Adaptação à mudança climática: ciência, política e desenvolvimento sustentável


INTRODUÇÃO

A adaptação é um tema historicamente secundário, na agenda climática, em relação à mitigação, ganhando expressão significativa apenas a partir de meados da década de 2000. Como noção, entrou na pauta científica no século XIX e seguiu uma longa trajetória até ganhar espaço na pauta política climática no século XXI. O presente artigo se propõe a analisar essa trajetória como continum científico interdisciplinar que rompe a barreira da academia e ganha novos contornos, não objetivos, como conceito político-científico.

A primeira parte do trabalho descreve a evolução da noção e do conceito de adaptação desde a biologia evolutiva até antropologia, da qual a perspectiva da adaptação à mudança climática é derivada. Em seguida, são apresentadas definições e tipologias trazidas pela literatura científica especializada. A segunda parte dedica-se a relatar o processo de inserção do tema adaptação na agenda política climática internacional. Por fim, a terceira discute as implicações conceituais resultantes do encontro entre a abordagem científica e as particularidades da agenda política climática e do desenvolvimento sustentável, concluindo com a proposição de dois conceitos normativos: adaptação sustentável e desenvolvimento adaptativo.

 

ADAPTAÇÃO: EVOLUÇÃO DO CONCEITO CIENTÍFICO

Antes de tudo, é importante destacar que adaptação é uma noção e um conceito. Como noção, é compartilhada por diferentes áreas, referindo-se à ideia de ajuste, adequação em face de um contexto ou pressão externa. Como conceito, é mais restrita, recebendo diferentes acepções de acordo com o emprego, assumindo pressupostos específicos dentro do âmbito no qual é aplicada.

A noção de adaptação entra no discurso científico moderno por intermédio da evolução biológica dos séculos XVIII e XIX. Um marco nessa trajetória foi a teoria da evolução por meio da seleção natural, apresentada, pela primeira vez, em 1858, em um breve ensaio publicado pelos naturalistas britânicos Charles Darwin e Alfred Wallace. No ano seguinte, Darwin lança a sua grande obra A origem das espécies por meio da seleção natural (1985), que ganha grande notoriedade e difunde rapidamente, entre leigos e cientistas, a teoria evolutiva da seleção natural.

Durante primeira metade do século XX, o resgate dos trabalhos de Gregor Mendel – ainda no início da década de 1900 – e o posterior desenvolvimento da pesquisa em Genética, somaram-se ao desenvolvimento da biologia evolutiva. O resultado foi a chamada Teoria Sintética da Evolução, na qual a força do poder explicativo da teoria de Darwin manteve sua essência, permanecendo sólida após 150 anos da publicação de A Origem das Espécies, apesar de novas descobertas sobre mecanismos genéticos terem preenchido lacunas e aprimorado os pressupostos originais.

Em linhas gerais, a teoria darwinista, e suas derivações dentro da biologia evolutiva, parte do pressuposto da existência de uma criatividade natural que leva a modificações cegas (não intencionais) em indivíduos, espécies e populações. A criatividade natural não é fruto de uma vontade, uma intenção, mas ocorre por meio de mecanismos biológicos: mutação, recombinação gênica e recombinação cromossômica, na qual a inovação de genótipos é produzida. As variações resultantes são confrontadas a pressões ambientais e a parte majoritária é eliminada, de modo que apenas as mais aptas se perpetuam a cada geração. Se o ambiente muda, novas pressões se colocam e a perpetuação e eliminação das variedades seguem outras tendências. Portanto, a adaptação biológica não é um fim, mas um ajuste constante e responsivo ao ambiente.

A teoria darwinista teve grande apelo e rapidamente tornou-se uma teoia amplamente conhecida durante a segunda metade do século XIX, quando muitos teóricos acreditavam que os fenômenos sociais poderiam ser explicados por leis e teorias também observadas pelas ciências naturais. Não por acaso, a emergência das ideias de Darwin foi vista como elemento teórico para corroborar o paradigma do progresso social, já utilizado na época pela comunidade de cientistas que se formava em torno de questões que posteriormente fundaram as ciências sociais.

