#4 – Escuta Clima: Vulnerabilidade: as vítimas das mudanças climáticas.
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No episódio anterior, descobrimos como a desigualdade social afeta determinados grupos urbanos durante a iminência de um desastre natural. No episódio de hoje, vamos identificar quem faz parte desses grupos mais vulneráveis e como os eventos extremos no Brasil afetam suas saúdes e os colocam em risco de morte. É importante lembrar, também, que tais eventos de ordem climática são intensificados pelo aquecimento global e ficarão mais fortes e frequentes a cada ano.
A série Escuta Clima é produzida pela Camila Ramos e está ligada ao curso de Especialização em Jornalismo Científico do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) e ao Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri) da Unicamp. O projeto tem o objetivo de divulgar as pesquisas e pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Mudanças Climáticas (INCT-MC) e é apoiado pela bolsa Mídia Ciência da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
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Camila Ramos – A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas, que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Esse é o artigo 196 da atual Constituição brasileira.
No episódio anterior e a primeira parte do tema de Vulnerabilidade, que você encontra nessa mesma plataforma que nos ouve agora, vimos que a desigualdade social é um fator determinante da vulnerabilidade humana frente ao risco de um desastre natural.
O Alberto Najar, que é sociólogo e pesquisador titular da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, a Fiocruz, resume bem o assunto:
Alberto Najar – Risco e vulnerabilidade são conceitos que só podem ser compreendidos levando em consideração diferentes contextos histórico-sociais e as diferentes disputas de paradigmas das áreas científicas que as desenvolveram. Portanto, dependendo do ponto de vista, sob risco podem estar grande parte das populações e das comunidades que vivem em situação de vulnerabilidade, principalmente em grandes centros urbanos. A exposição ao risco ou a existência de vulnerabilidade é produto dos modelos econômicos que prevaleceram desde a metade do século XX, e que acentuaram as desigualdades econômica e sociais, aumentando a pobreza e expulsando significativa parte da população para as periferias urbanas, áreas essas que foram gradativamente ocupadas de forma desordenada, o que gerou não apenas problemas ambientais de diversas ordens, mas também a intensificação de situação de risco geradas por ameaças ou processos naturais, que são potencializados pelos eventos extremos decorrentes, por exemplo, das mudanças climáticas”.
Camila Ramos – Também vimos no episódio anterior que existem diversos estudos voltados a descobrir quem são as pessoas sob risco. Como é o caso da pesquisa conduzida pela Regina Alvalá e colaboradores, que estimaram com base em análise para 825 municípios do Brasil que a cada 100 habitantes, nove viviam em áreas de riscos de desastres.
A Regina é pesquisadora e coordenadora de Relações Institucionais do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, o Cemaden, e foi uma das entrevistadas.
Essas pesquisas ajudam a subsidiar a gestão de riscos e respostas a desastres e são relevantes para subsidiar, também, políticas públicas que têm o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população e são extremamente importantes para tornar uma cidade mais resiliente. Afinal, os eventos climáticos extremos estão ficando mais intensos e frequentes a cada ano, intensificados pelo aquecimento global. Como indica o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas.
Então, no episódio de hoje iremos continuar o assunto de Vulnerabilidade, identificando quem são as pessoas que vivem em áreas sob risco de desastres no Brasil e como esses eventos afetam sua saúde e suas vidas. Assim, vamos ouvir novamente os pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Mudanças Climáticas, que são a Regina Alvalá, o Alberto Najar e a Gabriela Couto, que é doutoranda do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do INPE e pesquisadora associada do Cemaden.
Teremos, também, a participação da bióloga Júlia Alves Menezes, que é pesquisadora do Laboratório de Análises e Desenvolvimento para a Sustentabilidade do INPE e pesquisadora de Estudos Transdisciplinares em Saúde e Meio Ambiente da Fiocruz. E da enfermeira Rhavena Santos, pesquisadora do Instituto René Rachou da Fiocruz. Ambas pesquisadoras do INCT sobre Mudanças Climáticas.
Eu sou Camila Ramos e você está ouvindo o Escuta Clima. Um podcast para divulgar as pesquisas do INCT Mudanças Climáticas. É vinculado ao Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp, o Labjor, e é uma seção da revista ClimaCom e Rede de Divulgação Científica e Mudanças Climáticas.
