A carne de Gaia – um dispositivo vivo | Béa Meira, Rayane Kaingang, Larissa Ye’pa, Claudia Baré
Título | A carne de Gaia – um dispositivo vivo
Inauguramos a exposição A carne de Gaia, no Pavão Cultural, em Campinas, no dia 4 de maio alarmadas com as notícias que chegavam das chuvas torrenciais e contínuas que causaram inundações sem precedentes em Porto Alegre. Três meses depois, dia 31 de agosto, abrimos a exposição na Pinacoteca Fórum das Artes, em Botucatu, na primeira semana dos incêndios criminosos, que ainda consomem florestas, terras indígenas, parques, o pantanal e até as monoculturas de cana de açúcar, em todo o país.
Nos últimos anos, preparando a exposição A carne de Gaia, venho pesquisando dados científicos, desenhando mapas, concebendo imagens, escolhendo símbolos, propondo relações, com o intuito de afetar as instituições e o público para o iminente colapso que a mudança do regime climático produzirá em nossa sociedade.
Como ativar um conjunto de textos, imagens e objetos dispostos no espaço silencioso de um museu? Como engajar as pessoas entretidas em suas vidas privadas, no urgente posicionamento público?
A carne de Gaia, com sete núcleos de interesse – Vivência e conceito, O habitar colonial da Terra, A biosfera, Desmatamento da floresta, Potências controversas de agir, Intrusão de Gaia e Perspectivas indígenas – é um projeto que procura também ser afetado pelo público e pelo território, tornando-se uma plataforma de encontros e produções em processo.
Nesses quatro meses, de modo programático e espontâneo, variados encontros permitiram que o público, bastante diverso, fosse mobilizado, trazendo novas experiências para o projeto. Foram realizadas oficinas, tais como a de carimbos e estêncil e a de pigmentos naturais e tecidos concebidas pelos estudantes da disciplina Atividades Artísticas e Culturais, ministrada pela professora Selma Machado em atividade de extensão da Unicamp. Recebemos os estudantes de licenciatura do curso ministrado pelo professor Wesceslao Oliveira Jr. da Faculdade de Educação da Unicamp para uma conversa profícua com as artistas e a curadora sobre futuros possíveis. Oferecemos uma oficina de confecção de adornos indígenas com as artistas Claudia Baré e Lalá Yepá e uma oficina de bordado coletivo, na qual trabalhamos com o público novas tapeçarias que agora compõem o conjunto de obras apresentadas em Botucatu.
Nos meses de convivência em Campinas, fizemos uma visita à Mata de Santa Genebra e testemunhamos o confinamento de centenas de espécies animais e botânicas, em apenas 2,5 km da Unidade de Conservação. A partir desta experiência realizei a tapeçaria “Campo de refugiados políticos” que integra agora o núcleo Desmatamento da Floresta, na exposição.
Da mesma forma, no evento de inauguração em Botucatu, realizamos a performance Conversa com as mãos ocupadas, convidando o público a trabalhar com sementes de açaí e carimbos. Em seguida fizemos uma visita ao MAGMA – Museu Aberto de Geociência Mineralogia e Astronomia, guiada pela curadora Berenice Pereira Balsabore, que nos apresentou o importante papel da constituição geológica da Cuesta de Botucatu na absorção de água para o aquífero Guarani. A partir desta visita e do contato com as Metas do Programa Aquífero Guarani, comecei uma nova tapeçaria que deverá se integrar à exposição na próxima montagem.
A exposição A carne de Gaia, aprende com a Terra viva, a ser também um dispositivo vivo, dinâmico, em diálogo com a arte e a ciência, com público e instituições, e promovendo o encontro das artistas com o contexto ambiental dos diversos territórios.
| FICHA TÉCNICA |
Autora| Beá Meira
Curadoria | Susana Oliveira Dias
Artistas convidadas | Rayane Barbosa Kaingang, Larissa Ye’pa e Claudia Baré
Legendas das fotos (Edu Abad) |
1.Visão geral da exposição A carne de gaia na Pinacoteca Fórum das Artes de Botucatu.
2. Mulheres Gaia e as perspectivas indígenas.
3. Convidar o público a compor paisagens do antropoceno, com os carimbos.
4. Campo de refugiados políticos. 2,5km2 de sombra, 989 espécies conterrâneas e mais 700 espécies de borboletas. Mata Santa Genebra, Unidade de Conservação com fragmentos de mata atlântica dentro da malha urbana de Campinas. Tapeçaria.
5. Mina do sossego. Exploração de cobre em Canaã dos Carajás. A mineração desenha sua própria geografia. Tapeçaria.
6. O império das coisas mortas. Reorganização explosiva dos combustíveis e minerais fósseis. As nuvens fazem a atmosfera esquecer. Acrílica sobre compensado.
7. Floresta, rejeito e cogumelo. Série Léxico para o fim do holoceno. Pintura sobre impressão de matrizes feitas com ponta seca em polímero.
8. Chuva sobre exploração compulsiva. Carimbo sobre papel.
9. Vitrine com os Cadernos da Beá e algumas peças de cerâmica.
Pará, setembro de 2024.
MEIRA, Béa; KAINGANG, Rayane Barbosa; YE’PA, Larissa; MARTINS, Ana Claudia. A carne de Gaia – um dispositivo vivo. ClimaCom – Desvios do “ambiental”. [online], Campinas, ano 11, n. 27 dez. 2024. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/a_carne_de_gaia_dispositivo_vivo/
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