Segundo o paradigma do progresso social, havia uma hierarquia entre as civilizações, as quais poderiam ser organizadas segundo uma escala de progresso racial e geográfico, no topo da qual se encontrava o homem branco europeu (WETHERINGTON, 2012). Esta perspectiva desdobrou-se em abordagens científicas que se apropriaram de forma equivocada das ideias de Darwin para justificar – sob uma roupagem positivista – posturas racistas e eurocêntricas. O darwinismo social é um exemplo, cujas ideias se perpetuaram até a primeira metade do século XX, chegando a vias extremas em sua forma política: o eugenismo[2] social. Neste, a bandeira do melhoramento da raça foi usada para justificar políticas de eliminação ou esterilização forçada de minorias étnicas e indivíduos com doenças consideradas indesejáveis, culminando no eugenismo nazista das décadas de 1930 e 1940.

Entretanto, a influência das ideias de Darwin também seguiu outros caminhos nas ciências sociais – especialmente dentro da antropologia – que buscavam um compromisso com a ciência pela ciência e alheios à justificativa política para a colonização de povos ou para posturas racistas. Durante a segunda metade do século, o debate teórico da antropologia era marcado por controvérsias sobre a preponderância de fatores ambientais ou sociais na determinação de traços culturais humanos. De um lado, teóricos como Ratzel, Huntington e Taylor eram partidários das abordagens do determinismo ambiental, segundo o qual o ambiente molda a evolução cultural. De outro, autores como Boas, Lowie e Goldenweiser defendiam o determinismo cultural, no qual o ambiente era fator secundário diante das forças socioeconômicas na evolução de práticas e tradições sociais (MORAN, 2000). Essa discussão prolongou-se ao longo da primeira metade do século XX, quando estudos de caso mais aprofundados começaram a mostrar que a relação entre as práticas humanas e seu meio ambiente imediato era mais complexa do que se pensava. Dentro da antropologia, a noção de adaptação recebeu uma abordagem amoral, sendo empregada como um conceito explicativo para descrever a evolução cultura-ambiente.

De relevância para o presente trabalho, está a pesquisa realizada por Julian Steward a partir da década de 1930. Antropólogo e ecologista cultural, Steward aplica o conceito de adaptação como ajuste cultural (SMIT; WANDEL, 2006). Nas décadas seguintes, diferentes correntes do pensamento social[3] deram continuidade às reflexões sobre a adaptabilidade humana ao ambiente (MORAN, 2000).

Apesar de semelhantes como noção, as acepções de adaptação da biologia e da antropologia possuem diferenças fundamentais. Conceitualmente, adaptação biológica descreve uma característica aperfeiçoada pela seleção natural ou refere-se ao processo de modificação que resulta em unidades biológicas mais aptas a uma determinada pressão do meio ambiente (FUTUYMA, 2002). Já adaptação cultural é um conceito analítico empregado para descrever o processo por meio do qual a espécie humana, como entidade cultural, ajusta suas práticas ao ambiente no qual se encontra (HEAD, 2010; NORBERG e CUMMING, 2008). Quanto ao escopo temporal, a adaptação biológica opera durante longos períodos de tempo (milhares/milhões de anos), enquanto a adaptação cultural abrange horizontes temporais relativamente curtos (décadas, séculos, milênios). Quanto às unidades adaptativas, na abordagem biológica costumam ser genótipos, fenótipos, indivíduos ou populações biológicas; na pesquisa antropológica, as unidades adaptativas são povos, práticas, comportamentos e tradições culturais.

No que tange a avaliação da efetividade da adaptação, a biologia analisa o sucesso reprodutivo, enquanto as abordagens antropológicas tomam por referências a performance em aspectos socioeconômicos, relacionados à saúde, bem-estar, adequação nutricional etc. (BATES; PLOG, 1991). Por fim, a adaptação biológica é entendida como produto de um processo não intencional: variações são geradas por mecanismos “cegos” (mutação, recombinação gênica e recombinação genotípica) e se tornam adaptativas quando selecionadas pelo meio. Já a adaptação antropológica é um processo deliberado, intencional, no qual decisões, escolhas e planejamento guiam ajustes e inovações culturais adaptativas (ADGER et al., 2009).

