Flagrantes artísticos urbanos: o olhar digital antes e durante o isolamento social provocado pela Covid-19 | Adriana Silvestrini
Adriana Silvestrini [1]
Março de 2020. A partir dessa data, a maior parte da população mundial se isolou socialmente. O confinamento recomendado em alguns países e obrigatório em outros aconteceu em função do surgimento de um vírus mortal e desconhecido. Instalado no organismo, transmitido pelo ar, tem potencial para aniquilar os pulmões e, consequentemente, fazer o coração de qualquer ser humano parar. Um vírus liberto que não têm preferência por cor, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual nem situação econômica.
Na tentativa de impedir o contágio em massa deste vírus que circula livremente entre nós, a OMS (Organização Mundial da Saúde) sugeriu que os governantes bloqueassem, então, a circulação de pessoas em espaços públicos. Enquanto cientistas corriam e ainda correm contra o relógio em busca de respostas e soluções, trancar a vida dentro de casa tornou-se a norma. Mas só para quem tinha/tem um teto para servir de abrigo e o privilégio de garantir sua sobrevivência sem precisar sair de casa. A presença do vírus também escancarou a crise sanitária instalada há anos em bairros, cidades e países subdesenvolvidos. No caso do Brasil, a desigualdade social se apresentou com nome, sobrenome, cor, raça e endereço. O Covid-19 encontrou na população periférica sobrevivente condições muito mais propícias para seu alastramento.
Sem possibilidade de ir à escola, ao trabalho, ao cinema, ao médico, às compras ou simplesmente perambular pelas ruas, indivíduos criaram suas “comunidades” virtuais. Os encontros que, até então, ocorriam em espaços públicos passaram a acontecer em ambientes privados por meio de diferentes dispositivos eletrônicos, sejam eles, celulares, computadores, tablets etc.
As lives viraram a sensação do momento ocupando a agenda diária de muita gente, afinal, o que não faltou foi oferta de temas. Teve culinária para quem gostava de cozinhar, meditação para quem quis relaxar, atividade física para quem optou em manter o corpo em forma e declaração de amor para quem arriscou se apaixonar remotamente. A sala de casa, feito camaleão, se transformou no escritório de home office e sala de aula de estudantes, desde a pré-escola até o pós-doutorado. As telas dos aparelhos, novos lugares de disputa de atenção, abrigaram sujeitos interagindo, sozinhos ou acompanhados. Paradoxalmente o espaço privado virou público (leia o ensaio completo em pdf).
Recebido em 30/10/2020
Aceito em 02/12/2020
[1]Mestranda em Divulgação Científica e Cultural no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Jornalista e filósofa. E-mail: dri.silvestrini@gmail.com
Flagrantes artísticos urbanos:
o olhar digital antes e durante o isolamento social provocado pela Covid-19
RESUMO: A proposta deste ensaio é refletir sobre sujeitos, corpos, afetos e arte em discursos expostos por meio das tecnologias, antes e durante a pandemia de Covid-19. Os entendimentos de Eni Puccinelli Orlandi e Cristiane Dias sobre as cidades, seus sentidos e suas interações são pontos principais que contribuem para a discussão. O isolamento social, causado pelo contágio do vírus, fez com que as cidades ficassem vazias, mas não caladas. O espaço público sem público deu lugar para intervenções tecnológicas. Frases e imagens foram projetadas nos chãos de praças públicas, nas paredes de edifícios, em viadutos etc. Vozes falando, declamando, cantando, se rebelando ecoaram das janelas e das varandas. A recomendação para ficar em casa ajuda a salvar vidas, mas interfere na mobilidade, no simples ato de ir e vir. Afetada por esse bloqueio momentâneo de circulação, exponho aqui minha subjetividade ao compartilhar meus flagrantes artísticos urbanos registrados pela câmera do meu celular, antes do início do isolamento social. Atualmente, essas são minhas memórias digitais de uma cidade clicável.
PALAVRAS-CHAVE: Corpos. Arte. Isolamento social.
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Artistic urban flagrant:
digital overview before and during social distancing caused by Covid-19
ABSTRACT: The purpose of this essay is reflecting about subjects, bodies, affections and art in discourses exposed through technologies, before and during the Covid-19 pandemic. The understandings of Eni Puccinelli Orlandi and Cristiane Dias about cities, their senses and their interactions are main points that contribute to the discussion. Social isolation, caused by the contagion of the virus, has left cities empty but not silent. The public space without public gave way to technological interventions. Phrases and images were projected on the floors of public squares, on the walls of buildings, on overpasses etc. Voices talking, chanting, singing, rebelling echoed from windows and balconies. The recommendation to stay at home helps save lives but interferes in the mobility, the simple act of coming and going. Affected by this momentary blockade of circulation, I expose my subjectivity here by showing my artistic urban flagrant recorded by the camera of my cell phone, before the beginning of social isolation. These are currently my digital memories of a clickable city.
KEYWORDS: Bodies. Art. Social distancing.
SILVESTRINI, Adriana. Flagrantes artísticos urbanos: o olhar digital antes e durante o isolamento social provocado pela Covid-19. ClimaCom – Epidemiologias [Online], Campinas, ano 7, n. 19, Dez. 2020. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/flagrantes-artisticos-urbanos/