[Vinheta do podcast Escuta Clima]
Camila Ramos – Notícias sobre os impactos causados por desastres naturais já viraram rotina. Você deve se lembrar de algum evento extremo que aconteceu no último ano, certo?
Não é difícil encontrar exemplos, já que esse 2020 foi um ano atípico em muitos aspectos. Vamos ver alguns: a temporada de furacões no oceano Atlântico teve um número recorde de ciclones, tempestades tropicais e furacões. Alguns deles ocorrendo simultaneamente, o que não é comum. O verão no polo norte, especificamente a região da Sibéria, na Rússia, foi o mais quente da história, fazendo as temperaturas alcançarem quase 40ºC. Já no Brasil, podemos citar as chuvas extremas no Sudeste em janeiro e fevereiro e o ciclone bomba no Sul, em junho. Ou ainda, mais recentemente, a onda de calor repentina que atingiu todo o território brasileiro em outubro passado.
Esses eventos podem parecer parte do pacote de desgraças de 2020, mas é preciso reconhecer o quanto o nosso estilo de vida moderno está contribuindo para intensificar as alterações no clima. E as ações contra a natureza estão retornando para nós, afetando nossas vidas e nos colocando em risco de morte. A Júlia Menezes comenta sobre isso:
Júlia Menezes – As mudanças climáticas podem produzir impactos, sim, sobre a saúde humana por diferentes vias. Uma delas é a forma direta, principalmente na materialização de óbitos. Os óbitos, eles também são muito comuns em eventos extremos de grande intensidade, grande energia, como furacões, vendavais e tempestades. Porém, muitas vezes, os impactos da mudança do clima, eles se manifestam de maneira indireta, com a alteração gradual e permanente que vai sendo observada no regime de chuvas, na temperatura e na umidade que acabam por interferir nos ecossistemas e na interação entre os componentes dos ecossistemas.
Camila Ramos – Apesar dos desastres deflagrados por ameaças naturais e as mudanças climáticas não escolherem suas vítimas a dedo, é preciso entender que há grupos sociais que serão mais impactados por um evento extremo que outros grupos. E a Regina Alvalá dá um visão abrangente sobre essas pessoas mais vulneráveis:
Regina Alvalá – Em termos gerais, crianças, mulheres, mulheres grávidas, idosos, pessoas portadoras de deficiências, desnutridos e pessoas comprometidas ou imunologicamente comprometidas são particularmente vulneráveis ao aumento da gravidade e da frequência de desastres relacionados ao clima, como as tempestades, as ondas de calor, deslizamentos de terra, alagamentos, inundações, secas, principalmente nos países mais pobres e em desenvolvimento. O principal contribuinte para a vulnerabilidade é a pobreza e suas consequências comuns, como desnutrição, falta de moradia, moradia precária e mesmo a miséria.
Camila Ramos – Dentro dessa perspectiva que considera a desigualdade social como fator determinante para situação de risco em nível individual, o pesquisador Alberto Najar também apresenta sua visão sobre a vulnerabilidade estrutural, ou seja, as condições que levam um coletivo a uma maior insegurança frente a um desastre:
Alberto Najar – Os grupos populacionais mais vulneráveis sob essa perspectiva, os mais atingidos por esse quadro dramático é a população negra. Do total de brasileiros e brasileiras que vivem abaixo da linha de pobreza, eles representam 72,7%, 38,1 milhões de pessoas vivendo em situação de grande restrição material. Num recorte por sexo, mulheres pretas ou pardas são 27,2 milhões. Baixa escolaridade, poucas oportunidades de emprego, acesso apenas aos piores postos de trabalho, falta de acesso à infraestrutura de serviços de saneamento (em especial o esgotamento sanitário e coleta de lixo), forte segregação urbana, discriminação por cor de pele e sexo, formam, entre outros tantos problemas, a matriz da vulnerabilidade brasileira. A estrutura de desigualdade brasileira atinge, seletivamente, quatro grupos populacionais: negros, mulheres, crianças e idosos, indicando quatro recortes principais na estrutura social: cor de pele, sexo, idade, todos controlados pelo rendimento.
