Abrir um buraco no presente: diálogos entre Exu e Rancière | Ana Clara da Silva
Ana Clara da Silva[1]
Cena:
O ano era 2019, janeiro, e eu comecei a dar aulas de canto em um conservatório de artes em Campinas. As aulas eram para os cursos livre e técnico. O conservatório é um espaço frequentado majoritariamente pela classe média alta campineira, com mensalidades bem acima do mercado. Dito isso, é presumível a etnia predominante das pessoas e suas famílias que frequentavam esse espaço. Trata-se de um espaço tradicional da arte em Campinas, onde, por exemplo, mães e pais – que estudaram lá na adolescência – retornam anos depois com seus filhos para que eles possam estudar também, dança, música e/ou teatro.
Eu estava muito contente, pois era recém-formada e já estaria em um lugar de prestígio. Assim que entrei, um professor conhecido tinha passado em uma seletiva para ficar uma temporada cantando na Europa, cerca de três ou quatro meses. Prontamente, a direção do conservatório me ofereceu a vaga dele como professora substituta. A matéria que ele lecionava no curso técnico era “Música para Ator”. Fiquei animada, pois lembrei que fiz essa mesma disciplina no Departamento de Artes Corporais, durante a graduação na Unicamp e eu gostava bastante. Porém, também senti receio e insegurança: uma recém-formada dando aulas num curso técnico, com todas as exigências do MEC, entre outras. Entretanto, assumi todas as aulas individuais dele, as aulas para os atores, além das minhas próprias aulas.
(Leia o ensaio completo em PDF)
Recebido em: 15/09/2025
Aceito em: 15/10/2025
[1] Ana Clara da Silva – Doutoranda em Artes Cênicas pelo Programa de Pós-graduação da Escola de Arte e Comunicação da Universidade de São Paulo (PPGAC/ECA/USP). Email: anaclaraferraz@usp.br
Abrir um buraco no presente: diálogos entre Exu e Rancière
RESUMO: Este ensaio propõe um diálogo entre a episteme de Exu, Orixá da comunicação, do tempo espiralar e das encruzilhadas, e o conceito de “efeito de suspensão” de Jacques Rancière. Exu é tomado como operador simbólico, ético e epistêmico, capaz de desestabilizar e reorganizar sentidos, enquanto Rancière oferece uma chave teórica para refletir sobre rupturas na ordem estabelecida por meio das artes. O encontro entre esses campos cria uma dobra metodológica que permite repensar filosofia, estética e pedagogia a partir de epistemologias plurais, constituindo uma estratégia crítica de descolonização do pensamento e de escuta de saberes silenciados. O ensaio investiga como a suspensão, compreendida como estado de abertura, trânsito e ruptura com o contínuo, pode ser mobilizada na análise de performances e práticas pedagógicas vinculadas a corpos dissidentes. A metodologia combina pesquisa bibliográfica, autoetnografia, entrevistas em terreiros e vivência em sala de aula. Exu é tomado como metodologia que opera por suspensão, ambiguidade e trânsito entre domínios. A partir de uma cena vivenciada em classe, o texto explora a arte, na perspectiva de Rancière, como ferramenta antirracista, anticapitalista e de resistência, mostrando como Exu, Rancière e as práticas artísticas emergem como alternativas diante das feridas coloniais e da lógica neoliberal.
PALAVRAS-CHAVE: Exu. Rancière. Artes. Neoliberalismo. Escola
Abrir un agujero en el presente: diálogos entre Exu y Rancière
RESUMEN: Este ensayo propone un diálogo entre la episteme de Exu, Orixá de la comunicación, del tiempo espiral y de las encrucijadas, y el concepto de “efecto de suspensión” de Jacques Rancière. Exu se toma como operador simbólico, ético y epistémico, capaz de desestabilizar y reorganizar significados, mientras que Rancière ofrece una clave teórica para reflexionar sobre rupturas en el orden establecido a través de las artes. El encuentro entre estos campos crea un doblez metodológico que permite repensar la filosofía, la estética y la pedagogía desde epistemologías plurales, constituyendo una estrategia crítica de descolonización del pensamiento y de escucha de saberes silenciados. El ensayo investiga cómo la suspensión, comprendida como un estado de apertura, tránsito y ruptura con el continuo, puede ser movilizada en el análisis de performances y prácticas pedagógicas vinculadas a cuerpos disidentes. La metodología combina investigación bibliográfica, autoetnografía, entrevistas en terreiros y experiencias en el aula. Exu se toma como metodología que opera mediante suspensión, ambigüedad y tránsito entre dominios. A partir de una escena vivida en clase, el texto explora el arte, desde la perspectiva de Rancière, como herramienta antirracista, anticapitalista y de resistencia, mostrando cómo Exu, Rancière y las prácticas artísticas emergen como alternativas ante las heridas coloniales y la lógica neoliberal.
PALABRAS CLAVE:
Exu. Rancière. Artes. Neoliberalismo. Escuela.
SILVA, Ana Clara da. Abrir um buraco no presente: diálogos entre Exu e Rancière. ClimaCom – Exu: arte, epistemologia e método [online], Campinas, ano 12, n. 29., dez. 2025. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/abrir-um-buraco/
