Cultivando outras relações, outras convivências e outros mundos possíveis: a experiência do Programa de Extensão ConViva! | Aline Campos, Edinelma Alves de Sousa Resplandes, Maria Victória Lima dos Santos e Pedro Lucas Nunes Lopes


Aline Campos[1] 

Edinelma Alves de Sousa Resplandes[2]

Maria Victória Lima dos Santos[3]

Pedro Lucas Nunes Lopes [4]

 

Meu irmão aceitou de ser a árvore daquele passarinho.
No estágio de ser essa árvore, meu irmão aprendeu de sol,
de céu e de lua mais do que na escola.
No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu santo
mais do que os padres lhes ensinavam no internato.
Aprendeu com a natureza o perfume de Deus.
Seu olho no estágio de ser árvore aprendeu melhor
o azul. 
Manoel de Barros (2010)

Semear e germinar nossas esperanças

Ainda que alguns resistam em acreditar e outros neguem veementemente, a crise da modernidade está posta e os problemas socioambientais cada vez mais evidentes. Trata-se, como aponta Solón (2019, p.13), de uma crise sistêmica, cuja “magnitude é tão grande que o que está em jogo não é uma civilização em particular, mas o destino da humanidade e da vida”.

As vozes ancestrais não param de nos alertar: o céu está por cair sobre nossas cabeças! Anciãs e anciões Apinajés – povo indígena com o qual temos convivido e aprendido – contam que nos primórdios do mundo o céu era baixo e as plantas pequenas, foi o crescimento delas que fez o céu se elevar.  Para os Yanomamis são os xamãs, juntamente com os xapiris[5], que trabalham sem descanso para impedir a queda do céu. Segundo esse povo indígena:

No início, o céu ainda era novo e frágil. A floresta era recém-chegada à existência e tudo nela retornava facilmente ao caos. Moravam nela outras gentes, criadas antes de nós, que desapareceram. Era o primeiro tempo, no qual os ancestrais foram pouco a pouco virando animais de caça. E quando o centro do céu finalmente despencou, vários deles foram arremessados para o mundo subterrâneo. Lá se tornaram os aôpatari, ancestrais vorazes de dentes afiados que devoram todos os restos de doença que os xamãs jogam para ele, embaixo da terra. […] As costas desse céu que caiu no primeiro tempo tornaram-se a floresta que vivemos, o chão no qual pisamos. […] Depois, um outro céu desceu e se fixou acima da terra, substituindo o que tinha desabado (Kopenawa; Albert, 2015, p. 195).

Diversos povos indígenas, chamados também de povos da floresta, alertam: agredir a floresta, desrespeitar e descuidar da Natureza é colocar em cheque a permanência do céu. Esse é um grito de socorro. No entanto, não podemos deixar que a tragédia anunciada nos afete com tristeza, desmobilizando nossa potência de agir (Spinoza, 2009) e, consequentemente, nos colocando em posição de aceitação, como se o destino estivesse dado, fosse inevitável. Ao contrário, esse deve ser um grito para nos acordar e nos colocar em movimento, em articulação, em processo de imaginação, invenção e (re)conhecimento de outros mundos possíveis. Daí a importância da esperança, como um imperativo existencial e histórico, necessidade ontológica e elemento imprescindível à luta, tal como defendido por Freire (2011a, p. 126), que afirma que “Sonhar não é apenas um ato político necessário, mas também uma conotação da forma histórico-social de estar sendo mulheres e homens. Faz parte da natureza humana que, dentro da história, se acha em permanente processo de tornar-se”.

(Leia o ensaio completo em PDF)


Recebido em: 15/09/2024

Aceito em: 15/11/2024

[1] Universidade Federal do Norte do Tocantins (UFNT). Email: aline.campos@ufnt.edu.br

[2] Universidade Federal do Norte do Tocantins (UFNT). Email: edinelma.resplandes@ufnt.edu.br

[3] Universidade Federal do Norte do Tocantins (UFNT). Email: maria.victoria@ufnt.edu.br

[4] Universidade Federal do Norte do Tocantins (UFNT). Email: pedro.lopes@ufnt.edu.br

Cultivando outras relações, outras convivências e outros mundos possíveis: a experiência do Programa de Extensão ConViva!

 

RESUMO: Este texto é um relato de experiência sobre o Programa de Extensão ConViva!: outras relações, outras convivências, outros mundos possíveis, que tem como eixos o Paradigma do Bem Viver, a Educação Popular e a Educação Ambiental. Tomando como inspiração o ciclo de desenvolvimento de uma planta, que vai da semente à floresta, analisamos as experiências advindas da construção coletiva de nossas práxis em busca da ruptura com a dicotomia entre seres humanos e natureza e em prol do desenvolvimento da consciência planetária. Nosso objetivo consiste em contar a nossa história sobre o cultivo das sementes que obtivemos de alguns frutos que chegaram até nós e que têm alimentado nossas esperanças e ações por meio do ConViva!, entendendo esse gesto como uma forma de adiar o fim do mundo. Alimentados pelo diálogo com uma realidade concreta, pela integração com a sociedade e ações coletivas, temos nos enraizado, desenvolvido e florescido. Nesse processo, reunimos diversas aprendizagens, fortalecemos nossos vínculos e dispersamos nossas sementes, o que nos possibilita atrelar pertencimento ao solo e desprendimento pelo mundo, enquanto estratégias de enfrentamento à crise ambiental, que se dá por meio da articulação entre ensino, pesquisa e extensão. 

 

PALAVRAS-CHAVE: Bem Viver. Educação Ambiental. Educação Popular. Ensino-pesquisa-extensão.

 


Cultivando otras relaciones, otras convivencias y otros mundos posibles: la experiencia del Programa de Extensión ConViva!

 

RESUMEN: Este texto es un relato de experiencia sobre el Programa de Extensión ConViva!: otras relaciones, otras convivencias, otros mundos posibles, cuyos ejes son: el Paradigma del Buen Vivir, la Educación Popular y la Educación Ambiental. Tomando como inspiración el ciclo de desarrollo de una planta, desde la semilla hasta el bosque, analizamos las experiencias surgidas de la construcción colectiva de nuestra praxis en busca de una ruptura con la dicotomía entre ser humano y naturaleza y a favor del desarrollo de la consciencia planetaria. Nuestro objetivo es contar nuestra historia sobre el cultivo de las semillas que obtuvimos de algunos frutos que nos llegan y alimentan nuestras esperanzas y acciones a través de ConViva!, entendiendo este gesto como una forma de posponer el fin del mundo. Alimentados por el diálogo con una realidad concreta, integración con la sociedad y acciones colectivas, hemos echado raíces, desarrollado y florecido. En este proceso, juntamos diversos aprendizajes, fortalecemos nuestros vínculos y dispersamos nuestras semillas, lo que nos permite vincular la pertenencia a la tierra y el desapego alrededor del mundo, como estrategia para enfrentar la crisis ambiental, que se da a través de la articulación entre la docencia, la investigación y la extensión. 

      

PALABRAS CLAVE: Buen Vivir. Educación Ambiental. Educación Popular. Docencia-investigación-extensión.

 


CAMPOS, Aline; RESPLANDES, Edinelma Alves de Sousa; SANTOS, Maria Victória Lima dos e LOPES, Pedro Lucas Nunes. Cultivando outras relações, outras convivências e outros mundos possíveis: a experiência do Programa de Extensão ConViva! ClimaCom – Desvios do “ambiental” [online],, Campinas, ano 11, n. 27., dez. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/cultivando-outras/