Museus e um mundo comum: mudanças climáticas, cosmopolíticas e prática museológica


Ben Dibley [1]

Tradução de Susana Dias

 

INTRODUÇÃO

Logo após a publicação, em 2007, dos trabalhos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC), o curador de museu Richard Hebda (2007, p. 329) argumentou:

Este relatório é nada menos que um chamado a um despertar claro para o fato de que o curso da humanidade é insustentável e tem empobrecido não apenas os recursos que usamos, mas também impactado os próprios processos que nos sustentam e a todas as outras vidas na Terra. A humanidade está numa encruzilhada, e os museus têm o papel vital de ajudar as pessoas a tomarem decisões informadas sobre que rumos tomar.

A proposição de Hebda é fascinante por muitos motivos. E é também uma pausa para reflexão. Isto tem menos a ver com a alegação de que os museus deveriam assumir o desafio das mudanças climáticas – sem dúvida de vital importância também para inúmeras outras instituições – e mais com a maneira como eles podem fazer isso. É central aqui a compreensão da natureza da relação entre a instituição do museu e o mundo compartilhado que sua pedagogia mediaria. É esta relação entre museus e um mundo comum que é a minha preocupação aqui. Este trabalho discute como tais relações são regularmente afirmadas através de apelos cosmopolitas que se fundamentam no pressuposto de que um cosmos, um mundo, um universal, preexistem à sua articulação; e que a razão e a ciência têm a tarefa de ajustar o sujeito-cidadão a esta condição já preexistente. Este artigo argumenta que esta é uma posição falha, assumindo de fato o que é necessário ser construído: um mundo em comum.

Em defesa dessa proposição, justaponho duas propostas opostas através das quais as relações entre os museus e um mundo comum podem ser exploradas: uma cosmopolita e outra cosmopolítica. A primeira é um termo que invoca uma literatura extensa e cheia de nuances à qual este artigo não pode fazer justiça. Para os meus propósitos aqui, limito o foco nas relações entre o cosmopolitismo[3] e o risco global, tal como são formulados na sociologia de Ulrich Beck. Em parte, faço isso em razão da relevância acadêmica dos seus estudos e, também, por causa da utilidade de seus argumentos para a análise das mudanças climáticas (BECK, 2010a; 2010b; também ver HULME, 2010). A segunda, cosmopolítica, diz respeito às formulações feitas pelos estudos das ciências, particularmente aquelas de Isabelle Stengers e Bruno Latour, que, embora largamente ignoradas pela literatura anterior, destacam, entre outras coisas, o antropocentrismo das posições cosmopolitas que não conseguem compreender a política do não humano, por meio da qual um mundo comum pode ser composto.

Numa primeira entrada nestas considerações, começo com duas expressões recentes do cosmopolitismo museal que tomaram a forma de declarações: a declaração do International Council of Museums – ICOM a respeito do “museu universal” e seu foco na unidade do patrimônio cultural da humanidade; e a Declaração de Buffon, que diz respeito às instituições de história natural e ao risco ao patrimônio natural da humanidade. Os dois manifestos sobre museus podem ser enquadrados como propostas cosmopolitas, na medida em que eles compartilham uma pedagogia museológica – através, respectivamente, de estratégias de tolerância e sustentabilidade – que ajustariam sujeitos-cidadãos a mundos culturais ou ecológicos compartilhados que são postulados para além das fronteiras do Estado-nação. A seguir, volto-me para o que poderia ser chamado de empirismo do cosmopolitismo. Trata-se da investigação qualitativa do cosmopolitismo banal ou cotidiano, que é amplamente ignorado pelos manifestos museológicos de cosmopolitismo e pela teoria social do risco global; mas que, no entanto, é assumido por essas formulações quando o efeito político de suas reivindicações for dominante. É contrastando essas várias mobilizações do cosmopolita – a museológica, a sociológica e a empírica – que desenvolvo a proposição deste trabalho: a saber, que as alegações cosmopolitas são baseadas no pressuposto de que existe um mundo comum antes da sua composição como tal.

DOIS MANIFESTOS MUSEOLÓGICOS

Para muitos de seus interlocutores contemporâneos, o museu público moderno tem o seu começo na expansão da modernidade e se destaca como o bastião da razão iluminista. Por exemplo, Geoffrey Lewis escreve: “[a] ideia de universalidade pode ser encontrada no coração dos primeiros museus públicos” (LEWIS, 2004, p. 40). Ele continua: “[Como] um produto de exploração do mundo e de desenvolvimento do comércio global entre as nações marítimas da Europa Ocidental, esses museus refletiram o espírito de investigação e as iniciativas de sua época” (LEWIS, 2004, p. 40). Da mesma forma, James Cuno localiza a formação do museu moderno no “ideal polimático do Iluminismo” (CUNO, 2008, p. 123). Embora esses relatos estejam inclinados a encobrir as complexidades das histórias de surgimento dos museus modernos – pois são, claro, um corte transversal de museus de diferentes formações nacionais, diferentes experiências de expansão imperial, e práticas rivais de conhecimento que devem, necessariamente, qualificar tais relatos (veja HOOPER-GREENHILL, 1992; BENNETT, 1995) – essas declarações não são, no entanto, fundamentais para as análises históricas. Ao contrário, elas são expressões da política de determinadas práticas presentes: neste caso, a defesa do “museu universal”.