Camila Ramos – Quando falamos de gênero, as mulheres são as mais vulneráveis. É o que diz o relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, de 2015. O estudo diz que as mulheres, por serem associadas ao trabalho doméstico pela sociedade, tendem a permanecer em suas casas ou tomar para si a responsabilidade de cuidar de crianças, idosos ou doentes durante a iminência de um desastre. Além disso, por ganharem um salário menor, terem menos oportunidades de emprego e, muitas vezes, um grau de escolaridade menor em relação aos homens, as mulheres acabam tendo menos recursos para se recuperarem após um desastre. A Gabriela Couto explica essa relação entre gênero e os impactos dos desastres ambientais:
Gabriela Couto – Os primeiros sinais de gênero como uma importante categoria de análise para entendimento de processos sociais relacionados a desastres têm na sua origem a alta taxa de mortalidade de mulheres e meninas em situação de desastres. O terremoto na Guatemala de 1976, o terremoto de 1992 no Egito, o devastante ciclone no sul da Ásia em 1991 e o tsunami na Indonésia de 2004, caracterizam todos pelo maior número de mortes entre as mulheres. […] As desigualdades de gênero também são reconhecidas como importante elemento de vulnerabilidade de mulheres e meninas, em situação de desastres. Alguns autores sustentam a hipótese de que a vulnerabilidade de gênero está relacionada apenas à categoria da ameaça natural. Eles afirmam que em certos tipos de desastres, mulheres e homens têm propensão diferenciada para assumir risco, onde os homens seriam mais propensos do que as mulheres a arriscarem-se, portanto, serem as maiores vítimas de desastres. Mas, as altas taxas de mortalidade e as desigualdades no pós desastre levaram grupos de pesquisa de todo mundo ao desafio de tentar responder a importantes questões: São as mulheres mais vulneráveis? Por quê? Quais as dimensões de gêneros estão associadas às consequências de desastres? Quais outros fatores relacionados ao gênero aumentam ou podem contribuir para a redução da vulnerabilidade? No rol das respostas está o reconhecimento de que o impacto de desastres é sensível ao gênero na medida em que papéis, responsabilidades e oportunidades estão associados a homens e mulheres de formas desiguais.
Camila Ramos – Conhecendo quem são as principais vítimas, vamos entender melhor os impactos dos eventos extremos mais recorrentes no Brasil e o que pode ser feito para garantir uma melhor segurança para a população.
As chuvas torrenciais que causam alagamentos ou deslizamentos de encostas são muito comuns no Brasil. Um exemplo aconteceu há 10 anos, em 2011, quando uma intensa precipitação no Rio de Janeiro causou a pior tragédia climática da história do Brasil. Deixando cerca de 900 mortos, centenas de desaparecidos e mais de 20 mil desabrigados.
Esses eventos acontecem de forma repentina e, muitas vezes, não dá tempo da população ou dos agentes da defesa civil agirem de forma rápida e eficiente, o que impacta as comunidades em risco de diferentes formas, como explica detalhadamente a Rhavena Santos:
Rhavena Santos – A população pode ser acometida diretamente por esse evento, por exemplo, por meio de destruições de casas, perda de familiares, ou mesmo indiretamente, quando essas enchentes e inundações elas atingem estruturas físicas de saúde (hospitais, ambulatórios) e vão prejudicar respostas do município, da localidade a esse evento. Então isso prejudica a assistência à população nesse momento de crise. Essas diferenças, elas são sentidas também nos impactos ambientais posteriores a um desastre e podem ampliar, por exemplo, condições de vulnerabilidade que já existem naquela localidade. Os desastres vão interferir na dinâmica das doenças de um território e podem prejudicar, a qualidade da água que está disponível para aquela população, para consumo humano, podem gerar impactos sobre a saúde que engloba tanto doenças de veiculação hídrica quanto transmitidos por vetores, prejudicar a disponibilidade e o acesso a alimentos, levando a impactos sobre o estado nutricional da população.
Camila Ramos – Dentre as doenças que a pesquisadora falou, podemos citar a leptospirose, que é causada por uma bactéria transmitida pela urina de roedores e pode estar presente na água das enxurradas. Ou ainda a dengue, febre amarela, zika e chikungunya, que são transmitidas pelo nosso já bem conhecido mosquito aedes aegypti. Ele se aproveita do acúmulo de águas paradas para proliferar. As enchentes criam esse ambiente favorável pro mosquito.
