O negacionismo na comunicação política da rede bolsonarista é uma artimanha estratégica comunicacional ou mero acaso? Um ensaio teórico a partir de conceitos freudianos | Rafael Rodolfo Sartorelli Sadocco, Suelen Aparecida de Souza Fernandes e Helen Regina José da Silva


Rafael Rodolfo Sartorelli Sadocco[1]

Suelen Aparecida de Souza Fernandes[2]

Helen Regina José da Silva[3]

  1. INTRODUÇÃO

A pandemia de Covid-19 iniciada na China no final de 2019 acabou por se desdobrar em um estado de exceção social em todo mundo, que além de escancarar as inúmeras dificuldades no manejo de políticas protetivas, também impetrou o sentimento de indeterminação frente à ameaça de um vírus silencioso e fatal (URZÚA et al., 2020). Nesta conjuntura, acadêmicos, pesquisadores, agentes públicos entre outros, partem de inúmeras premissas para compreender o comportamento da sociedade perante uma ameaça que já ceifou mais de 600 mil vidas apenas no Brasil (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2021). Um dos motivos que poderiam gerar maior desconforto nessa compreensão seria a da constante recusa de pessoas a aceitarem e assumirem os riscos provocados por essa doença tão perniciosa (URZÚA et al., 2020).

Essa tendência de rejeitar a seriedade da doença, presente nos mais variados grupos sociais, já foi constantemente debatida por múltiplos autores em diversos campos do conhecimento (ROY; SINHA, 2020). Contudo, deve-se pontuar que o descarrilamento da epidemia não é apenas fruto dos comportamentos individuais irresponsáveis e negacionistas, mas igualmente, oriunda de um somatório de atitudes deliberadamente equivocadas por parte de ocupantes de cargos políticos de prestígio. Esses, mesmo agindo na contramão da ciência e das orientações das mais credenciadas organizações médicas, eximiram-se de pensar estratégias adequadas cientificamente, buscando uma imunização rebanho impossível de ser atingida sem que se gerasse incontáveis perdas humanas (CALIL, 2021).

Todavia, muitos desses gestores públicos ainda gozam de suntuoso prestígio perante uma significativa parcela da sociedade. Um desses agentes políticos, o presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, cometeu ininterruptos erros na condução da pandemia, ao agir de maneira grosseiramente populista, o que culminou tanto na sua repulsa internacional, como na formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que já levantou ao menos 20 crimes propositais praticados por esse líder (CALIL, 2021; WILLIAMS; KESTENBAUM; MEIER, 2020; AGÊNCIA SENADO, 2021).

Não obstante, nota-se que ao longo de 2020 e início de 2021, os órgãos responsáveis pela comunicação do Presidente e seus apoiadores mais próximos adotaram sistematicamente um compilado de narrativas que distorcem a realidade no combate ao vírus. Essas, por mais descabidas, foram em grande parte aceitas e reproduzidas por seus apoiadores (AMARAL, 2021). Em paralelo, os índices de aprovação desse governante permaneceram relativamente altos, na casa dos 35%, sendo que 24% a consideram a gestão como “ótima” ou “boa”, ainda que o número de mortes fosse tanto em números absolutos como proporcionais um dos mais altos do mundo (GAZETA DO POVO, 2021).

 

(Leia o ensaio completo em PDF)

 

Recebido em: 20/11/2021

Aceito em: 10/12/2021

 

[1] Doutorando em Administração, Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM. Mestre em Administração, Universidade Federal de Lavras – UFLA. E-mail: rafael.sadocco@acad.espm.br.

[2] Mestra em Administração Pública, Universidade Federal de Lavras – UFLA. E-mail: suelensouzaadm@hotmail.com.

[3] Bacharela em Psicologia, Universidade Paulista – UNIP. E-mail: helenregina04.hr@gmail.com.

O negacionismo na comunicação política da rede bolsonarista é uma artimanha estratégica comunicacional ou mero acaso? um ensaio teórico a partir de conceitos freudianos

 

RESUMO: Este trabalho visita as comunicações do presidente Jair Messias Bolsonaro e de sua rede de apoiadores para analisar se o êxito de suas estratégias comunicacionais durante a pandemia de Covid-19 foi mérito de narrativas bem planejadas ou fruto do acaso. Para analisá-las, tomou-se como base os conceitos desenvolvidos por Sigmund Freud, tais como a ideia de negação, perseguição e mal-estar civilizatório. Pela profundidade do tema e interdisciplinaridade proposta, optou-se por fazer um Ensaio Teórico, permitindo uma amplitude maior para a discussão. Foram desenvolvidas tabelas que mesclavam os conceitos freudianos com as alegações sustentadas bolsonaristas que concluiu que embora as comunicações políticas tenham sido acertadas, parece que o grande sucesso do Presidente Jair Bolsonaro está no delírio coletivo que o segue, muito mais no que na articulação das narrativas elaboradas por sua equipe

PALAVRAS-CHAVE: Bolsonarismo. Negacionismo. Freud.


Is the denial in political communication of the pocketbook network a strategic communicational trick or is it mere chance? A theoretical essay based on Freudian concepts

 

ABSTRACT: This paper visits the communications of President Jair Messias Bolsonaro and his network of supporters to analyze whether the success of his communication strategies during the Covid-19 pandemic was due to well-planned narratives or the result of chance. To analyze them, we take as a basis the concepts developed by Sigmund Freud, such as the idea of ​​denial, persecution, and civilizing malaise. Due to the depth of the theme and the proposed interdisciplinarity, it was decided to carry out a Theoretical Essay, allowing a greater amplitude for the discussion. Tables were drawn up that mixed Freudian concepts with the sustained allegations of the Bolsonaro phenom who thought that although the political communications were correct, it seems that President Jair Bolsonaro’s great success lies in the collective delirium that follows, much more than in the articulation of the narratives elaborated by his team.

KEYWORDS: “Bolsonarismo”. Denialism. Freud.

 


SADOCCO, Rafael Rodolfo Sartorelli; FERNANDES, Suelen Aparecida de Souza; SILVA, Helen Regina José da. O negacionismo na comunicação política da rede bolsonarista é uma artimanha estratégica comunicacional ou mero acaso? um ensaio teórico a partir de conceitos freudianos. ClimaCom – Diante dos Negacionismos [Online], Campinas, ano 8, n. 21,  dezembro. 2021. Available from: https://climacom.mudancasclimaticas.net.br/o-negacionismo-na-comunicacao-politica-da-rede-bolsonarista