Por | Gláucia Pérez
Editora | Susana Oliveira Dias
A revista The Guardian, no dia 28 de fevereiro de 2022, trouxe que cientistas do grupo de trabalho II (Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade), do IPCC, consideraram que o sexto relatório de avaliação (AR6) enunciou ser o “alerta mais sombrio até então publicado sobre as mudanças climáticas, e que as evidências científicas demonstram ser uma ameaça ao bem-estar humano e à saúde do planeta”.
De acordo com o pesquisador José Marengo, coordenador geral de pesquisa e desenvolvimento no Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais – CEMADEN, a informação da revista está correta, apesar do “tom de catástrofe”, e a mídia ao relatar os relatórios do IPCC coloca os resultados como deterministas em relação a emergência climática. Mas considera que os relatórios e sumários do IPCC informam possibilidades e cenários que podem vir a acontecer se nada for feito para mitigar os impactos das mudanças climáticas.
O relatório do grupo de trabalho II (Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC, no dia 27 de fevereiro de 2022, finalizou a segunda parte do sexto relatório de avaliação (AR6). Segundo o pesquisador Renzo Taddei, integrante do INCT mudanças climáticas fase 2, subcomponente comunicação de risco, divulgação do conhecimento e educação para a sustentabilidade, uma questão importante que o sexto relatório trouxe foi a “necessidade de transformação social”.
O pesquisador Marengo nos diz ainda que os relatórios do Painel Intergovernamental têm o intuito de informar e alertar a sociedade e os tomadores de decisão de políticas públicas. E que as mudanças climáticas são reais e estão presentes no nosso cotidiano, e que no momento atual são necessárias ações urgentes de adaptação e implementação a curto e longo prazo para reverter a emergência climática. “Não significa que o IPCC anuncia o fim do mundo”, diz Marengo.
Para Taddei, o relatório destacou a importância da conscientização da desigualdade na distribuição de renda do planeta; do uso adequado das políticas públicas para resolver a questão ambiental; e de como a informação chega à sociedade. Complementou dizendo que o relatório levanta a questão de que “a governança deve ser participativa, descentralizada e flexível”.
Renzo ressaltou ainda que os resultados dos relatórios do IPCC, para que cheguem a públicos mais amplos, devem ter a participação de profissionais competentes e com eficácia na divulgação científica com o propósito de “transformar as mensagens em histórias e narrativas”.
Uma sugestão do pesquisador seria trazer “centros de pesquisas, ONG’s, profissionais das humanidades e da comunicação que trabalham com as questões climáticas” para dentro do IPCC, e ter um trabalho em conjunto para divulgação ao “público em geral, os tomadores de decisão e os formuladores de políticas públicas”.
Eventos climáticos extremos
De acordo com o “Sumário para Tomadores de Decisão”, por causa da ação humana no planeta, os impactos climáticos aumentaram consideravelmente causando perdas e danos às comunidades. Um exemplo desses prejuízos está nos centros urbanos que são e têm sido afetados de maneira drástica, como os eventos climáticos extremos que ocorreram recentemente no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.
Em relação a esse ponto, Jean Ometto, pesquisador do INPE, que participou como autor líder do capítulo sobre a América Central e do Sul, e ainda autor-coordenador do capítulo especial sobre Florestas Tropicais, dos Sumários para Tomadores de Decisão e Técnico, salientou avaliar o planejamento e a gestão urbana para evitar os impactos das mudanças climáticas.
Acrescentou que políticas de adaptação e mitigação foram discutidas durante a formulação do sexto relatório analisando um maior aproveitamento de fontes renováveis, inclusive para o transporte e edificações; aumento das áreas verdes em centros urbanos; consumo sustentável da água; agricultura urbana; e redução na desigualdade e vulnerabilidade social.
Considerou também que esse relatório em especial, devido ao aumento considerável de artigos e estudos científicos acerca das mudanças climáticas, permitiu que o AR6 do IPCC fosse “mais assertivo e inclusivo considerando raça, gênero e representação regional”.
