Árvores companheiras | coletivo multiTÃO – disciplina Arte, ciência e tecnologia

Título | Árvores companheiras

Em tempos marcados pelas catástrofes, pelo Antropoceno, pela intrusão de Gaia, ter as árvores como companhias do criar e pensar se mostra um movimento político vital. Árvores nos ensinam que é preciso honrar os encontros com toda e qualquer matéria, seja ela advinda do Sol, do ar, da terra ou das atividades humanas e das ruínas do capitalismo. E honrar a matéria é fazer dela um material que segue vivo por outros “modos de existência” (Souriau, 2017), sejam eles escultóricos, de desenho, fotografia, de escrita, de livro… Honrar a matéria é aprender a colocar o material de pé! Por isso, neste livro, as plantas não são apenas seres interessantes para pensar e criar, as plantas são concebidas como seres que pensam e criam, e o desafio que se coloca a todo instante é o de aprender a escutar seus corpos e relações, ou seja, suas forças de vida. O pensar, com as árvores, se torna literalmente um gesto de fazer corpo com os mundos e aprender a fazer mundos com os corpos, e o comunicar ganha sempre uma perspectiva de “perceber-fazer floresta” (Dias, 2020). A arvorecidade é uma qualidade de uma experimentação não recognitiva, que reclama atenção à diferença em cada mínimo gesto, num constante exercício de “descolonização do pensamento” (Viveiros de Castro, 2015). Um pensar-planta passa por engravidar mundos, por desdobrá-los em um sem fim de potências habitáveis: atmosféricas, humosídicas, climatológicas. Um fazer-árvore no pensamento é sempre um chamado a honrar uma ontologia poliritmica e multirelacional, um convite a saudar e conviver com modos de existir fractais, heterárquicos e aberrantes, com os quais podemos aprender a “arte de ter cuidado” (Stengers, 2015) com a Terra. Isso porque as árvores são seres capazes de ativar em nós um interesse pelas “pessoas coletivas” (Krenak, 2019), gentes feitas de encontros e complexas colaborações criativas e afirmativas com muitos. É para compartilhar estes e muitos outros aprendizados que nos lançamos no desafio de fazer escuta às árvores, como modo de reverenciá-las e de dar atenção às propensões criativas dos materiais no encontro com elas. Este livro foi feito a muitas mãos, com pessoas em diferentes cidades que se reuniram e conectaram pelas telas durante a pandemia em torno das leituras e exercícios propostos na disciplina “Arte, ciência e tecnologia” em 2020, e reúne de modo inventivo as experimentações feitas em parceria com as árvores. Esse gesto de pensar em parceria com as árvores já nos envolveu em outras edições dessa disciplina, em 2019 e 2018, também com artistas e pesquisadores convidados e participantes. Para que este livro fosse produzido foram fundamentais os encontros com o artista Paulo Teles, que nos apresentou seu projeto artístico “Árvore dos desejos”, e a bióloga Alessandra Penha, que participou de dois encontros e nos convidou a fazer um mergulho nas plantas e aprender a pensar com a fisiologia vegetal. E assim renascem, pegam de novo, ipê branco, jurema, seringueira, bacurizeiro, moringa, flamboyant, samaúma, ipê amarelo, palmeira, açaizeiro, figueira, ipê rosa, eucalipto, coqueiro, paineira, sobreiro, salgueiro-chorão, árvore-da-chuva, árvore de mangue, limoeiro, figueira benjamim, angico e jacarandá. Assim renascemos, pegamos de novo, nós.

do posfácio de Susana Dias

 

Bibliografia

DIAS, Susana. Perceber-fazer floresta: da aventura de entrar em comunicação com um mundo todo vivo. ClimaCom – Florestas [Online], Campinas, ano 7, n. 17, Jun. 2020. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/susana-dias-florestas/

KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

SOURIAU, Étienne. Los diferentes modos de existencia; Del modo de existencia de la obra por hacer/ Prefacio de Bruno Latour y Isabelle Stengers. 1a. ed. volumen combinado. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Cactus, 2017.

STENGERS, Isabelle. No tempo das catástrofes – resistir à barbárie que se aproxima. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Cosac Naif, 2015. 160p.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Metafísicas canibais: elementos para uma antropologia pós-estrutural. São Paulo: Cosac Naif; N-1 edições, 2015. pp. 171-213.

