Encruzilhada autônoma: Exú e a ressignificação do sujeito de direito | Arauí da Conceição Geraldo e Jessica Hind Ribeiro Costa


 

Arauí da Conceição Geraldo[1] 

Jessica Hind Ribeiro Costa[2]

 

Introdução

 

A construção do sujeito de direito sob o pensamento jurídico ocidental está intimamente vinculada à ideia de um indivíduo racional que reflete e reforça estruturas capitalistas e relações de poder. Contudo, esse modelo, baseado em pressupostos eurocêntricos e coloniais, sempre excluiu outras existências, como, por exemplo, os povos de matriz africana, cujas cosmovisões foram silenciadas e demonizadas ao longo da história.  

Partindo de uma perspectiva interseccional e análise da personificação de Exú, Orixá primordial das tradições africanas Yorùbá e, no Brasil, no Candomblé, lê-se Exú, símbolo da ressignificação do sujeito de direito, arquétipo da liberdade, esférico no infinito e o antecessor da criação de um todo, atuando como mediador comunicativo entre dois mundos, o Àiyé (terra) e o Òrun (céu), guardião das encruzilhadas e catalisador do caos que põe tudo em seu devido lugar.

[…] Exu precede toda e qualquer criação. Assim, ele participa e integra tudo o que é criado, da mesma maneira que também está implicado em tudo aquilo que virá a ser destruído e o que ainda está por vir. É ele o princípio dinâmico que cruza todos os acontecimentos e coisas, uma vez que sem ele não há movimento. Exu é compulsório a todos os seres e forças cósmicas. É ele a divindade mais próxima daqueles classificados como humanos, é o dono do nosso corpo e de suas potências, é o princípio comunicativo entre os seres, as divindades e os ancestres. Exu é a substância que fundamenta as existências; é a linguagem como um todo. É o pulsar dos mundos, senhor de todas as possibilidades, uma esfera incontrolável, inapreensível e inacabada (Rufino, 2019, p. 24, 25).

 

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Recebido em: 15/09/2025

Aceito em: 15/11/2025

 

[1] Arauí da Conceição Geraldo. Bacharel em Direito pela Universidade UNINASSAU – AL. Pós-graduado em Ciências Jurídicas com ênfase em Direito Privado pela Faculdade GRAN. Pós-graduando em Direito e Processo Penal pela Faculdade GRAN. Ẹ̀gbọ́n de Yemọjá. Pesquisador das religiões de matriz africana/afro-brasileiras, corpos vulneráveis e seus direitos. E-mail: araui.academico@outlook.com

[2] Jessica Hind Ribeiro. Pós-Doutora em Desigualdades Globais e Justiça Social (FLACSO-UNB). Pós-Doutora em Direito e Novas Tecnologias pela Mediterranea International Centre for Human Rights Research. Doutora e Mestra em Direito das Relações Sociais e Novos Direitos pela Universidade Federal da Bahia. Pós-graduada em Direito Civil pelo Complexo Educacional Damásio. Especialista em Teoria e Práticas Clínicas em atenção psicossocial aos usuários de substâncias psicoativas pela Universidade Federal da Bahia. Professora Colaboradora do Mestrado em Direito da UCSAL (Universidade Católica do Salvador). Professora na graduação dos cursos da Uninassau e UCSAL. Integrante do Grupo de Pesquisa Vida (PPGD – UFBA) e do Grupo de Pesquisa JusBioMed Direito, Bioética e Medicina. Advogada do Escritório de Advocacia Fidelis e Sales, com ênfase em Direitos das Mulheres e Advocacia Familiarista Feminista. Email. jessicahindribeiro@gmail.com. 

Encruzilhada autônoma: Exú e a ressignificação do sujeito de direito

 

RESUMO: O artigo investiga como a figura de Exú, orixá da comunicação, mediação e movimento, pode servir de operador hermenêutico para ressignificar o “sujeito de direito” na contemporaneidade brasileira. Partimos da crítica ao modelo eurocêntrico e colonial que abstratiza o sujeito e invisibiliza corpos historicamente marginalizados, em especial os de religiões de matriz africana, para propor uma leitura situada, plural e relacional da subjetividade jurídica. Com base em revisão bibliográfica interdisciplinar, foram apresentadas as “encruzilhadas” simbólicas que articulam historicidade, ancestralidade e luta, e discutimos seus efeitos práticos: abertura interpretativa às narrativas subalternizadas, reposicionamento de precedentes como pontos de partida e não de clausura, e fortalecimento do autorreconhecimento e da autonomia coletiva. Conclui-se que Exú opera como princípio metodológico de tradução e trânsito, capaz de reorientar a dogmática para uma justiça material que reconhece diferenças e confronta o racismo religioso, sem dissolver a responsabilidade institucional do Direito.

PALAVRAS-CHAVE: Exú. Encruzilhada. Sujeito de direito. Candomblé. Epistemologia afro-brasileira.


Autonomous crossroads: Exú and the resignification of the subject of law

 

ABSTRACT: This article investigates how the figure of Exu (Exú)—the orixá of communication, mediation, and movement—can serve as a hermeneutic operator to re-signify the “legal subject” in contemporary Brazil. We begin with a critique of the Eurocentric, colonial model that abstracts the subject and renders historically marginalized bodies invisible, especially those belonging to Afro-Brazilian religions, in order to propose a situated, plural, and relational reading of juridical subjectivity. Drawing on an interdisciplinary literature review, we present the symbolic “crossroads” that weave together historicity, ancestry, and struggle, and we discuss their practical effects: widening interpretive openness to subaltern narratives, repositioning precedents as points of departure rather than closure, and strengthening self-recognition and collective autonomy. We conclude that Exu operates as a methodological principle of translation and transit, capable of reorienting legal dogmatics toward a material justice that recognizes differences and confronts religious racism, without dissolving the institutional responsibilities of law.

KEYWORDS: Exú. Crossroads. Subject of law. Candomblé. Afro-Brazilian epistemology.


GERALDO, Arauí da Conceição; COSTA, Jessica Hind Ribeiro. Encruzilhada autônoma: Exu e a ressignificação do sujeito de direito. ClimaCom – Exu: arte, epistemologia e método [online], Campinas, ano 12, n. 29., dez. 2025. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/encruzilhada-autonoma/