Pedagogia da teia: arte e educação como emaranhado afetivo | Daniela Cassinelli e Isabel Carneiro
Daniela Cassinelli [1]
Isabel Carneiro[2]
Vivemos em uma época de incontestáveis mudanças e desafios. Não à toa o irreversível impacto da atividade humana no planeta, pelo menos desde a Revolução Industrial, levou cientistas a conceber um nome para caracterizar uma nova era geológica, a qual estaríamos perigosamente adentrando: o Antropoceno [3]. No entanto, será que eleger o antropos, isto é, o humano, como o centro desta nova era, aquele que gerou o problema e que deve agora “salvar” o planeta, não é apenas reforçar o problema?
A cientista e professora Robin Kimmerer (2021, s/p) aponta: “É claro que é inegável que a espécie humana causou grandes perturbações — na verdade, de proporções geológicas. Mas declarar a Era do Antropoceno cheira à terrível arrogância que nos colocou nessa situação”. É preciso, pois, pensar quais palavras e narrativas estamos nos valendo para contar essa história. Como reflete Donna Haraway (2016a, p.140): “O que importa é que narrativas contam narrativas, e que conceitos pensam conceitos”.
Nesse sentido, Haraway propõe um termo alternativo para pensar o tempo que estamos vivendo e sua complexidade: o Chthuluceno, nome inspirado na aranha Pimoa Cthulhu e sua miríade de tentáculos. Ela diz:
Ao contrário dos dramas dominantes do discurso do Antropoceno (…), os seres humanos não são os únicos atores importantes no Chthuluceno, com todos os outros seres capazes de simplesmente reagir. A ordem é retramada: os seres humanos são com e da Terra, e os poderes bióticos e abióticos desta Terra são a história principal. (Haraway, 2016b, p.55, tradução livre)
(Leia o ensaio completo em PDF)
Recebido em: 15/09/2024
Aceito em: 15/11/2024
[1] Graduada em Artes Visuais (bacharel/licenciatura) na UERJ. Professora da rede pública e privada de educação básica fluminense. Email: danielabcassinelli@gmail.com
[2] Doutora em Artes pelo PPGAV-EBA-UFRJ. Professora adjunta Instituto de Artes da UERJ. Professora da linha arte, sujeito, cidade do Programa de pós-graduação em Artes da UERJ. Email: bebelcarneirogm@gmail.com
[3] Termo cunhado pelo biólogo Paul Crutzen e pelo químico Eugene Stoermer em texto publicado no ano 2000 para a revista Global Change Newsletter, v. 41.
Pedagogia da teia: arte e educação como emaranhado afetivo
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo questionar as narrativas antropocêntricas, assim como o próprio termo Antropoceno, em direção a proposições que considerem a trama da vida multiespécie. A partir disso, apresentamos a proposição artístico-pedagógica TE/IA – Tramas Envolventes/Insurgências Aracnianas, que convoca agentes humanos e mais-que-humanos a cocriar uma teia em torno de algumas árvores, situadas em diferentes territórios, materializando um campo vibrátil (Rolnik, 1989). A proposição em questão nos faz compreender arte e educação como instâncias inseparáveis, enquanto práticas de produção de experiências comunais. Nesse sentido, artistas e professores passam a assumir a postura de mediadores. Inspirada nas aranhas e suas incríveis teias, propõe-se, em seguida, uma pedagogia da teia, ou seja, uma pedagogia mais-que-humana que reverencie as relações de reciprocidade vital com os seres com quem estamos emaranhados..
PALAVRAS-CHAVE: Teia. Pedagogia. Arte. Proposição artístico-pedagógica.
Pedagogy of the web: art/education as affectionate entanglement
ABSTRACT: This article aims to question anthropocentric narratives, as well as the term Anthropocene itself, towards propositions that consider the web of multispecies life. Based on this, we present the artistic-pedagogical proposition TE/IA – Tramas Envolventes/Insurgências Aracnianas, which calls on human and more-than-human agents to co-create a web around trees, located in different territories, materializing a vibrating field (Rolnik, 1989). The proposition in question makes us understand art and education as inseparable instances, as practices of production of communal experiences. In this sense, artists and teachers begin to assume the role of mediators. Inspired by spiders and their incredible webs, we then propose a pedagogy of the web, that is, a more-than-human pedagogy that reveres the relationships of vital reciprocity with the beings with whom we are entangled.
KEYWORDS: Spider-web. Pedagogy. Art. Artistic-pedagogical proposition.
CASSINELLI, Daniela; CARNEIRO, Isabel. Pedagogia da teia: arte e educação como emaranhado afetivo. ClimaCom – Desvios do “ambiental” [online], Campinas, ano 11, n. 27., dez. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/pedagogia-da-teia/