A apropriação equivocada e parcial das ideias desenvolvidas na biologia evolutiva por linhas das ciências sociais e ideologias políticas do final do século XIX ainda ressoa em pleno século XXI em barreiras ilusórias e resistências para que o debate interdisciplinar ocorra livre de preconceitos e bairrismos epistêmicos. Muitos cientistas das Humanidades não olham com bons olhos qualquer menção ao termo adaptação quando a referência são sistemas sociais. O darwinismo social, sua presença durante a gestação das Ciências Sociais, ainda é confundido com as ideias de Darwin em si. Em última análise, os mal- entendidos em torno do uso do termo adaptação resultam de uma incompreensão da noção e dos conceitos subjacentes, de modo que as discordâncias encontram-se mais em preferências subjetivas do que em divergências teóricas. Essas barreiras no diálogo interdisciplinar se manifestam no uso do termo adaptação dentro do contexto da mudança climática. Compreender como a noção se desenvolveu e é usada nesse âmbito é importante para construir pontes e evitar atritos desnecessários que retardam o avanço de uma agenda propositiva.

A pesquisa sobre adaptação à mudança climática tem suas raízes na abordagem da ecologia política, corrente que surge na década de 1970 sob forte influência da ecologia cultural de Steward (WALKER, 2005; PAULSON et al., 2003). Apesar de ser um desdobramento da tradição antropológica, a pesquisa sobre adaptação à mudança climática  possui, pelo menos, duas particularidades que justificam ser tratada como uma linha teórica autônoma. A primeira, o fato de ir além das fronteiras da antropologia. A noção de adaptação da ecologia política somou-se às abordagens da geografia (vulnerabilidade) e da ecologia (resiliência) para configurar, nas últimas duas décadas do século XX, um campo de pesquisa interdisciplinar referido como pesquisa sobre Impactos, vulnerabilidade e adaptação à mudança climática, ou simplesmente pesquisa em adaptação à mudança climática (LINDOSO, 2013). A segunda particularidade é o seu caráter orientado para a política. Isso implica que a produção do conhecimento guia-se não só pelo seu valor científico (ciência pela ciência), mas também pela relevância da informação como subsídio à tomada de decisão adaptativa.

Na literatura científica especializada, adaptação pode fazer referência tanto ao processo de se adaptar quanto à condição de adaptado (SMIT et al., 1999). Como condição, refere-se a características que tornam o sistema mais resistente, em sua estrutura e funcionamento, aos distúrbios climáticos adversos ou que confiram a este a habilidade de aproveitar oportunidades (BARNETT, 2010). Como processo, é contínua e incremental (TOL et al., 1998). A intervenção política visando à adaptação é frequentemente associada à abordagem da gestão de riscos (HOWDEN et al., 2007; SMIT; SKINNER, 2002).

O terceiro relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, 2001) define adaptação como “ajuste em sistemas humanos e naturais em resposta a atual ou futuro estímulo climático ou seus efeitos, podendo moderar dano ou explorar oportunidades benéficas” (anexo B: Glossário de Termos[4]). Já Brooks (2003, p. 8) define adaptação como: “ajuste no comportamento e nas características de um sistema que melhora sua habilidade em lidar com estresse externo”. Por sua vez, Pielke (1998, p. 159) conceitua como “ajuste no comportamento de grupos individuais e institucionais tendo em vista reduzir a vulnerabilidade da sociedade ao clima.” Kasperson et al. (2005) diferenciam ajuste e adaptação, compreendendo o primeiro como mudanças superficiais e não estruturantes nas características de um sistema, frequentemente de curto prazo, enquanto a adaptação envolve mudanças mais profundas nos sistemas, podendo inclusive transitar para um nova configuração.

De forma semelhante, outros autores também exploram adaptação como um espectro de respostas, desde pequenos ajustes superficiais de curto prazo até transformações estruturantes e mudanças de paradigmas de médio e longo prazo (HOWDEN et al., 2007; MOSER; EKSTROM, 2010). A adaptação à mudança climática também ganha ênfases diferentes, porém complementares, dependendo da abordagem na qual é usada (LINDOSO, 2013). Dentro da literatura da vulnerabilidade, por exemplo, adaptação é redução de sensibilidades climáticas e aumento da capacidade adaptativa. Já no âmbito da literatura sobre resiliência socioecológica, adaptação é sinônimo de construção de resiliência, sendo associada ao aperfeiçoamento de processos, como aprendizagem, memória, desenvolvimento.