Por exemplo, é a afirmação de Cuno de que esta instituição está imbuída de um legado que nos serve bem no presente, pois apresenta-nos “ao mundo maior do qual somos uma parte […] [e está] baseada no ideal do século XVII de cosmopolitismo: ‘cidadão do cosmos’, do mundo, do universo” (CUNO, 2008, p. 124). Num contexto de rápida globalização, fundamentalismos religiosos reacionários e nacionalismos étnicos, ele aposta que é precisamente esse legado cosmopolita do museu que precisa ser defendido no presente. Cuno anuncia que os museus devem favorecer uma abertura para o mundo e, com ela, a abertura para o cultivo tanto do sentido da humanidade como herdeira de um único patrimônio mundial compartilhado quanto de uma tolerância à sua diversidade. Neste cultivo, ele encontra a ideia cosmopolita do museu virtuoso: “isso é bom para nós, para nossa espécie, para experimentar a total diversidade da indústria cultural humana, a fim de compreender melhor o nosso lugar no mundo, mas como se fosse a partir de uma cultura única e um tempo entre muitos outros” (CUNO, 2008, p. 123).

Apesar do deslizamento problemático entre o universal e o cosmopolita, foi a Declaração do ICOM sobre a Importância e o Valor dos Museus Universais (2006) que regularmente figurou como a expressão formal deste cosmopolitismo. Assinada em 2002 pelos dirigentes de dezoito grandes instituições da Europa e da América do Norte, o documento afirmou: “Museus são agentes no desenvolvimento da cultura… devemos reconhecer que os museus não servem apenas aos cidadãos de uma nação, mas aos povos de cada nação “ (CONSELHO INTERNACIONAL DOS MUSEUS, 2006, p. 248). Esta posição ganhou a aprovação do filósofo proeminente do cosmopolitismo, Kwame Anthony Appiah, que escreveu: “Por mais autopromotora que possa parecer, a alegação do Museu Britânico de ser um repositório do património não apenas da Grã-Bretanha, mas do mundo, parece-me ser exatamente isso” (APPIAH, 2006, p. 2)[4].No entanto, como indica a tensão na afirmação de Appiah, esta é uma posição controversa. Como outros já sustentaram, tais argumentos cosmopolitas, implantados para demolir as alegações de apropriação de propriedade cultural formuladas contra os grandes museus, não estabelecem um diálogo entre o museu e as comunidades pós-coloniais e seus investimentos nos artefatos. Em vez de uma abertura para o outro e sua presença potencialmente perturbadora, o cosmopolitismo, neste contexto, torna-se um ardil para escorar reivindicações anteriores do patrimônio na forma de custódia metropolitana do patrimônio mundial – colocando nos termos de Andrew McClellan (2009), “Cosmocharlatanismo”.

Esta posição pode ser justaposta a The Buffon Declaration: Natural History Institutions and the Environmental Crisis (2007). Em 2007, representantes de 93 instituições de história natural – museus de história natural, institutos de pesquisa, jardins botânicos e zoológicos – de 36 países se reuniram em Paris. Como o nome deixa claro em sua homenagem ao naturalista francês do século XVIII, as instituições signatárias se basearam na herança iluminista para reivindicar o museu universal como seu recurso. Entretanto, a Declaração não se preocupa com a preservação da diversidade cultural em prol de um patrimônio comum da humanidade, mas com a proteção da biodiversidade do planeta da qual “o nosso futuro comum” depende. Concomitantemente, o seu ethos cosmopolita tem como alvo o comportamento, neste caso, não para promover uma tolerância à diversidade cultural, mas voltado à sustentabilidade da biodiversidade. Aqui, os signatários concordaram que suas instituições “são um fórum para o envolvimento direto com a sociedade civil, o que é indispensável para ajudar a realizar as mudanças de comportamento das quais dependem o nosso futuro comum e o futuro da natureza” (THE BUFFON DECLARATION, 2007, p. s/p). Da mesma forma que a declaração sobre o museu universal, este documento visa trabalhar contra reinvindicações de propriedade particular, no interesse da comunidade. Neste caso, há um enclausuramento da biodiversidade na forma de bioprospecção. A Declaração de Buffon (2007, s/p) conclama os “governos e a Convenção sobre Diversidade Biológica: a reconhecerem a diferença entre bioprospecção orientada para o lucro e investigação orientada para a ciência, para o bem público, e – para facilitar a coleta de biodiversidade não comercial e a transferência de espécimes”.

Porém, a posição cosmopolita que motiva estes documentos pareceria ter políticas bastante diferentes. Isso se acreditarmos em Robert Janes – ao registrar sua preferência pela posição tomada pela Declaração de Buffon ao invés da Declaração sobre Museus Universais –, que considera que a primeira demonstra “um interesse explícito […] na tentativa de fazer a diferença”, e a última é “um [manifesto] etnocêntrico e uma relíquia colonial” (JANES, 2009, p. 85)[5]. No entanto, na medida em que estas duas expressões museológicas do cosmopolitismo compartilham pressupostos específicos sobre o mundo comum, para os quais nós – os cidadãos do cosmos – seríamos ajustados através da tolerância e sustentabilidade, há uma sensação de que a Declaração de Buffon também seja conivente com um cosmocharlatanismo. Isto se dá não exatamente no sentido defendido por McClellan, pois estas propostas específicas desviam de uma característica mais amplamente compartilhada das reivindicações cosmopolitas: ou seja, o (auto) engano de que um cosmos, um mundo, um universo, preexiste à sua articulação como tal; e que a tarefa da razão e da ciência é a de ajustar o cidadão cosmopolita a esta condição já dada. É através de um desvio teórico-empírico que defendo o argumento de que esse é o trabalho da razão para acomodar o sujeito-cidadão a um mundo comum já existente.

