Álbum de parentes desconhecidos

Título: Álbum de parentes desconhecidos (Arquivo Nuvens – Projeto Fractosferas)


Resumo: Intimidades dissonantes que se perturbam mutuamente. Uma familiaridade que não se reconhece à primeira vista. Climatologistas e o cotidiano de qualquer um se entrelaçando. Cientistas fazendo parentes com os dados, com os instrumentos de medição, com probabilidades de chuva que afetam cultivos de café ou cana, que afetam o cultivar de vidas humanas e não-humanas. Um Bildungsroman, um romance de formação – de parentescos aberrantes – que queremos condensar, como quem se junta caoticamente dentro de uma nuvem, neste álbum impossível. Um álbum que nos faz lembrar relações que estão aí e que não estão aí. Relações que devemos inventar todo dia, abrindo o humano às forças do céu, ao modo como os cientistas ganham intimidade com o mundo. Um medir desmedido de possibilidades de vida, de estar junto, onde todo o evento familiar que vale a pena ser lembrado é também um evento catastrófico e impróprio que faz do encontro uma questão de atmosferas turbulentas. Àlbum de parentes desconhecidos, álbum de condensações por vir… Esta experimentação entre ciências, artes e filosofias é uma continuação da série “Arquivo nuvens” inserido no projeto “Fractosferas”. Agradecemos especialmente a Jurandir Zullo Junior e ao Cepagri-Unicamp pela possibilidade deste encontro improvável.


Title: Album of unknown kin (Clouds Archive – Fractospheres Project)

Abstract: Dissonant intimacies that disturb each other. A familiarity that is not recognized at first sight. Climatologists and the everyday life of anyone interlacing. Scientists making kin with data, with measuring instruments, with probabilities of rainfall, which affect coffee or sugarcane crops, that affect the cultivating of human and nonhuman lives. A Bildungsroman, a novel of formation – of aberrant kin – that we want to condense, as one joins chaotically within a cloud, in this impossible album. An album that reminds us of relationships that are there and that are not there. Relations that we must invent every day, opening the human to the forces of sky, like scientists gain intimacy with the world. An unmeasurable measure of life possibilities, of being together, where every family event that is worth remembering is also a catastrophic and improper event that makes the encounter a matter of turbulent atmospheres. An Album of Unknown Kin, an album of condensations to come… This experimentation between sciences, arts and philosophies is a continuation of the series “Clouds Archive” and is part of the “Fractospheres” project.

Concepção e organização/ Idea and organization: Susana Dias e Sebastian Wiedemann

Textos e montagens/Texts and edition: Adriana Villar Potiens, Beatriz Guimarães de Carvalho, Maria Luiza Almeida, Glauco Roberto da Silva, Tatiana Plens, Natália Matui, Mário D. Castro Júnior, Marcelo Carlos de Souza Soares, Vinícius Brito, Sara Melo, Lisley de Cássia Silvério-Villar, Ricardo Lima e Renan Lopes, Susana Dias e Sebastian Widemann.

Fotos do livro-objeto/photos of the object-book: Susana Dias

Disciplina/Course: Arte, ciência e tecnologia/ Art, science and technology (Labjor/IEL/Unicamp) – professores Susana Dias e Sebastian Wiedemann (artista convidado).

 