Do ponto de vista analítico, várias tipologias têm sido propostas para classificar o processo adaptativo e as estratégias de adaptação, tomando por referência sua natureza, duração, intencionalidade, agência, momento em que ocorre em relação ao estímulo, forma, entre outras (BRYANT et al., 2000; SMIT; SKINNER, 2002; SMIT et al., 2000; FORD et al., 2010).

Quanto ao momento (timing) em que ocorre em relação ao estímulo climático, a adaptação pode ser classificada como antecipatória (i.e. proativa ou ex-ante), coetânea (i.e. concorrente ou simultânea) ou responsiva (i.e. reativa ou ex-post) (BRYANT et al., 2000). Contudo, em algumas situações, essa distinção não é tão clara, como no caso do produtor que faz ajustes em seu sistema agrícola após vivenciar anos consecutivos de seca (adaptação responsiva), tendo por objetivo estar mais bem preparado para condições semelhantes no futuro (adaptação antecipatória) (SMIT; SKINNER, 2002).

As adaptações também podem ser classificadas quanto à duração ou escopo temporal. Neste contexto, são classificadas como de curto prazo (táticas) ou de longo prazo (estratégicas). A primeira consiste em acomodar os impactos de um determinado estímulo climático, enquanto a segunda refere-se a ajustes estruturais nos sistemas, buscando torná-los menos vulneráveis a distúrbios futuros (SMIT et al., 2000). Na agropecuária, a venda do gado, atraso do plantio ou aquisição de ração durante uma seca extrema são alguns exemplos de adaptação tática, enquanto mudança das variedades agrícolas e ou construção de represas são exemplos de adaptações de longo prazo ou estratégicas (SMIT; SKINNER, 2002).

A adaptação também pode ser classificada segundo sua intencionalidade: se planejada (intencional ou ativa) ou se espontânea (autônoma ou passiva). Adaptações planejadas são ações empreendidas com o intuito explícito de tornar os sistemas menos vulneráveis ao clima. São geralmente associadas à ação governamental por meio de políticas públicas específicas (SMIT et al., 1996) Já adaptações espontâneas ou autônomas são aquelas nas quais a adaptação é um subproduto colateral de uma ação visando outro objetivo (SMITHERS; SMIT, 1997). Alguns autores diferenciam a adaptação segundo a esfera à qual o agente da adaptação pertence (pública ou privada) e segundo a escala espacial da adaptação (i.e. localizada ou ampla) (SMIT et al., 1996; SMIT et al., 1999).

Outra distinção refere-se à natureza ou forma da adaptação, que pode ser estrutural, legal, institucional, regulatória, financeira, tecnológica, informacional, comportamental, educacional, entre outras (BRYANT et al., 2000; SMIT et al., 1999; SMIT et al., 2000; SMITHERS; SMIT, 1997). No âmbito da agricultura, por exemplo, Smit e Skinner (2002) sugerem que a adaptação assume as formas administrativa, financeira, institucional, legal, gerencial, organizacional, política, de manejo, estrutural e tecnológica.

Por fim, a adaptação pode ser classificada segundo seu resultado ou função, também referida como objetivo primário da adaptação, como recuar, reduzir riscos, proteger, acomodar, assegurar renda e recursos etc. (FORD et al., 2010; SMIT et al., 1999). Tais objetivos são genéricos, de modo que cada setor apresenta formas próprias de atingir os objetivos primários. Em áreas costeiras, por exemplo, reduzir riscos pode ser construir barreiras físicas para impedir o avanço do mar, enquanto na agricultura reduzir riscos pode ser adotar uma variedade mais tolerante a pestes.

Nem sempre é óbvio ou fácil incluir uma estratégia adaptativa em uma única tipologia ou distinguir a quantas tipologias ela pertence. As categorias apresentadas acima são artificiais, mas úteis na organização das ideias e como norteador da análise, especialmente quando é necessário ponderar o potencial de cada estratégia em reduzir vulnerabilidades. Assim, o portfólio de adaptações pode ser organizado segundo objetivos da adaptação, timing, natureza, escopo temporal etc., de modo que o tomador de decisão tenha um “cardápio” de respostas a partir do qual ele possa montar um repertório desejável a cada situação.