RISCO GLOBAL E COSMOPOLITIZAÇÃO

A preocupação com as ameaças e riscos para o mundo comum, a serviço do qual o museu se colocaria, é intrínseca a estas expressões museológicas do cosmopolitismo. Isto é, os museus universais se colocam como uma precaução contra o terrorismo e a violência sectária que ameaça a perspectiva de paz universal; enquanto que a Declaração de Buffon trabalha contra a ameaça para a biosfera que a crise ambiental da modernidade global representa para a vida e seu “futuro comum”. O trabalho do teórico social Ulrich Beck é útil aqui por basear suas preocupações em uma única visão analítica, em particular sua reformulação – através da ótica do cosmopolitismo – de sua conhecida tese sobre a “sociedade de risco”. As formulações de Beck sobre o risco global fazem referências frequentes ao terrorismo e à crise ecológica, entre uma infinidade de outras contingências da modernidade global, incluindo acidentes nucleares, a poluição ambiental, os riscos da biotecnologia, mudanças climáticas e crises financeiras (BECK, 1992; 1999; 2008). Como consequências não intencionais da modernização, o que estas “incertezas fabricadas” compartilham é uma ameaça de catástrofe, cuja escala global torna os seus riscos não só fora do alcance do controle de qualquer Estado-nação, mas incalculáveis e irreparáveis em seus efeitos. Pertinente ao meu argumento é a tese de Beck sobre a reflexividade do risco político global.

Beck está preocupado com as perspectivas de solidariedades transnacionais que emergem em face de tais riscos. O risco, ele defende, na modernidade tardia ou reflexiva, cria a base da socialização através da sua capacidade de construir “comunidades de risco” que transcendem as fronteiras nacionais. É inteiramente neste processo que residem as possibilidades cosmopolitas de um falso risco global. Porque o risco global escapa ao sensório humano, essa reflexividade é condicionada pelo processo de dar ver os riscos através da divulgação da ciência. A “intangibilidade das ameaças à civilização”, Beck escreve, “só vêm à consciência no pensamento científico e não podem ser diretamente relacionadas à experiência primária” (BECK, 1992, p. 52). “Tornar as ameaças visíveis publicamente e despertar a atenção em detalhes no próprio espaço vital”, continua ele, fornece os “olhos culturais através dos quais o ‘cidadão cego’ pode, talvez, reconquistar a autonomia do seu próprio juízo” (BECK, 1992, p. 52).

De diversas maneiras, as propostas cosmopolitas dos museus podem ser lidas como este “fazer visível” desta restauração da visão cidadã através da razão secular. Isto é bastante claro em documentos como a Declaração de Buffon, em que uma pedagogia museal investe em advertir o público para as consequências da crise ambiental e da biodiversidade perdida. Também é verdade que o museu universal como projeto de patrimônio mundial e seu sujeito unitário, a humanidade, funciona contra os vários fundamentalismos que ameaçam fragmentar esse sujeito com violência explosiva. É por dar a ver esses riscos que o museu trata de defender a profilaxia da tolerância e da sustentabilidade através da qual um mundo comum deve ser tanto reconhecido como protegido. No entanto, é importante notar aqui – para que eu possa creditar do que essas duas declarações museológicas são herdeiras – que Beck está escrevendo contra a tradição idealista e também contra as expressões de cosmopolitismo implantadas de cima para baixo que elas impõem. Nisso, ele volta-se para Marx.

Não é insignificante que o texto escolhido por Beck ecoe as reflexões de Marx sobre o edifício exibicionista moderno. Escrevendo sobre a Great Exhibition de 1851, Marx e Engels observaram,

Esta exposição é uma prova notável do poder concentrado da grande indústria moderna de estar em todos os lugares, demolindo barreiras nacionais e, cada vez mais, borrando peculiaridades locais de produção, num espírito de comunidade entre todos dos povos (MARX; ENGELS, 1850).

Esta afirmação ressoa com aquelas feitas no Manifesto Comunista, em que Marx e Engels afirmam, “pela exploração do mercado mundial, a burguesia imprime um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países… A estreiteza e unilateralidade nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis” (MARX; ENGELS, 1952 [1848], p. 46-7 [43]). Neste contexto, então, de acordo com a resolução Mansion House, “esperava-se que [a Great Exhibition] inaugurasse a paz universal” (SPENCER, 1971, p. 210), que era, para Marx e Engels, um evento que exemplificava o efeito cosmopolitizador do surgimento de um mercado mundial que superaria o provincianismo nacional. É esta noção de cosmopolitismo como consequência material do processo de globalização que Beck convoca, e que é formalmente desenvolvida no conceito de “cosmopolitização forçada” (BECK, 2007, p. 287). Penso que, a esta dinâmica do risco global, poderíamos recrutar as expressões atuais do cosmopolitismo museológico.