Povos originários, comunidades tradicionais e tipping points
Um outro ponto de destaque no AR6 foi a importância atribuída ao conhecimento indígena para a elaboração de planos de adaptação às mudanças climáticas. Os povos originários sempre figuraram nos relatórios do IPCC como vítimas dos efeitos das transformações ambientais. É a partir do quarto relatório, de 2007, que algum protagonismo dos povos indígenas e tradicionais é reconhecido. No relatório deste ano, no entanto, a mensagem de que formas não-ocidentais de conhecimento do ambiente devem integrar os esforços internacionais é particularmente assertiva.
Taddei afirma que as críticas que os povos originários há tempos fazem sobre os modos de vida insustentáveis das sociedades contemporâneas, e a mudança radical necessária para uma transformação social no planeta, estão “nas conclusões deste relatório do IPCC, ainda que com outras palavras”…
A inserção de outros conhecimentos no relatório, como os dos povos originários, é ao mesmo tempo “animador e desafiador”, na opinião do pesquisador, uma vez que os cientistas não sabem como isso poderá ser feito. “É aqui que se evidencia a necessidade de uma abordagem inclusiva, que aproxime autores indígenas do debate, e da abertura das ciências sociais ao diálogo com as das ciências da terra”, finaliza Taddei.
No capítulo sobre pobreza e desigualdade foi inserido sobre a integração da ciência com os povos tradicionais. Consta, na introdução do sumário para tomadores de decisão, valorizar não apenas o saber científico, mas também o indígena e o dos povos tradicionais locais, com o intuito de uma maior compreensão, conscientização e avaliação da emergência climática. E consequentemente o de influenciar comportamentos que potencializam a “redução dos riscos das mudanças climáticas no planeta”.
No sumário consideraram ainda que a perda do ecossistema impacta diretamente a todos, mas, especialmente aos povos originários e comunidades tradicionais que são diretamente dependentes do ecossistema para a sobrevivência.
Marengo complementou dizendo que a ideia do ponto de não retorno (tipping points), ou seja, de partes da Floresta Amazônica tornar-se savanas (savanização da Amazônia), acontecerá caso nada seja feito para diminuir consideravelmente ou parar o desmatamento, bem como o de reduzir os gases de efeito estufa pela metade ainda nesta década, e o de não exceder o aquecimento global a 2ºC. Se medidas adequadas forem consideradas e colocadas em prática imediatamente, os efeitos da emergência climática poderão ser minimizados e/ou reduzidos. (Link com a notícia completa em pdf)
Outras bibliografias consultadas:
Flip 2014 – Festa Literária Internacional de Paraty. “Tristes Trópicos”, com Beto Ricardo e Eduardo Viveiros de Castro. Link: < https://www.youtube.com/watch?v=G9nmbFnanDQ&t=3412s>
Flip 2022 – Festa Literária Internacional de Paraty. Mesa 12 | Políticas Vegetais, com Kim Stanley Robinson e Eliane Brum. Link: < https://www.youtube.com/watch?v=jg_8yW2z6zI>
Observatório de BioEconomia. FGV – ESSP Escola de Economia de São Paulo. IPCC/AR6 – Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade. Link: < https://eesp.fgv.br/sites/eesp.fgv.br/files/ipcc_-_ar6_-_impactos_adaptacao_e_vulnerabilidade.pdf>
Webinário FAPESP Mudanças Climáticas. Lançamento do novo relatório do IPCC Grupo de Trabalho 2. 03 de março de 2022. Link: https://www.youtube.com/watch?v=pusHlS0wSEA
Gláucia Pérez é bolsista TT Fapesp no projeto INCT-Mudanças Climáticas Fase 2 financiado pelo CNPq pro- jeto 465501/2014-1, FAPESP projeto 2014/50848-9 e CAPES projeto 16/2014, sob orientação de Susana Oliveira Dias.
Coletivo e grupo de Pesquisa | multiTÃO: prolifer-artes sub-vertendo ciências, educações e comunicações (CNPq)
Projetos | Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC) – (Chamada MCTI/CNPq/Capes/FAPs nº 16/2014/Processo Fapesp: 2014/50848-9); Revista ClimaCom: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/ e Revista ClimaCom.