Exu e a epistemologia do corpo decolonial | Leticia de Paula e Silva Andrade e Marco Tulio Cunha Vilela
Leticia de Paula e Silva Andrade[1]
Marco Tulio Cunha Vilela[2]
Introdução
Após séculos de colonialismo epistêmico e silenciamento das cosmopercepções[3] não europeias, os povos subalternizados (indígenas, negros, quilombolas, periféricos) começam, com cada vez mais força, a ocupar o espaço discursivo que historicamente lhes foi interditado. Antes impedidos de falar, se moviam em silêncio, camuflados na dança e na oralidade, esgueirando-se pelas frestas da hegemonia para não serem capturados pela sanha autoritária do eurocentrismo. Agora, livres como o vento que atravessa as esquinas e os terreiros, sopram aos quatro cantos: “Não de mim, não de tu, mas da natureza e dos meus ancestrais tendo ouvido, tudo é tudo[4]”.
Neste universo cosmo-sagrado, onde tudo o que existe se move com Asé (energia vital), não há separação entre corpo, espírito e pensamento. A Terra fala. O corpo responde. O tempo não vinga, não redime, apenas gira, espiralado, em ziguezague, em tambor. Nada caminha em linha reta quando se dança com Exu. O mestre das encruzilhadas não se limita à dicotomia. Ele rompe a lógica binária, bagunça os discursos totalizantes, semeia pluralidades. Exu é movimento, instabilidade criadora, vibração que convoca não à abstração, mas à presença viva e encarnada do saber.
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Recebido em: 15/09/2025
Aceito em: 15/10/2025
[1] Doutorando em Educação pela UFU e bolsista CAPES. Mestra em Educação Geográfica. Graduada em Geografia. Email: leticiandr97@gmail.com
[2] Mestre em Educação Pela UFU. Formado em Filosofia pela Faculdade Católica de Uberlândia. Professor da educação básica da Rede municipal de ensino de Uberlândia . Email: mtulio0507@hotmail.com
[3] Utilizamos o termo Cosmopercepção em contraposição ao termo cosmovisão porque “O termo “cosmovisão”, que é usado no Ocidente para resumir a lógica cultural de uma sociedade, capta o privilégio ocidental do visual. É eurocêntrico usá-lo para descrever culturas que podem privilegiar outros sentidos. O termo “cosmopercepção” é uma maneira mais inclusiva de descrever a concepção de mundo por diferentes grupos culturais. Neste estudo, portanto, “cosmovisão” só será aplicada para descrever o sentido cultural ocidental e “cosmopercepção” será usada ao descrever os povos iorubás ou outras culturas que podem privilegiar sentidos que não sejam o visual ou, até mesmo, uma combinação de sentidos” (OYĚWÙMÍ, 1997, p. 3).
[4] Paráfrase do aforismo de Heráclito: “Não de mim, mas do Logos tendo ouvido, é sábio afirmar: tudo é um”. A paráfrase tem como intenção subverter a ideia de Heráclito, utilizada pelos idealistas alemães, principalmente Hegel, como manifestação do espírito humano como Logos. Logos que é traduzido como racionalidade conceitual especulativa, a qual, na opinião dos idealistas, seria própria e originária do mundo helênico.
Exu e a epistemologia do corpo decolonial
RESUMO: No universo cosmo-sagrado de Exu, onde tudo o que existe se move com Asé (energia vital), não há separação entre corpo, espírito e pensamento. A Terra fala. O corpo responde. O tempo não vinga, não redime, apenas gira, espiralado, em ziguezague, em tambor. Nada caminha em linha reta quando se dança com Exu. O mestre das encruzilhadas não se limita à dicotomia. Ele rompe a lógica binária, bagunça os discursos totalizantes, semeia pluralidades. Exu é movimento, instabilidade criadora, vibração que convoca não à abstração, mas à presença viva e encarnada do saber. Neste sentido, esta escrita-oferenda propõe convocar Exu como operador epistêmico. Aqui, Exu não aparece apenas como entidade espiritual ou figura mítica, mas como figura semiótica, símbolo de uma epistemologia do corpo decolonial que desestabiliza as verdades fixas e rompe com os alicerces do conhecimento colonial. Exu é chamado como arauto da pluralidade ontológica, como figura que dissolve fronteiras entre pensamento e existência, entre conceito e corpo.
PALAVRAS-CHAVE: Exu; Epistemologia; Decolonialismo; Corpo; Pedagogia.
Exu y la epistemología del cuerpo decolonial
ABSTRACT OU RESUMEN: En el universo cosmosacral de Exu, donde todo lo existente se mueve con Asé (energía vital), no hay separación entre cuerpo, espíritu y pensamiento. La Tierra habla. El cuerpo responde. El tiempo no venga ni redime; simplemente gira, en espiral, en zigzag, como un tambor. Nada se mueve en línea recta cuando danza con Exu. El maestro de las encrucijadas no se limita a la dicotomía. Rompe la lógica binaria, perturba los discursos totalizadores y siembra pluralidades. Exu es movimiento, inestabilidad creativa, una vibración que convoca no a la abstracción, sino a la presencia viva y encarnada del conocimiento. En este sentido, esta escritura-ofrenda propone invocar a Exu como operador epistémico. Aquí, Exu aparece no solo como una entidad espiritual o figura mítica, sino como una figura semiótica, símbolo de una epistemología del cuerpo decolonial que desestabiliza las verdades fijas y rompe con los cimientos del conocimiento colonial. Exu es invocado como heraldo de la pluralidad ontológica, como figura que disuelve las fronteras entre pensamiento y existencia, entre concepto y cuerpo.
PALABRAS CLAVE: Exu; Epistemología; Decolonialismo; Cuerpo; Pedagogía.
ANDRADE, Leticia de Paula e Silva; VILELA, Marco Tulio Cunha. Exu e a epistemologia do corpo decolonial. ClimaCom – Exu: arte, epistemologia e método [online], Campinas, ano 12, n. 29., dez. 2025. Available from: http://climacom.mudancasclimaticas.net.br/epistemologia-do-corpo-decolonial/