Beck justapõe este conceito de cosmopolitização com ideias normativas do cosmopolitismo. Contrariando as noções que representam o cosmopolitismo como um projeto político – por exemplo, como uma tarefa de ordenar o mundo, tal qual a “constituição que institui a cidadania mundial” de Kant (citado em LINKLATER, 2007, p. 117), ou como o horizonte crítico a partir do qual se leva em consideração o presente na forma da democracia cosmopolita como uma “utopia” necessária[6] –, Beck volta-se para Marx. Isto é, no sentido em que ele também lê cosmopolitização como um “efeito colateral” da globalização, imposto aos sujeitos pelas realidades que os processos sociais de um mundo globalizado infundem sobre eles. No entanto, em The Cosmopolitan Manifesto, Beck estabelece uma distinção em relação ao texto de 1848, em que o primeiro é “sobre o conflito nacional-transnacional” e as desigualdades sociais do risco; e o último sobre contradição de classes (BECK, 1999, p. 14). Para Beck, enquanto a cosmopolitização forçada desmente a integridade territorial do Estado-nação, rompendo as fronteiras nacionais com uma mistura cultural, as suas dinâmicas sociais referem-se às posições do sujeito em relação ao risco, e não às posições de classe.

Beck (2007, p. 287) escreve:

Os riscos globais derrubam as fronteiras nacionais e misturam os nativos com os estrangeiros. O outro distante está se tornando um outro incluído. A vida cotidiana está se tornando cosmopolita. Os seres humanos devem encontrar um sentido da vida no intercâmbio com os outros e não mais no encontro com os semelhantes […] Os riscos globais ativam e conectam os atores além das fronteiras que, do contrário, não querem ter nada a ver um com o outro… [Isso] abre os nossos olhos para as responsabilidades incontroláveis concernentes a algo que poderia nos acontecer, se abater sobre nós.

Por causa de Beck, a cosmopolitização tornou-se um efeito colateral de um mundo sob risco global que solicita o reconhecimento de “um mundo comum, um mundo que, para melhor ou pior, nós todos compartilhamos, um mundo que não possui exterior, nem outro” (BECK, 2010a, p. 178).

Expressões atuais do cosmopolitismo museológico podem ser devidamente usadas nesta dinâmica. Ele não se apoia tanto na tradição filosófica do século XVIII, na qual investem retoricamente seus interlocutores, e mais nos processos reais de globalização, que põem em perigo cada vez mais o mundo comum a serviço do qual está o museu cosmopolita. É para essas ameaças à civilização humana que a expertise museológica gostaria de chamar a atenção do público; seja em relação a um patrimônio cultural universal ou a uma reserva mundial da biosfera comprometida pelas consequências não intencionais de um mundo globalizado. É nesse mundo que estes projetos insistiriam que não há exterior, nem outro.

COSMOPOLITISMO BANAL E O EMPIRISMO DO VISITANTE DE MUSEU

A possibilidade de circunscrever este mundo – um mundo ou uma cidadania global – parece ser dependente de formas cotidianas de cosmopolitismo, através das quais os sujeitos estariam abertos a um mundo comum e às suas obrigações. Porém, nem os manifestos de museus cosmopolitas nem as teorias sociais do risco global oferecem muita influência sobre o empirismo desse cosmopolitismo banal. Assim, eles não proporcionam uma compreensão singular no interior da “disposição cosmopolita” que poderia moldar as subjetividades comuns, ou cotidianas, das quais suas formulações dependem – ao que parece, necessariamente – para seu efeito político. Uma série de pesquisas nos campos da sociologia e dos estudos de museus têm investigado a possibilidade de uma tal disposição em análises qualitativas de sujeitos urbanos nas sociedades capitalistas avançadas. Com base nestas análises, sugiro que tais relatos empíricos do cosmopolitismo são problemáticos, por compartilharem formulações teóricas ou programáticas que eles complementariam. Isto é, no sentido de que eles também presumem um mundo comum. Mas, desta vez, menos como uma imposição filosófica e mais como uma quase-pergunta etnográfica; ou seja, metodologicamente, procede-se perguntando aos entrevistados: “você reconhece este mundo?” – ao mesmo tempo, ao que parece, na plena confiança de sua presença. Entre outras coisas, esta presunção negligencia as relações humano/não humanos através das quais este mundo compartilhado poderia vir a ser composto. Ao desenvolver esta afirmação, volto-me para a noção de cosmopolítica, que ressalta o antropocentrismo em que tais formulações cosmopolitas se baseiam.

Na literatura sociológica, as afirmações teóricas da existência de um cosmopolitismo cotidiano ou banal – como figurada, por exemplo, na noção de cosmopolitização forçada de Beck – foram de encontro com o argumento de que estas reivindicações exigem uma substantiva comprovação empírica. Vários estudos têm buscado medir as “disposições cosmopolitas” do cotidiano. Por exemplo, John Urry e seus colegas usaram grupos focais para investigar o sentimento cosmopolita no noroeste da Inglaterra. Explorando temas de mobilidade e cosmopolitismo, esta pesquisa foi realizada com o intuito de investigar se “afirmações sobre o cosmopolitismo contemporâneo são empiricamente significativas” ou não (URRY; SZERSZYNSKI, 2002, p. 471; ver também SZERSZYNSKI; TOOGOOD, 2000; URRY, 2003). Mais recentemente, Zlatko Skrbis e colaboradores conduziram pesquisas semelhantes em Brisbane, Austrália, detendo-se sobre a ambivalência do “cosmopolitismo comum” (SKRBIS, KENDALL, WOODWARD 2004; SKRBIS; WOODWARD, 2007). Estes trabalhos são esclarecedores ao examinarem a banalidade cosmopolita e demonstrarem os limites do seu alcance e a ambivalência de sua implantação. Em seus resultados, Urry (2003, p. 9) observou:

Encontramos pouca evidência da hipótese que tínhamos colocado sistematicamente relativa à tese da “cidadania global”… Houve uma forte consciência das relações […] ampliadas, conectando as pessoas a outras pessoas, lugares e ambientes […] [No entanto] os entrevistados em geral acharam difícil sair da conexão da comunidade da qual fazem parte para uma comunidade global maior e mais abstrata, pois esta parecia não ter o imediatismo e a tangibilidade imputáveis à primeira.

