Multiplicando a Micro: rastreando questões de interesse | Lucas Riboli Besen, Helena Moura Fietz
Lucas Riboli Besen [1]
Helena Moura Fietz[2]
FLEISCHER, Soraya; LIMA, Flávia (Orgs.). Micro: contribuições da Antropologia. 1ª edição. Brasília: Athalaia, 2020. 188 p.
O debate sobre a escrita etnográfica rendeu bons frutos no decorrer dos últimos anos. Desde a marcante resposta de Lila Abu-Lughod ao Manifesto for Ethnography (2000), temos debatido sobre a capacidade da Antropologia localizar tanto os/as interlocutores/as quanto os/as etnógrafos/as na escrita sobre o Outro. A discussão está longe de acabar, como demonstrou Claudia Fonseca (2017). Ao estabelecer um diálogo direto com Akhil Gupta e James Ferguson, a antropóloga se questionou sobre como cumprir a promessa dos autores de “esboçar linhas possíveis de aliança” (2017, p. 455-6). Para Fonseca, é a perspectiva lançada por Latour de “viver num mundo comum” (FONSECA, 2017, p. 461) aliada à uma “ética do cuidado” (BELLACASA, 2011) que nos permite destacar esse caráter inescapavelmente político da produção acadêmica. É no campo etnográfico, no encontro com o Outro, que a Antropologia se faz viva, desafiada a (re)negociar coletivamente compromissos políticos e éticos. Para Fonseca, essa etnografia é responsiva e provocadora.
É justamente este o caso de Micro: contribuições da Antropologia, organizado por Soraya Fleischer e Flávia Lima. Através de escrita coletiva e feminina, o livro toma para si a tarefa de pensar política e eticamente o papel das pesquisas desenvolvidas e do livro, que agora materializa uma trama etnográfica de humanos e não-humanos. Afetadas pela epidemia que surgia em 2015, foi através de cartas que essa rede começou a ser criada e mantida, por meio de contatos presenciais e à distância.
Neste sentido, podemos dizer que as autoras dos onze textos que compõem esta obra engajam-se com a proposta de Maria Puig de la Bella Casa (2011; 2017) para que pensemos com (o) cuidado. Não apenas por estarem falando destas práticas contingenciais, situacionais, morais e tão comumente invisibilizadas que são as práticas de cuidado, mas por destacarem ao longo do livro as tantas associações necessárias para que estas se deem. Associações tão comumente invisibilizadas não apenas no cotidiano de suas interlocutoras que veem um Estado e uma população que cada vez se importa menos com suas questões, mas mesmo por outros pesquisadores e cientistas com os quais tanto conviveram. O cuidado, como nos lembra Puig de la Bella Casa (2017, p. 6), é uma “intervenção ética e política envolvente que afeta a todos aqueles que estão pesquisando o cuidado. Por que falar do ‘bom cuidado’ – ou de um cuidado tão bom quanto o possível – nunca é neutro”. A leitura de Micro nos chama a também adentrar os aspectos éticos e políticos de sua pesquisa (leia a resenha completa em pdf).
Recebido em 02/11/2020
Aceito em 30/11/2020
[1] Doutor em Antropologia Social. Pós-doutorando no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS/UFRGS). E-mail: misterbesen@gmail.com
[2] Mestra em Antropologia Social. Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS/UFRGS). E-mail: helenafietz@gmail.com
Multiplicando a Micro: rastreando questões de interesse
FLEISCHER, Soraya; LIMA, Flávia (Orgs.). Micro: contribuições da Antropologia. 1ª edição. Brasília: Athalaia, 2020. 188 p.
BESEN, Lucas Riboli; FIETZ, Helena Moura. Multiplicando a micro: rastreando questões de interesse. ClimaCom – Epidemiologias [online], Campinas, ano.7, n.19, Dez. 2020. Available from:https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/multiplicando-a-micro/