Enquanto o mundo colapsa, eu continuo tomando iogurte: um ensaio sobre comunicação e letargia frente às crises climáticas e humanitárias | Aleteia Salmazo
Aleteia Salmazo[1]
“O fim do mundo talvez seja uma breve interrupção de um estado de prazer extasiante que a gente não quer perder”
(Krenak, 2019, p. 60)
Informação demais, mudança que é bom, nada
Quem nunca se deparou com uma notícia sobre crise climática ou humanitária na vida? Não consigo imaginar um ser vivente que não tenha percebido algum alerta, seja pela falta de água ou pelas enchentes, pelas guerras ou epidemias, pelos calores e frios extremos, geleiras derretendo, incêndios florestais, secas prolongadas, desaparecimento de espécies, ou mesmo pelo aumento das doenças respiratórias e da instabilidade geopolítica.
Todas as evidências das crises estão, muito ou pouco, diante dos olhos de todos os que têm vida, humanos ou não. A Terra também vê. E não apenas vê, mas sente, como já dizia o xamã yanomami Davi Kopenawa, ao descrever as imagens vivas da floresta, que sonham e se relacionam (Kopenawa; Albert, 2010). Nesse sentido, é possível afirmar que há uma co-visão: os olhos humanos e os olhos da Terra estão assistindo ao colapso. Enquanto Ailton Krenak denuncia a nossa ruptura com a sensibilidade do planeta (Krenak, 2019), Mahatma Gandhi já advertia que a Terra entrega o suficiente para atender às necessidades de todos, mas jamais será capaz de saciar a ganância de alguns (Gandhi, 2008).
Recebido em: 15/02/2025
Aceito em: 15/10/2025
[1] Mestranda em Comunicação Social no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Metodista de São Paulo. Email: aleteia.artigos@gmail.com.
Enquanto o mundo colapsa, eu continuo tomando iogurte: um ensaio sobre comunicação e letargia frente às crises climáticas e humanitárias
RESUMO: Este ensaio nasce de uma inquietação pessoal: por que sabemos tanto sobre o iminente colapso do planeta e mesmo assim mudamos tão pouco? A partir de um desabafo íntimo e crítico sobre os limites do saber racional, propõe-se uma travessia filosófica e epistemológica pela noção de “compreensão” como gesto acolhedor, inspirada nos caminhos abertos por Dimas Künsch. Em diálogo com os símbolos míticos, o pensamento compreensivo e a crítica ao Signo da Explicação, o ensaio explora a escrita como forma de escuta, resistência e cuidado. Montaigne, Flusser e Starobinski são convocados como companheiros de caminhada, reafirmando a experiência como saber comunicante e o ensaio como modo legítimo de pensar: encarnado, errante, aberto à dúvida. Pensar junto, neste contexto, não é buscar respostas, mas sustentar frestas onde o conhecimento se torna vínculo e o símbolo, travessia.
PALAVRAS-CHAVE: Comunicação. Compreensão. Letargia. Experiência. Símbolo.
While the world collapses, I keep eating yogurt: an essay on communication and lethargy in the face of climate and humanitarian crises
ABSTRACT OU RESUMEN: This essay emerges from a personal unease: why do we know so much about the planet’s imminent collapse and yet change so little? Through an intimate and critical reflection on the limits of rational knowledge, it proposes a philosophical and epistemological journey into the notion of “comprehension” as a welcoming gesture, inspired by the pathways opened by Dimas Künsch. In dialogue with mythical symbols, comprehensive thought, and the critique of the Sign of Explanation, the essay explores writing as a form of listening, resistance, and care. Montaigne, Flusser, and Starobinski are summoned as companions along the way, reaffirming experience as communicative knowledge and the essay as a legitimate mode of thinking: embodied, errant, and open to doubt. Thinking together, in this context, is not about seeking answers, but about sustaining slivers where meaning flickers through, where knowledge becomes connection and the symbol, a passage.
KEYWORDS OU PALABRAS CLAVE: Communication. Comprehension. Lethargy. Experience. Symbol.
SALMAZO, Aleteia. Enquanto o mundo colapsa, eu continuo tomando iogurte: um ensaio sobre comunicação e letargia frente às crises climáticas e humanitárias. ClimaCom – Exu: arte, epistemologia e método [Online], Campinas, ano 12, n. 29., dez. 2025. Available from: http://climacom.mudancasclimaticas.net.br/enquanto-o-mundo-colapsa/