Resumindo suas descobertas, Skrbis e Woodward (2007, p. 745-6) sustentam que:

[…] a ambivalência é uma característica estrutural do discurso do cosmopolitismo banal através da qual os indivíduos estão fazendo julgamentos reflexivos e deliberativos em relação aos domínios locais e globais[…] Assim, as pessoas não se tornam apenas mais ou menos abertas e cosmopolitas, mas elas reservadamente configuram seus cosmopolitismos, permitindo-nos reconciliar as lacunas que frequentemente ocorrem entre o compromisso filosófico das pessoas com a abertura cosmopolita e práticas muitas vezes limitadas.

Embora, sem dúvida, seja temerário generalizar a partir desses estudos, não são apenas as argumentações da teoria social que estes resultados complicam, eles igualmente qualificam os dos manifestos dos museus aos quais me refiro. Isso ocorre na medida em que esses estudos sugeririam que o museu cosmopolita teria um público ambivalente para suas pretensões de sustentabilidade e tolerância com as quais precisam lidar. E, talvez, faça com que a ideia óbvia de que os apelos museológicos para a mudança de comportamento em prol dos interesses de um mundo comum tendam a ser tratadas com ambivalência. Ainda mais importante é reconhecer um dissenso, sugerindo que, longe de existir, um mundo comum ainda está por ser composto.

Aspectos da pesquisa empírica Hot Science, Global Citizens: The Agency of the Museum Sector in Climate Change Interventions podem ser lidos como apoio a esta alegação[7]. Este projeto conduziu um grupo focal de pesquisa em Sydney, Melbourne e Nova Jersey em 2009. Parte desse estudo focalizava, especificamente, as disposições cosmopolitas dos visitantes do museu, tendo em vista que eles são solicitados em relação ao risco global postulado pelas mudanças climáticas. O objetivo, como afirmado no resumo da pesquisa, era “entender o senso de conectividade global dos entrevistados sobre as alterações climáticas” e os seus pontos de vista sobre a responsabilidade para com os outros, dada a distribuição desigual do risco que elas impõem. Como estímulos à discussão, foram utilizados o vídeo do Greenpeace, A Future for Kiribati, que abordou a inundação dessas ilhas, e uma declaração contundente de Nicholas Stern: “é injusto que os países mais pobres sejam os mais prejudicados, já que são os que menos contribuíram para as causas das mudanças climáticas” (STERN, 2006, p. vi-vii). Abaixo apresento um breve relato sobre as conclusões pertinentes[8].

As perspectivas que surgiram entre os entrevistados com relação a esses outros que estão distantes, foram marcadas pela ambivalência. Por exemplo, as respostas ao vídeo oscilaram entre declarações endossando “uma responsabilidade humanitária”, que categoricamente reclamavam uma responsabilidade para com os outros distantes, e alguns que sugeriram uma menor responsabilidade. Este último grupo trouxe respostas mais aprofundadas, por diversos motivos, incluindo a incerteza de que a mudança climática seria um fenômeno genuíno; ou, nos grupos australianos, que outros países desenvolvidos deveriam ter um maior grau de responsabilidade, pois a Austrália é apenas uma pequena nação no cenário mundial. Outros entrevistados simplesmente não quiseram se manifestar, alegando que “temos de cuidar de nós mesmos neste momento”. Tais reações foram mais expressivas entre os entrevistados da América, pois estavam sob o impacto da evolução da crise financeira mundial sobre suas próprias vidas. Para aqueles que expressaram empatia pelos habitantes de Kiribati, a questão da responsabilidade foi recebida com perplexidade e pesar. Aqui, houve uma reflexividade geral sobre este sentimento nos grupos focais. Os entrevistados que sentiram compaixão reconheceram-na como uma empatia vazia, uma vez que não se converteu em ação. Um dos entrevistados afirmou que somos “todos culpados”, em todos nós há algum grau de “falta de empatia” – destacando, talvez, o limite antropológico da responsabilidade.