E não podemos deixar de falar das doenças mentais. A população vítima de desastres pode apresentar quadros de ansiedade, depressão e transtorno pós-traumático, assim como pode passar pelo luto devido à perda de familiares.
Para minimizar os impactos de um desastre, é preciso gerar informações e levar esse conteúdo para as comunidades e governantes. A Rhavena, que estudou o fluxo de dados sobre saúde após enchentes e enxurradas em Minas Gerais, explica essa questão:
Rhavena Santos – Mas qual que é o papel da informação nisso tudo? A informação, ela é um recurso estratégico que deve ser administrada corretamente para poder contribuir, para poder maximizar essa qualidade da tomada de decisão e para desenvolvimento individual, coletivo e social das organizações. É muito importante que os governantes, sociedade civil organizada, tomadores de decisão, formuladores de políticas eles tenham a informação na hora certa para tomar as decisões assertivas.
Camila Ramos – Ainda existem barreiras entre os pesquisadores e a informação. Por exemplo, é preciso desenvolver um modo de aglutinar todos os dados para fazer um levantamento nacional que seja confiável e eficiente, e são essenciais mais investimentos nessas pesquisas. Além disso, é necessário que os registros dos desastres sejam feitos por aqueles que atuam neles, como os agentes de segurança e defesa civil, para que sejam notificados de modo qualitativo e não quantitativo quem são as vítimas. Ou seja, é preciso identificar a idade, gênero, cor da pele, renda, nível de escolaridade, onde moram e com quem, e por aí vai…
Ou seja, temos que conhecer a pessoa em vez de somar mais um número no documento geral de mortos, feridos e desabrigados. É o que a Gabriela tenta fazer em sua pesquisa:
Gabriela Couto – Sobrevivência e recuperação de afetados por desastres são elementos primordiais na obtenção de conhecimento que indiquem novas formas de lidar com situações de desastres. Quais capacidades humanas podem ser fortalecidas? Que estruturas precisam ser melhoradas? Onde que deve ser investido recurso? Onde órgãos de defesa e gestão podem ou devem atuar? Olhar para a vulnerabilidade se faz importante. E já existe conhecimento de quais são os principais fatores preditores de vulnerabilidade a desastre, mas ainda é mais importante conhecer as capacidades ou a falta delas as quais precisam ser fortalecidas, precisa ser investido recurso humano, social e econômico que possibilite um planejamento para gestão de risco de desastres de forma mais integrada e que combine ciência, educação, saúde, segurança, meio ambiente e proteção.
Camila Ramos – Em resumo, é preciso ter respeito e empatia pela população vulnerável e entender suas necessidades para, assim, criar políticas públicas mais eficientes e melhorar a qualidade de vida dessas pessoas.
Existe outro evento extremo de ordem climática no Brasil que causa impactos significativos na saúde da população. São as secas. Já falamos delas no episódio #111, intitulado Rios Urbanos e Conta-gotas.
As secas atingem mais intensamente a região semiárida do Nordeste, um local que tem baixa pontuação no Índice de Desenvolvimento Humano, comparada com outras regiões do Brasil. E a população tem uma qualidade de vida também pior do que em outras regiões. A Júlia explica quem são essas pessoas:
Júlia Menezes – No semiárido, há uma construção histórica de vulnerabilidades sociais, econômicas e ambientais, que reduzem a capacidade de resiliência e adaptação da população. Meu estudo, do semiárido, observou que as maiores vulnerabilidades estavam associadas à população com menor nível de instrução, menor renda, com mão de obra, principalmente, empregada na área agrícola, que dependiam da produção familiar, da agricultura familiar no caso, e com baixo acesso à água encanada. Então, essas eram as principais condições observadas nos municípios de maior vulnerabilidade no que se relacionava às secas e a saúde nessa perspectiva da saúde como um conceito amplo.
Camila Ramos – Esse estudo que a Júlia comentou trata da relação entre as secas e a saúde humana, que, assim como as enchentes, causam diversos agravos, principalmente em comunidades mais vulneráveis.
Júlia Menezes – O que se sabe sobre a seca e saúde é que a seca atua sobre os sistemas ecológicos, econômicos, sociais e culturais e pode causar danos e prejuízos significativos às condições de vida das populações que estão expostas à seca, como, por exemplo, deficiência no fornecimento de água para higiene, para alimentação, prejuízo na agricultura e pecuária, pode acarretar migrações populacionais, incêndios florestais, degradação da qualidade da água com problemas que repercutem na saúde de maneira geral.
