Na floresta dos signos e das coisas – a escrita como prática da lentidão – parte 1 e 2 | Eduardo Pellejero

Título | Na floresta dos signos e das coisas – a escrita como prática da lentidão – parte 1 | Eduardo Pellejero

A atenção é a oração natural da alma, Malebranche.

O tempo que nos calha viver são de tal natureza que as nossas vidas se vêm inscritas “numa duração sem interrupções, definida a partir de um princípio de funcionamento contínuo, que tem a aparência de um mundo social, mas em realidade é um modelo não social de rendimento próprio de máquinas” (Crary, 2015, p. 10). Entre todos os fatores que se encontram envolvidos nessa configuração terminal do capitalismo, o sequestro da atenção e o empobrecimento da experiência constituem fenômenos preocupantes, porque comprometem o nosso sistema sinestésico e, com isso, “o poder instintual dos sentidos corporais humanos” e “a auto-preservação da humanidade” (Buck-Morss, 1996, p. 12).

Ignoro se acionar o freio de emergência da história, como dizia Benjamin, está ao nosso alcance, mas opor algum tipo de resistência a esse mecanismo vertiginoso e insone é um dos imperativos da nossa época. Nesse sentido, seja desafiando-nos a experimentar o extraordinário sob os contornos banais das nossas existências, seja convidando-nos a apreciar a textura do ordinário como tal, o curso pretende elaborar algumas ideias e práticas visando arrancar-nos do círculo do consumo que domina as nossas sociedades e interromper os nossos comportamentos condicionados, isto é,  tentando evitar que sigamos atuando em piloto automático.

A escrita, enquanto modulação do tempo e da atenção, sempre deu mostras de estabelecer relações inéditas entre as palavras e as coisas, entre a nossa sensibilidade e o mundo, entre a imaginação e o real, convidando-nos a demorar-nos em tudo aquilo que nos rodeia e conforma nossas vidas, promovendo uma interrupção singular, através da qual entramos “no caminho da permanência contemplativa” (Han, 2019, p. 96), furtando-se por um momento à esfera dos desejos e das inquietações, dos interesses e dos apetites.

O curso, em primeira instância, constará de dois encontros virtuais, nos dias 8 e 22 de novembro de 2024, durante os quais partilharemos referências e apreciaremos práticas, elaboraremos protocolos de experiência e formas de partilhar essas experiências através da escrita. Mas, tratando-se de práticas da lentidão, depois desses dois encontros cada um dos participantes se dará o seu tempo (um tempo liso, sem horizonte de expectativas), para voltar a nos encontrar um ano depois – em novembro de 2025 – para colocar em comum os resultados das nossas experiências.

Eduardo Pellejero | argentino de nascimento, português por adoção, residente no Brasil, apátrida por convicção. atualmente é professor de estética filosófica na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Projeto | “Perceber-fazer floresta: alianças entre artes, ciências e comunicações diante do Antropoceno” (Fapesp 2022/05981-9)

 

PELLEJERO, Eduardo. Na floresta dos signos e das coisas – a escrita como prática da lentidão – parte 1 e 2. ClimaCom – Desvios do “ambiental” [online], Campinas, ano 11, n. 27. dez. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/na-floresta-dos-signos/


 

SEÇÃO ARTE | DESVIOS DO “AMBIENTAL” | Ano 11, n. 27, 2024

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