Os problemas da mediação e da distância foram cruciais para a limitação dessas questões. Para alguns, o vídeo promoveu uma série de estratégias para acabar com a distância social entre eles e os sujeitos presentes no vídeo. Estas incluíam: a inversão da relação (“imaginar como se fosse Bondi”); estabelecer uma temporalidade aproximada entre aqui e lá (“uma remota ilha um dia e em seguida uma cidade”); a identificação com uma posição de sujeito partilhada (“a mãe vai sentir o sofrimento de [outra] mãe em outro país”); e a universalização do particular (“a terra é aquela pequena ilha, não há outro lugar para irmos”). Outros entrevistados consideraram a situação dos habitantes das ilhas como preditiva de seu próprio destino e horizonte. Como um dos integrantes do debate colocou: o vídeo mostra “em qual direção estamos indo”. Por outro lado, os entrevistados comentaram que uma mídia saturada com catástrofes não gera empatia, mas a apatia. Ela produz uma hierarquia de calamidades através das quais as pessoas se distanciam do sofrimento dos outros (“é terrível… mas não é tão mau como…”). Isto levou os entrevistados a ressaltarem a condição de fadiga da compaixão: você se torna “complacente”. Para alguns, o vídeo não gerava empatia nem indiferença para com os outros, mas sim preocupação com o eu; isto é, com sua própria segurança e prosperidade. O lado negativo foi que isso expressou um medo latente de cair em dificuldades pessoais e pobreza. O lado positivo foi que forneceu uma avaliação favorável de segurança, conforto e riqueza já existentes: “temos bastante sorte aqui”. Nesse sentido, parece que a mediação do sofrimento distante lembra os entrevistados de sua própria vulnerabilidade, e ao mesmo tempo proporciona-lhes “a garantia evasiva de que coisas piores acontecem em outros lugares” (COHEN, 2001, p. 20 apud CHOULIARAKI, 2008, p. 398).

Enquanto os participantes, indubitavelmente, se reconheceram e se experimentaram em termos de um mundo globalizado, pelo menos em algumas ocasiões, os seus compromissos com o horizonte normativo de pertencimento cosmopolita foram marcados pela ambivalência. Há uma lacuna visível – sobre a qual os entrevistados eram muitas vezes reflexivos – entre o seu compromisso professado com o ethos cosmopolita e seus modos particulares de comportamento. Frequentemente, estes são expressos como uma perplexidade diante da natureza abstrata da crise climática; ou, com um pouco menos de frequência, em uma atitude defensiva limitada na presença de forças globais aparentemente esmagadoras. De qualquer maneira, os conceitos de conectividade e responsabilidade global que os entrevistados colocaram pareciam estar muito firmemente enraizados em noções de cidadania e de pertencimento locais: de responsabilidade individual, de família, de lugar.

De fato, para construir empatia pelos outros que estão fora dessas categorias, eles foram engajados em estratégias que os trouxeram para esta dobra do familiar. Os resultados revelam ambivalências cosmopolitas – aqueles que consideram que a mudança climática cria obrigações profundas para com os outros distantes, mas se identificam com a necessidade de defender os interesses locais, e os que reconhecem que algo deve ser feito, porém ainda não sabem o que fazer, oscilando entre empatia e apatia, entre complacência e medo.

Nesses dados, embora haja um senso de interconexão global, isso não se traduz em modos de solidariedade e responsabilidade sinalizados pela ideia de cidadania cosmopolita, de um pertencimento a um mundo comum. Antes, os sujeitos expressaram uma relação não definida com esta interligação. Pode-se deduzir que a cosmopolitização forçada não oferece nenhuma relação necessária para com a dinâmica cosmopolita; é tão susceptível de levar a um refugio na comunidade de pertencimento quanto a uma abertura cosmopolita. Viver com a materialidade da globalização e seus riscos concomitantes não necessariamente leva ao reconhecimento de, e a identificação com, um mundo comum. É aqui que me volto para a noção de cosmopolítica, pois esta expande radicalmente este dissenso deixado de lado, rapidamente, pelo arranjo cosmopolita.

A COSMOPOLÍTICA

Bruno Latour avançou nesta formulação em contextos pertinentes ao meu argumento, inclusive na discussão com Beck (LATOUR, 2004; ver também LATOUR, 2003); e na potência curatorial da exposição Making Things Public: Atmospheres of Democracy (LATOUR; WEIBEL, 2005). Interrogando formulações de Beck sobre o cosmopolitismo, Latour argumenta que essa tese repousa em uma premissa não reconhecida: que a razão científica revelará a presença de um mundo já existente com o qual o cidadão cosmopolita deve ser reconciliado. Para Latour, esta é uma posição falha. Beck, ele escreve,

[…] não percebe […] que sempre que o cosmopolitismo é experimentado, da Alexandria até a Organização das Nações Unidas, tem sido durante os grandes períodos de total confiança na capacidade da razão e, mais tarde, da ciência para conhecer um cosmos único cuja existência e solidez certamente poderia, então, sustentar todos os esforços para construir a metrópole mundial à qual todos estamos muito felizes de pertencer como cidadãos. O problema que enfrentamos agora é, precisamente, o desse ‘cosmos único’, que eu chamo mononaturalismo, que desapareceu (LATOUR, 2004, p. 453).

De acordo com Latour, o mononaturalismo é uma premissa despercebida por todas as alegações cosmopolitas. É esta natureza, conhecida pela razão, que fornece o terreno comum pelo qual toda a ação humana pode ser medida, e é sobre esta natureza que as alegações cosmopolitas necessariamente justificam a sua universalidade. É, assim, a base para o arranjo cosmopolita, onde todos os seres humanos se reúnem como uma comunidade política no “nós” que é a cidadania do mundo. Tais relatos sofrem de uma “cegueira antropológica: a natureza, o mundo, o cosmos, estão simplesmente lá; e uma vez que os humanos partilham de características básicas, a nossa visão do mundo é, em suma, a mesma em todos os lugares” (LATOUR, 2004, p. 453). Para Latour, então, o cosmopolitismo é equivocado porque pressupõe precisamente o que está faltando: o cosmos.