 


Ficha técnica do livro

Organização e concepção | Ana Paula Valle Pereira,  Bruno Novaes Poli, Jorge Luis Massarolo, Maria Madalena Felinto Pinho Ramos,  Mariana Vilela Leitão, Maurício Simionato, Néliane Catarina Simoni, Pâmella De Caprio Villanova e Susana Oliveira Dias

Diagramação | Ana Paula Valle Pereira,  Bruno Novaes Poli, Pâmella De Caprio Villanova e Susana Oliveira Dias

Assistência de produção | Jorge Luis Massarolo, Maria Madalena Felinto Pinho Ramos,  Mariana Vilela Leitão, Maurício Simionato, Néliane Catarina Simoni

Revisão | Maurício Simionato e Néliane Catarina Simoni

Capa | Maurício Simionato e Susana Dias

Autores (textos e imagens) | Ana Angélica Teixeira Ferreira da Costa, Ana Helena Grimaldi Semeghini, Ana Paula Valle Pereira, Ana Oliveira Rovati, Antônio Inácio dos Santos de Paula, Breno Filo Creão de Sousa Garcia, Bruno Novaes Poli, Celso Cardoso, Cláudio de Melo Filho, Déa Trancoso, Estefânia Ana Gaviña, Fernanda de Souza Oliveira, Jane Maria Santos de Mesquita, Jhonatas Henrique Simião, Jorge Luiz Massarolo, Maria Madalena Felinto Pinho Ramos, Malena Beatriz Stariolo, Mariana Vilela Leitão, Maurício Simionato, Néliane Catarina Simoni, Pâmella De Caprio Villanova, Susana Oliveira Dias, Valéria Menezes Scornaienchi e Victor Hugo da Silva Iwakami.

Coletivo e grupo de Pesquisa | multiTÃO: prolifer-artes sub-vertendo ciências, educações e comunicações (CNPq)

Projetos | Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC) – (Chamada MCTI/CNPq/Capes/FAPs nº 16/2014/Processo Fapesp: 2014/50848-9); Revista ClimaCom: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/

 


Este livro foi criado na disciplina “Arte, ciência e tecnologia” oferecida no âmbito do Mestrado em Divulgação Científica e Cultural do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) e Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

JC 012 – Arte, ciência e tecnologia – Labjor-IEL-Unicamp 2020

60 horas (terças às 9)

Susana Dias

Paulo Teles

Alianças com estrelas, árvores e rios: novos modos de existir diante das catástrofes

A disciplina se configura como um laboratório-ateliê dedicado ao estudo, pesquisa e envolvimento teórico-prático com artes, ciências, tecnologias. Adotando uma ênfase muito importante hoje dos estudos de ciência e tecnologia, nos estudos multiespécies, e nas chamadas linhas de pensamento pós-humanistas, experimentaremos a criação de composições sensíveis (com imagens, palavras e sons, corpos etc.) que buscam se afetar pelos não-humanos. Neste semestre a disciplina se propõe a pensar em parceria com estrelas, árvores e rios para pensar e experimentar a divulgação científica e cultural enquanto criação de novos modos de existir, pensar e sentir e não apenas como reprodução de modos já dados, prontos e acabados. Para tanto, investiremos em articulações entre os campos das artes, literatura, antropologia, astronomia, biologia e filosofia e entraremos em contato com práticas de artistas e cientistas a fim de extrair delas materiais, ferramentas, procedimentos e possibilidades de experimentação de uma comunicação audiovisual em tom menor. Uma comunicação que busque suspender as oposições entre natureza e cultura, sujeito e objeto, teoria e prática, matéria e espírito, humanos e não-humanos, e constitua um novo campo problemático para os encontros entre artes e ciências que levem a sério uma crítica ao antropocentrismo. Como parte da disciplina, investiremos na criação e problematização de um arquivo audiovisual e em criações individuais e coletivas com esse arquivo. Faremos pequenos exercícios de tornarmos dignos de entramos relações com estrelas, árvores e rios a partir dos aprendizados. A Revista ClimaCom (Labjor-Unicamp) será o espaço principal de exposição dos materiais produzidos na disciplina, mas a ideia é que os materiais circulem também em outros espaços-tempos em que os participantes estejam envolvidos (suas casas, salas de aula online etc.). 

 

 

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PEREIRA, Ana Paula, POLI, Bruno Novaes, MASSAROLO, Jorge Luis, RAMOS, Maria Madalena Felinto Pinho, VILELA, Mariana Vilela, SIMIONATO, Maurício, SIMONI, Néliane Catarina, VILLANOVA, Pâmella De Caprio e DIAS, Susana Oliveira. Árvores companheiras. ClimaComEpidemiologias [online],  Campinas,  ano 7, n. 19. dezembro. 2020. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/arvores-companheiras/

 

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SEÇÃO ARTE | Ano 7, n. 19, 2020

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