XAPIRIMUU
Título: XAPIRIMUU
Resumo: Elas, as nuvens, como nosso campo crítico e problemático nos obrigam a ganhar uma leveza que favoreça o encontro de heterogêneos. Encontros que ao mesmo tempo povoam e abrem um arquivo, ou o conjunto de entradas por onde podemos ganhar uma maior intimidade com elas, como sua força de transmutação.
Há algo mais importante que a tradição do cinema de animação, que saber que a impressão de realidade acontece a 24 quadros por segundos, que… Há algo mais importante: a vida. Esse algo mais importante nos dispõe em aprendizados corpo a corpo com a matéria. Sem saber, abrindo o que há de humano em nós, começar a criar um pequeno cenário, começar a dobrar os arames e sentir que não são só fios de metal, mas também fios de vida. Linhas que traçam cordas suspensas entre as nuvens. Aprendizado de infância, onde não há relações dadas, nem metáforas, mas há literalidades de encontros onde a matéria é modulada. Aprender a estar, estando já, ainda não estando, dentro de uma nuvem entre linhas e arames. Asignificante a matéria vai agindo, vai abrindo trajetórias novas, vai se animando, ganhando alma, ganhando espírito.
O pequeno bloco audiovisual carregado mais de animas de metal e linha do que de animação ressoa e se conecta como a potência de pensamento do povo Yanomami. A matéria em estado generativo aberto e contínuo diverge e se conecta com a noção yanomami de Xapirimuu, em português, agir em espírito. Começamos a habitar as nuvens dando ânima a modos de existência até então silenciados, nos deixamos possuir por eles, pela voz do arame, da linha, que pedem ressoar mais. Uma nova matriz perceptiva começa a emergir entre linhas, teias de aranha e arames, entre cumulus e águas vivas, entre caracóis, sombras e capins. Toda uma nova ecologia ganhando consistência na matéria-cinema, uma heterogênese em esvoaçar constante.
Susana Dias & Sebastian Wiedemann
XAPIRIMUU
[agir em espírito]
[to act as a spirit]
6min28 | HD | 2016
Sonhar a terra entre nuvens
para que o céu não caia.
Dream the earth among clouds
so that the sky does not fall.
Composição audiovisual / Audiovisual composition:
Sebastian Wiedemann
Ideia, Conceito e Imagem / Idea, Concept and Image:
Susana Dias & Sebastian Wiedemann
Música / Music:
Terry Riley – Poppy Nogood
Este filme faz parte do projeto “Arquivo Nuvens” concebido
pelo Orssarara Ateliê e o Grupo multiTÃO – Labjor – Unicamp.
This film is part of the project “Cloud Archive” conceived
by Orssarara Atelier and the multiTÃO Group – Labjor – Unicamp.
Orssarara Collective
CC BY-NC-SA
2016
A animação que integra este vídeo foi desenvolvida na oficina de animação ministrada por Ricarda Canozo no dia 20/10/2016 no Labjor-Unicamp como parte das ações do projeto “Arquivo Nuvens”.
Nesta nova série de mesas de trabalho da ClimaCom – pensadas na relação com o Dossiê “Incerteza” e iniciativa do grupo multiTÃO e Orssarara Ateliê – propomos encontros com as nuvens por senti-las e pensá-las como intercessores fundamentais diante das mudanças climáticas. O medo que se instaura frequentemente diante de sua aparição tempestuosa (inundações) ou de seu sumiço aterrador (secas), nos colocam diante da questão política urgente de estarmos preparados para o que vem. E se a resposta surge rapidamente – “É preciso juntar forças para resistir ao que vem” – talvez seja preciso enfrentar a desaceleração gerada por perguntas que retornam em ondulações insistentes: “como?”, “o que pode vir a ser juntar forças?”, “o que vem?”. Nesta proposta concebemos as nuvens como forças que, como o sol, uma montanha, os musgos, os caranguejos e os corais, não podem ser excluídas de nossas buscas por inventar novos modos de “juntar forças”, de “resistir” e de estar aberto ao “que vem”. Criar alianças do que vem de outros reinos, de um reino diverso, e investir em campos de atração entre ciências, artes e filosofias, que abrem um entre-reinos. Não sabemos o que pode uma nuvem e, nesse sentido, é que nos lançamos na criação de uma coleção de existências particulares delas. “Arquivo Nuvens” é feito de taxonomias flutuantes e amostragens leves, recolhidas em nossos movimentos de segui-las, tanto nos céus, quanto nos livros, de acompanhar seus processos de des-aparição nas notícias, nos laboratórios, nos congressos científicos, nos filmes, exposições etc. Um arquivo generativo em morfogênese constante, cuja gravidez dá lugar a novas linhas de força gravitacional, e nos coloca a pergunta: O que é gravitar sem centro? Talvez seja isso o que as nuvens possam nos ensinar com sua gravidez pluri-vital e pluri-dimensional. Uma nuvem pode estar composta por sensações como nas instalações “Lágrimas de São Pedro” de Vinicius S.A. <https://www.flickr.com/photos/viniciussa/> e nos projetos “Cloud Cities” e “Cloud Cities/Flying Garden” de Tomás Saraceno <http://tomassaraceno.com/projects/cloud-cities-flying-garden/>. Uma nuvem pode ser a invenção de uma nova percepção, uma flutuante, gasosa e leve que desconhece coordenadas ou ancoragens, como no filme “La region centrale” de Michael Snow. Uma nuvem também pode estar composta por dados e modelos matemáticos e nos colocar a pergunta pela mineração, pelo cálculo e controle. Ou até mesmo estar composta por entidades infinitamente minúsculas e sutis e nos lançar ao desafio de fazer delas uma força de um futuro incalculável, que pode ganhar uma expressão precisa tanto estatisticamente, como num poema ou ensaio filosófico. Uma nuvem pode se formar e participar de ciclos e sistemas a partir de complexas teorias de povos indígenas e dos cientistas que se dedicam a sua microfísica. Queremos gerar intercessões entre essas nuvens e investir num arquivo vivo, que sai da caixa, da gaveta, e que se lança em performances nas ruas, se transmuta em ensaios fotográficos, se verte em animação, se prolifera e condensa em encontros com convidados das mais diversas áreas. Um arquivo como plano de errâncias e heterogêneses, que se abre furioso como a caixa de Pandora, desatando as forças que fazem do ser-nuvem, uma vibração impessoal, um acontecimento nutrido pelos mais diversos movimentos de concrescência e preensão ou de devir e transição, onde tudo se torna causa eficiente para atingir uma potencialidade real.
Concepção, organização e coordenação “Arquivo Nuvens”
Susana Dias e Sebastian Wiedemann
Grupo multiTÃO e Orssarara Ateliê
Projetos: Mudanças climáticas em experimentos interativos: comunicação e cultura científica (CNPq No. 458257/2013-3); Sub-projeto “Sub-rede Divulgação científica” da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (convênio FINEP/ Rede CLIMA 01.13.0353-00).