corpo, a força e a matéria, conjuga fórmulas que não me são reveladas sob nenhuma forma, mas ao mesmo tempo constroem algo, mesmo se não sei bem o que é. 

Essa aceitação da contingência, que traz à superfície algo do fundo informe, é uma forma de não confundir a arte com uma forma de dar respostas. É o pensamento da informalidade que não nos limita, não nos obriga a produzir ou construir, mas nos permite viver e ser.

O erro é, para mim, uma forma de ir à procura de novas maneiras de pensar. Quando cheguei a Epecuén, só sabia que queria desenhar com os escombros das ruínas. Nem sequer tinha claro porque queria fazer isso. Passei dias tentando impregnar-me do lugar, lançando-me à deriva. A minha preocupação era: “o que vou desenhar?”. Como se o desenho ou o pensar artístico tivesse que dar lugar a uma representação. Mas no dia que estendi o papel, o meu corpo começou, sozinho, a mover a mão, e a mão traçou linhas como o movimento do lago, que já estava de algum modo em mim. O tijolo tinha que desgastar-se. Não consegui isso no primeiro dia, mas continuei trabalhando. Hoje esse tijolo é só pó – uma parte ficou sobre o papel, outra eu vi voar no vento.” 

 

Paula Pellejero em resposta à pergunta feita pelo editor do dossiê “A linguagem da contingência”, professor Eduardo Pellejero.

 


 

 

FICHA TÉCNICA

Materia cargada de tiempo  

Vídeo com imagens do processo: https://www.youtube.com/watch?v=4otGHXBON-k&feature=youtu.be 

Obras realizadas com escombros de Epecuén 

– Ladrillo 1. Escombro de ladrillo sobre papel, 400 x 150 cm. /2015 

– Ladrillo 2. Escombro de ladrillo sobre papel, 200 x 150 cm. / 2015 

– Ladrillo 3. Escombro de ladrillo sobre papel, 200 x 150 cm. / 2015 

– Barro. Barro del lago sobre papel, 150 x 100 cm. / 2015 

– Azul. Frottage con pastel óleo sobre papel, 150 x 100 cm. / 2015 

– Naranja. Escombro de ladrillo sobre papel, 28 x 40 cm cm. / 2015 

– Celeste. Escombro de ladrillo sobre papel, 28 x 40 cm cm. / 2015 

– Azul. Escombro de ladrillo sobre papel, 28 x 40 cm cm. / 2015 

– Fucsia. Escombro de ladrillo sobre papel, 28 x 40 cm cm. / 2015 

– Rama. Rama sobre papel, 150 x 100 cm. / 2015 

Obras realizados no atelier 

– Azul. Escombro de Epecuén sobre papel pintado con acrílico, 250 x 150 cm. / 2016 -2017 

– Azul 2. Escombro de Epecuén sobre papel pintado con acrílico, 100 x 150 cm. / 2018 

– Negro. Escombro de Epecuén sobre papel pintado con acrílico, 90 x 140 cm. / 2017 

– Verde. Escombro de Epecuén sobre papel pintado con acrílico, 40 x 140 cm. / 2018 


 

Paula Pellejero nasceu em Luján (Argentina) em 1975. Formada em pintura pela Escuela Nacional de Bellas Artes Prilidiano Pueyrredón (1999)é artista visual e realizadora audiovisual. Em 2017 lançou o filme “Alberto Greco, obra fuera de catálogo”. Os desenhos que integram a série “Matéria carregada de tempo” foram expostos por primeira vez na “Casa de la Cultura Adolfo Alsina (Carhué, 2016). 

 

 

 

PALLEJERO, Paula. Materia cargada de tiempo. ClimaCom – A Linguagem da Contingência [online]. Campinas, ano 6, n. 15. Ago. 2019. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/paula-pellejero-materia-carregada-de-tempo/

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SEÇÃO ARTE | A LINGUAGEM DA CONTINGÊNCIA | Ano 6, n. 15, 2019

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