Camila Ramos – Ou seja, as secas podem facilitar o surgimento de doenças específicas. E como exemplo podemos citar os quadros de diarreia, hepatites A e E, cólera, desidratação e desnutrição. Ou ainda, podem promover o aumento de casos de doenças vetoriais, como a dengue, novamente, já que o mosquito encontra um bom local para proliferação nas cisternas e reservatórios de água.
Relacionar certos agravos de saúde diretamente com as secas é difícil, já que elas acontecem de forma lenta e não dá pra determinar o seu início e fim com exatidão. Há um consenso entre os pesquisadores sobre o prejuízo de saúde decorrente da má qualidade da água e do menor acesso à alimentação, bem como outros fatores relacionados às secas, como o calor intenso. Essas consequências também podem impactar na saúde mental da população, como explica a Júlia:
Júlia Menezes – Os casos desse tipo de doença, como depressão, ansiedade, estresse também já foram observadas em população vivendo com extremos de seca, mas não há ainda nenhum estudo que comprove diretamente essa relação para o semiárido brasileiro, justamente por ser difícil associar a seca a agravos de saúde. Mas, internacionalmente, vários estudos já se debruçaram sobre essa relação entre doenças mentais e seca e encontraram alguns agravos como esses que eu citei principalmente nas zonas rurais, devido às incertezas que uma seca prolongada pode gerar para a produção da agricultura familiar, para a percepção econômica que aquela família pode ter daquela produção que vai ser impactada pela seca.
Camila Ramos – Atualmente existem planos nacionais que procuram diminuir a vulnerabilidade frente aos impactos dos eventos ligados às mudanças climáticas. Um exemplo é o Plano Nacional de Adaptação, que é parte da Política Nacional sobre Mudança do Clima, criado em 2016 pelo governo federal junto à Organização das Nações Unidas. O objetivo é identificar as pessoas sob risco para definir ações de adaptação e resiliência. A Júlia, novamente, explica a importância de iniciativas como essa:
Júlia Menezes – Então, no caso do semiárido, por exemplo, pesquisas focadas em adaptação já demonstraram a importância de se avaliar a vulnerabilidade em relação aos impactos futuros da mudança do clima, sendo que o foco dessas avaliações devem se dar sobre as iniquidades sociais atuais, que a gente observa hoje, e das práticas ambientais insustentáveis que acabam aumentando os impactos das secas. Então, o fenômeno da desertificação, do uso inadequado do solo para a agricultura… Tudo isso com o advento da seca e a mudança do clima que tende a tornar a seca um evento mais comum e mais intenso no futuro, pode aumentar a vulnerabilidade das populações.
Camila Ramos – A pesquisadora mencionou um tema relevante em sua fala, que é o manejo e uso do solo. A agricultura e pecuária extensiva, as queimadas, a degradação de florestas e a extração ilegal de madeiras são problemas persistentes no Brasil e causam consequências terríveis, alterando o clima e intensificando os desastres naturais de que falamos hoje.
Mas essas discussões ficam para outro episódio. Por isso não deixe de acompanhar a série de podcast Escuta Clima. Ouça também os episódios anteriores, que estão disponíveis nessa mesma plataforma que você está nos ouvindo agora.
Eu sou Camila Ramos. E este é o Escuta Clima. Um podcast sobre pesquisas relacionadas ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Mudanças Climáticas. Este podcast é apoiado pelo Programa Mídia Ciência da FAPESP. Este projeto de jornalismo científico, está sendo desenvolvido no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade, da Unicamp. E é uma seção da revista ClimaCom e Rede de Divulgação Científica e Mudanças Climáticas. Tem a supervisão científica da pesquisadora Simone Pallone de Figueiredo e jornalística da pesquisadora Susana Dias. A trilha sonora foi desenvolvida pelo Lucas Carrasco, que tem apoio do PIBIC, do CNPq. A edição do podcast é feita pelo Octávio Augusto Fonseca, da Rádio Unicamp, com apoio do Gustavo Campos, que tem suporte da bolsa SAE. A divulgação nas redes sociais é feita pela Helena Ansani Nogueira. A locução da vinheta é de Bruno Moraes.