Lindoso (2013), por exemplo, propôs tipologias específicas para a realidade da agricultura familiar do semiárido brasileiro, compreendendo categorias mencionadas acima e sugerindo novas, específicas da realidade estudada. Com base em uma pesquisa qualitativa e quantitativa, em uma amostra de 500 produtores distribuídos por 10 municípios de 3 estados da região, ele identificou categorias para classificar as estratégias adaptativas do setor. Os resultados são potencialmente relevantes para a tomada de decisão. O uso de tipologias revelou que o repertório de adaptação acessado pelos produtores baseia-se principalmente no aporte externo de recursos (financeiros, alimentares e hídricos), de forma responsiva ou coetânea aos distúrbios climáticos, com pouca ênfase em ajustes que favoreçam a autonomia dos sistemas familiares e de estratégias preventivas que se antecipem aos problemas. Análises como essa, baseada em tipologias, facilitam avaliar não só quantitativamente a adaptação dos sistemas-alvo, como também analisar a qualidade da adaptação e, assim, desenhar intervenções políticas mais efetivas e orientadas.

 

ADAPTAÇÃO: EVOLUÇÃO DA AGENDA POLÍTICA

A percepção da mudança climática como um risco ambiental global é relativamente recente. Foi apenas em meados da década de 1970 que a ciência produzida sobre os mecanismos da mudança climática alcançou um volume crítico para que a questão passasse de uma especulação científica para uma hipótese provável e de apelo político (NORDHAUS, 1975). Na década de 1980, ganha grande espaço na agenda científica e é incorporada de forma mais efetiva no debate político internacional. Essa trajetória culmina, em 1988, no reconhecimento oficial, pela assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), da mudança climática como uma preocupação comum da humanidade (BODANSKY, 2001). No mesmo ano, é criado o IPCC, sob os auspícios de duas agências da ONU: a Organização Mundial de Meteorologia (OMM) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUD). Esses passos são simbólicos, pois marcam o início da institucionalização da questão em arranjos políticos e científicos internacionais (LINDOSO; MARIA, 2013). Uma vez reconhecido o risco climático, o passo seguinte era implementar formas de frear a taxa de mudança e administrar seus impactos.

Ainda na década de 1970, debates iniciais questionavam quais seriam as principais abordagens para enfrentar o problema (WEART, 2003). Neste contexto, dois conjuntos de estratégias foram elencados: a primeira, mitigação[5], visa moderar as causas, ou seja, reduzir as concentrações de gases de efeito estufa (GEE) que levam ao aquecimento global, seja pelo controle das fontes humanas ou pelo fortalecimento dos sumidouros. A segunda, adaptação, tem por objetivo evitar ou moderar os impactos. Incialmente, justificar esforços de mitigação era relativamente mais simples: a despeito das grandes incertezas quanto aos meandros dos mecanismos climáticos do aquecimento, estava claro que controlar as emissões antrópicas de GEE resultaria no refreamento da elevação das temperaturas médias globais resultantes de causas humanas.

Em contrapartida, emplacar medidas de adaptação na agenda política era mais complicado. As incertezas sobre como o aquecimento ia se manifestar em termos de mudança nos padrões de precipitação e na frequência de eventos extremos dificultava identificar quais ações seriam mais adequadas (NORDHAUS, 1975). Assim, a adaptação foi vista como estratégia marginal nos primeiros anos das negociações internacionais em torno do tema, assim como recebeu, proporcionalmente, pouca atenção da comunidade científica que se formava em torno do tema (ADGER et al., 2009). A pesquisa desenvolvida pela ecologia política, a geografia humana, a resiliência socioecológica, entre outras linhas teóricas que já vinham trabalhando na relação adaptativa homem e meio ambiente, naturalmente ocuparam posição protagonista na comunidade em construção e tiveram na mudança climática um tema central nas décadas seguintes, evoluindo, em grande medida, em resposta às demandas da tomada de decisão (LINDOSO, 2013).