É contra esta posição que Latour avança com a noção de cosmopolítica, buscando recusar o encerramento da política no exclusivamente humano e evitar o pressuposto de um cosmos preexistente à espera de reconhecimento. Baseando-se em formulações de Isabelle Stengers, Latour (2004, p. 454) escreve:

A presença do cosmos na cosmopolítica resiste à tendência da política de significar o dar-e-receber restrito a um grupo exclusivamente humano. A presença da política na cosmopolítica resiste à tendência do cosmos de significar uma lista finita de entidades que devem ser levadas em conta. O cosmos protege contra o encerramento prematuro da política, e a política contra o encerramento prematuro do cosmos.

Para Latour, política diz respeito aos modos pelos quais o humano e o não humano são compostos e as associações que formam; enquanto o cosmos, “se for para significar qualquer coisa, deve abraçar, literalmente tudo, incluindo o vasto número de entidades não humanas que fazem agir os humanos” (LATOUR, 2004, p. 454). Por esta razão, como um dos seus interlocutores coloca, “toda a realidade é política, mas nem toda a política é humana” (HARMAN, 2009, p. 98).

Um mundo comum para Latour (2004, p. 455) não pode ser “algo que venha a se reconhecer como sempre tendo estado aqui (e nós até agora não percebemos isso)”. Não pode preexistir à sua articulação. Em vez disso, um mundo comum deve ser composto através de cadeias de atores humanos e não humanos. A cosmopolítica é esse trabalho de composição de um mundo compartilhado. Um mundo comum, escreve ele, “se vier a existir um, é algo que teremos de construir, com unhas e dentes, juntos”;

Os cosmopolitas podem sonhar com o momento em que os cidadãos do mundo venham a reconhecer que todos eles habitam o mesmo mundo[…] os cosmopolíticos, ao contrário, investem numa tarefa mais difícil: ver como este “mesmo mundo” pode ser composto lentamente (LATOUR, 2004, p. 457).

Em seu Compositionist Manifesto, Latour (2010) descreve esta alternativa às teorias da modernidade, reflexivas ou não. Aqui, ele identifica uma “relação tênue” com o Manifesto Comunista. Assim, ao rejeitar o último por seus compromissos modernistas, ele afirma: “os dois manifestos têm algo em comum: a saber, a busca pelo Comum” (LATOUR, 2010, p. 14). No entanto, na empreitada de se separar de Marx, e certamente de Beck, acrescenta a condição de que isso acontece com uma “pequena mas fundamental diferença, de que [o mundo comum] tem de ser lentamente composto, em vez de ser tomado como garantido e imposto a todos” (LATOUR, 2010, p. 15).

Para Latour, esta composição do comum é primordial como uma questão de ecologia: “Como pode uma ‘casa’ habitável e respirável ser construída para […] [as] massas?”. Essa, escreve ele, “é a única questão que vale a pena levantar neste Compositionist Manifesto. […] como vamos encontrar uma casa sustentável em Gaia?”(LATOUR, 2010, p. 15).

Em sua contribuição para o catálogo da exposição Making Things Public: Atmospheres of Democracy, Stengers (2005) convoca o “idiota” de Deleuze, aquele que sabe como retardar as coisas para evitar a pressa para o consenso. Aquele

[…] que resiste à forma consensual em que a situação é apresentada e na qual as emergências mobilizam o pensamento ou a ação. Não porque a situação seria falsa ou porque as emergências fossem tidas como mentiras, mas porque ‘há algo mais importante’. (STENGERS, 2005, p. 994).

O idiota, Stengers (2005, p. 995) continua, “exige um retardo nosso, que não nos consideremos autorizados a acreditar que possuímos o significado do que sabemos”. É a partir dessa perspectiva cosmopolítica que ela invoca uma pergunta dupla:

Como desenhar o cenário político de maneira a protegê-lo ativamente da ficção de que “os seres humanos de boa vontade decidem em nome do interesse geral?”[…] [E] como desenhá-lo de um modo que o pensamento coletivo tenha que prosseguir na “presença dos que, de outra forma, seriam susceptíveis de ser desqualificados, por não terem idiotamente nada a propor, dificultando a emergência de uma ‘narrativa comum’? (STENGERS, 2005, p. 1002).

A crise em curso com as mudanças climáticas antropogênicas exige que as decisões que antes pareciam não ter nada a ver com o povo de Kiribati, ursos polares, geleiras, a corrente do Golfo, ou o ciclo do carbono, devam agora ser tomadas em suas presenças, juntamente com inúmeros outros atores humanos e não humanos, se formos trabalhar na direção da composição de um mundo comum – uma habitável e respirável “casa” no planeta Terra. Talvez, o museu cosmopolítico possa vir a apresentar propostas através das quais “nós” pensemos em nossas decisões na presença daqueles outros desqualificados pelas fronteiras da nação, da espécie, do vivo, não no pressuposto de que partilhamos um mundo comum, mas de que estamos envolvidos no trabalho duro da sua composição. Para lembrar a afirmação de Hebda com a qual abri este artigo: no que diz respeito à crise climática, nós nos encontramos em redes de relações muito mais complexas do que a metáfora da “encruzilhada” permitiria entender; aqui o “papel vital” dos museus pode residir em experimentos cosmopoliticos que – ao enfrentarem a exigência do idiota de que “nós não nos consideramos autorizados a acreditar que possuímos o significado do que conhecemos” – retardem as decisões “sobre que rumo tomar” e abram a possibilidade de um mundo comum.