Arquivo Nuvens

Nesta série de mesas de trabalho da ClimaCom – iniciativa do grupo multiTÃO e Orssarara Ateliê – propomos encontros com as nuvens por senti-las e pensá-las como intercessores fundamentais diante das mudanças climáticas. O medo que se instaura frequentemente diante de sua aparição tempestuosa (inundações) ou de seu sumiço aterrador (secas), nos colocam diante da questão política urgente de estarmos preparados para o que vem. E se a resposta surge rapidamente – “É preciso juntar forças para resistir ao que vem” – talvez seja preciso enfrentar a desaceleração gerada por perguntas que retornam em ondulações insistentes: “como?”, “o que pode vir a ser juntar forças?”, “o que vem?”. Nesta proposta concebemos as nuvens como forças que, como o sol, uma montanha, os musgos, os caranguejos e os corais, não podem ser excluídas de nossas buscas por inventar novos modos de “juntar forças”, de “resistir” e de estar aberto ao “que vem”. Criar alianças do que vem de outros reinos, de um reino diverso, e investir em campos de atração entre ciências, artes e filosofias, que abrem um entre-reinos. Não sabemos o que pode uma nuvem e, nesse sentido, é que nos lançamos na criação de uma coleção de existências particulares delas. “Arquivo Nuvens” é  feito de taxonomias flutuantes e amostragens leves, recolhidas em nossos movimentos de segui-las, tanto nos céus, quanto nos livros, de acompanhar seus processos de des-aparição nas notícias, nos laboratórios, nos congressos científicos, nos filmes, exposições etc. Um arquivo generativo em morfogênese constante, cuja gravidez dá lugar a novas linhas de força gravitacional, e nos coloca a pergunta: O que é gravitar sem centro? Talvez seja isso o que as nuvens possam nos ensinar com sua gravidez pluri-vital e pluri-dimensional. Uma nuvem pode estar composta por sensações como nas instalações “Lágrimas de São Pedro” de Vinicius S.A. <https://www.flickr.com/photos/viniciussa/> e nos projetos “Cloud Cities” e “Cloud Cities/Flying Garden” de Tomás Saraceno <http://tomassaraceno.com/projects/cloud-cities-flying-garden/>. Uma nuvem pode ser a invenção de uma nova percepção, uma flutuante, gasosa e leve que desconhece coordenadas ou ancoragens, como no filme “La region centrale” de Michael Snow. Uma nuvem também pode estar composta por dados e modelos matemáticos e nos colocar a pergunta pela mineração, pelo cálculo e controle. Ou até mesmo estar composta por entidades infinitamente minúsculas e sutis e nos lançar ao desafio de fazer delas uma força de um futuro incalculável, que pode ganhar uma expressão precisa tanto estatisticamente, como num poema ou ensaio filosófico. Uma nuvem pode se formar e participar de ciclos e sistemas a partir de complexas teorias de povos indígenas e dos cientistas que se dedicam a sua microfísica. Queremos gerar intercessões entre essas nuvens e investir num arquivo vivo, que sai da caixa, da gaveta, e que se lança em performances nas ruas, se transmuta em ensaios fotográficos, se verte em animação, se prolifera e condensa em encontros com convidados das mais diversas áreas. Um arquivo como plano de errâncias e heterogêneses, que se abre furioso como a caixa de Pandora, desatando as forças que fazem do ser-nuvem, uma vibração impessoal, um acontecimento nutrido pelos mais diversos movimentos de concrescência e preensão ou de devir e transição, onde tudo se torna causa eficiente para atingir uma potencialidade real.

Fractosferas: Partimos de uma hipótese: o Antropoceno nos impõe a necessidade de re-avivar nossa percepção e com isso apreender o fato que o mundo esta todo vivo e que não há uma pele que nos distancie dele (Thacker). O mundo como uma dobra infinita que complica a matéria do cosmos, e que pode passar, por exemplo, entre nuvens, arvores e pedras, criando esferas de coexistência e entre-viver. Fractosferas que abrem novas organizações entre escalas e possibilidades de coabitar o mundo. Um mundo onde o animismo deve ser reativado (Stengers) e o conhecimento deve ocorrer desde dentro (Ingold), como co-criação inter-espéciee que acontece com, entre e através das coisas e seres e não sobre ou a partir de. Acreditamos que um pensamento material e manual com, entre e através das nuvens, árvores e pedras onde o humano se desdobra através do sensível e expressivo sobre o papel, o fotográfico e o audiovisual, podem ser o modo de não só re-avivar a comunicação com o mundo, mas também de desarquivar o vivente que a matéria guarda para que possa continuar de maneira impensada em novos modos de existência (Souriau). Fractosferas uma série de experimentações coletivas como modos de fabulação especulativa entre artes, ciências e filosofias que apelam à criação de um possível conhecimento terrano (Latour). Workshops, oficinas, onde uma cosmopolitica do sensível e um estar junto se inventam ao fazer corpo com um pensamento que já não é mais pratico ou teórico e sim matéria vibrante (Bennett) de vida por vir e que pode emergir na forma de livros-objetos (com as nuvens), foto-livros (com as árvores) e animações (com as pedras).

 


Concepção, organização e coordenação “Arquivo Nuvens” e Projeto “Fractosferas”

Susana Dias e Sebastian Wiedemann

Grupo multiTÃO e Orssarara Ateliê

 

Projetos: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC) – (Chamada MCTI/CNPq/Capes/FAPs nº 16/2014/Processo Fapesp: 2014/50848-9); Mudanças climáticas em experimentos interativos: comunicação e cultura científica (CNPq No. 458257/2013-3); Sub-projeto “Sub-rede Divulgação científica” da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (convênio Finep/ Rede Clima 01.13.0353-00).