Palavras desesterradas


 

 

Elenise Cristina Pires de Andrade [1]

Oieeee Sheyla,

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Em dossiê carta-clismático pensei ser interessante continuar a conversa com você junto com os prints aí ao lado, que aconteceu logo após minha imersão na poeira-pó-Penha-Maria em experimentações pelas palavras, pontuações, expressões sem pressa.

Comecei várias vezes seu livro, porque algo me incomodava: era pensamento? Era fato ocorrido? Onde estávamos? E, assim, fui per-correndo e atraversando as mulheres, suas dores, seus silêncios, Tonhos que perturbam…
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Não sei se já lhe contei que li seu livro em condições muito particulares – fiz uma operação para retirada do útero – e precisei ser abduzida pela imobilidade…Li Mia Couto (2015), li Gonçalo Tavares (2014)- homens escrevendo de/nas mulheres… não brasileiros escrevendo em português. Daí você e suas Marias todas me arrombam. Eu em slow motion, olhando os detalhes e sentido as poeiras de todas essas mulheres, as moçambicanas, as portuguesas, as brasileiras e eu e você e quem eu não sei…

Há muito tempo não tinha essa fratura no passo, literalmente, porque precisava andar muito devagar. E os romances, a literatura, ouvir você no vídeo… [2] deitar na cama e ficar lendo, parece que em um tempo infinito das palavras de vocês três. Fratura nessas mulheres corpos terra/poeira/silêncio… silêncio potente que nos grita desde dentro.

 

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Vilaboinha, Vila Marta. Onde ficam? Por onde espiam as Marias d(n)esses lugares? Mulheres forças que nos provocam a todos os instantes as Penhas que nos habitam, nos invadem. “Toda vez que encontra a neta mais nova olhando longe Penha não sabe o que faz. Já cansou de mandar a diaba não dar nas vistas. Penha não sabe o que faz com a menina: olha junto, olhe junto e enxerga até o que não vê.” (p. 138)

Desesterrar… desenterrar as vivências e experiências de ser mulher nos dias de hoje, ontem. Tensões por Vilaboinhas… boas vilas, boas vidas que nos arrancam dos clichês com as experimentações de Sheyla, suas escritas, ex criptas que nos convidam ao deleite da leitura. São fortes cenas, pensamentos que pulam e voltam ao pó. Será? Maria ninguém que é Maria também… a terra rouba e não quer devolver. Nossos pensamentos roubam os latidos dos cachorros de Tonho… por que, Tonho? Por que atonhar as Marias? Por que os homens atormentam as mulheres? Não sei. Só sei que sou mulher e não admito tormentas que não escolho… Assim como Sheyla, saí do armário e assumi as Marias em pó que há em mim. São tantas e todas. São nenhuma e uma. Barriga que consome, vida que brota, assim como a terra… desesterrar…

 

 

 

Recebido em: 30/01/2017

Aceito em: 15/02/2017


 

 

[1]Professora titular do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana. Professora do Mestrado em Educação do mesmo departamento. Email: elenise@uefs.br

 

 

 

Palavras desesterradas

 

RESUMO: A partir de sensações e mensagens trocadas via messenger, ao final de 2016, com Sheyla Smanioto, impressões, mergulhos e deslizes pelo seu primeiro romance “Desesterro”.