 

Tradução de Susana Dias

 


REFERÊNCIAS

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Recebido: 20/07/2015

Aceito: 20/07/2015

 


[N. do T.] Todas as citações foram livremente traduzidas para esta versão do artigo, exceto a do Manifesto Comunista que acompanha a tradução brasileira de Álvaro Pino para a Boitempo.

[1] Este artigo foi originalmente publicado sob o título “Museums and a Common World: climate change, cosmopolitics, museum practice” na revista Museum and society, v. 9, n. 2, p. 154-165, jul. 2011 (https://www2.le.ac.uk/departments/museumstudies/museumsociety/documents/volumes/dibley.pdf), e gentilmente cedido pelo autor para tradução e publicação no Dossiê Desaparecimento.

[2] Ben Didley é pesquisador associado ao Institute for Culture and Society, University of Western Sydney. Tem publicações recentes no International Journal of Cultural Studies, Cultural Studies Review e New Formations.

[3] [N. do T.] Essa tradução (cosmopolitismo e cosmopolitização) foi mantida em razão do amplo uso nas traduções brasileiras da obra de  Ulrich Beck. A tradução mais próxima seria “cosmopolitinismo” e “comopolitinização” que, entretanto, são palavras que não existem em português. .

[4] O Museu Britânico não era signatário da Declaração do ICOM.

[5] Enquanto a primeira solicitou um debate acalorado, Jane observa que a última restou, apesar de “inovadora […] em grande parte não divulgada” (JANE, 2009, p. 85).

[6] Por exemplo, veja a obra de Habermas, Held e Honneth.

[7] Os resultados pertinentes deste estudo estão relatados em Cameron et al. (2011).

[8] O material dos parágrafos a seguir foi retirado de HSGC Report Five (2010).

Museus e um mundo comum: mudanças climáticas, cosmopolíticas e prática museológica[1]


Ben Dibley[2]


RESUMO: O que se coloca neste artigo é a natureza das relações entre a instituição museu e o mundo comum. Considera-se que tais relações são geralmente afirmadas através de apelos cosmopolitas, que se fundamentam no pressuposto de que um cosmos, um mundo, um universal, preexiste à sua articulação, e que é a tarefa da razão e da ciência é ajustar o sujeito-cidadão a esta condição já preexistente. Este artigo argumenta que essa é uma posição falha e assume, de fato, o que é necessário construir: um mundo em comum. Em defesa dessa proposição, exploram-se duas declarações recentes de cosmopolitismo museal: a Declaração do Conselho Internacional de Museus (International Council of Museums – ICOM) sobre “museu universal”, que incide sobre a unidade do patrimônio cultural da humanidade; e a Declaração de Buffon, que diz respeito às instituições de história natural e ao risco ao patrimônio natural da humanidade. Na sequência, este artigo volta-se para o que poderia ser chamado de empirismo do cosmopolitismo do visitante do museu, examinando a investigação qualitativa do cosmopolitismo banal, ou cotidiano, que é amplamente ignorado por tais declarações. Estas diferentes articulações museológicas de um mundo comum são, por sua vez, avaliadas através da justaposição de duas sociologias: o cosmopolitismo de Ulrich Beck e o composicionismo de Bruno Latour. Em oposição a essas várias mobilizações do cosmopolita – a museológica, a empírica e a sociológica – é que este artigo avança em sua proposta: isto é, argumentar que estes posicionamentos cosmopolitas estão baseados no pressuposto de que um mundo comum existe antes de sua composição como tal.

PALAVRAS-CHAVE: Mundo comum. Cosmopolíticas. Cosmopolitismo. Prática museológica. Mudanças climáticas.

 


 

Museums and a common world: climate change, cosmopolitics, museum practice

 

ABSTRACT: At stake in this paper is the nature of the relationship between the institution of the museum and the common world. It is contended that such relations are regularly asserted through cosmopolitan appeals, which are premised on the assumption that a cosmos, a world, a universal, pre-exists its articulation, and, that it is the task of reason and of science to adjust the citizen-subject to this already-present condition. This paper argues that this is a flawed position because it assumes, in fact, what is required to be built: a world in common. In defence of this proposition, two recent declarations of museum cosmopolitanism are explored: ICOM’s declaration on the ‘universal museum’, which focuses on the unity of the cultural heritage of humankind; and the Buffon Declaration, which concerns institutions of natural history and the imperilment of humanity’s biospheric inheritance. Subsequently, the paper turns to what might be called the empirics of the cosmopolitanism of the museum visitor. This examines the qualitative investigation of banal or everyday cosmopolitanism, which is largely ignored by such museum declarations. These different museological articulations of a common world are, in turn, reviewed through the juxtaposition of two sociologies: Ulrich Beck’s cosmopolitanism and Bruno Latour’s compositionism. It is in contrasting these various mobilizations of the cosmopolitan – the museological, the empirical and the sociological – that the paper advances its proposition: namely, that these cosmopolitan claims are based on the assumption that a common world exists prior to its assemblage as such.

KEYWORDS: Common world. Cosmopolitics. Cosmopolitanism. Museum practice. Climate change.