Durante os encontros que precederam a criação da Convenção-Quadro das Nações Unidades sobre Mudança do Clima (CQNUMC), em 1992, a Austrália, a Nova Zelândia e a Aliança dos Pequenos Estados insulares (Alliance of Small Islands States – Aosis) pressionaram pela incorporação de uma definição de adaptação no texto-base da Convenção e de um programa específico dedicado ao tema (SCHIPPER, 2006). Contudo, os esforços não tiveram resultados imediatos, e a mitigação prevaleceu como objetivo principal da Convenção sobre o Clima, fato expresso em seu art. 2:

 

O objetivo último desta Convenção e de quaisquer instrumentos legais que a Conferência das Partes venha a adotar é […] estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa atmosféricos em um nível que previna interferências antropogênicas perigosas no sistema climático. (UNITED NATIONS FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE, 1992, tradução nossa).

 

A adaptação é relegada a uma presença secundária, mencionada apenas quatro vezes ao longo do texto base, abordada de forma genérica e subordinada aos esforços de mitigação. Desde o início das negociações internacionais, foi vinculada à noção de justiça climática (HUQ; REID, 2004). Esta noção reconhece que as causas, impactos e capacidades adaptativas são distribuídos de forma desigual globalmente. Sem estabelecer prazos, o texto base da Convenção estabeleceu que mecanismos de financiamento da adaptação deveriam ser adotados posteriormente. Contudo, não previu instrumentos ou programas específicos que pudessem viabilizar uma agenda prática sobre o tema (PIELKE et al., 2007; UNITED NATIONS FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE, 1992). Assim, nos primeiros anos da construção da agenda climática internacional, a adaptação teve um papel discreto no debate e nas ações tomadas. Esse quadro começa mudar a partir da década de 2000. Uma confluência de fatores cria um contexto favorável para que o tema começasse a ganhar evidência crescente na agenda da ONU e em outras agendas políticas internacionais.

Um primeiro fator foi o avanço da ciência do clima desde que o primeiro relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) foi publicado, em 1990. As novas evidências corroboravam a influência humana no aquecimento global e apontavam tendências climáticas alarmantes para o final do século XXI, caso nada fosse feito (CARTER et al., 2007). A ciência sobre adaptação também havia ganhado volume, reunindo uma base teórico-metodológica para apoiar a tomada de decisão de forma mais substancial em relação à década anterior. A partir do Terceiro Relatório do IPCC (TAR), publicado em 2001, um grupo de trabalho específico do Painel passa a se dedicar aos temas impactos, vulnerabilidade e adaptação (McCARTHY, 2001). Isso consolidou ainda mais a mudança climática como um risco global relevante e pressionou os países a mostrarem maior disposição em discutir formas de responder ao problema (MORRIS; KRISHNAN, 2012).

Um segundo fator foi a morosidade das negociações do Protocolo de Quioto, a qual derrubou o otimismo quanto ao sucesso da mitigação, predominante na criação da CQNUMC. A despeito da grande expectativa quanto aos resultados do Protocolo, este foi ratificado com grandes dificuldades em 2005, sem o endosso do principal emissor global: os EUA (STREIMIKIENE; GIRDZIJAUSKAS, 2009). Esse foi um sinal de que a mitigação ficaria aquém do necessário para evitar cenários climáticos extremos (PARRY et al., 2009). Outro fator foi uma série de extremos climáticos com grande impacto e repercussão durante a década de 2000. O Furacão Katrina (2005) e a seca prolongada na Austrália trouxeram os desastres climáticos para o território de países desenvolvidos, mostrando que até mesmo estes, ricos e poderosos, apresentavam vulnerabilidades e necessidades de adaptação (IRELAND, 2010). É difícil mensurar como tais eventos influenciam a opinião pública e a ação política sobre mudança climática. Todavia, sem dúvida estabeleceram uma referência contra a qual governos, antes arredios em debater a mudança climática, não poderiam confrontar de forma leviana.

Por fim, mas não menos importante, os países em desenvolvimento uniram forças e passaram a pressionar por uma relevância maior da adaptação nas pautas de negociações da Convenção (decisão1/COP8, 2002). É nesse contexto que a adaptação emerge como resposta possível, necessária e urgente no debate político internacional sobre mudança climática (DOVERS, 2009; PARRY et al., 2009).

 

ADAPTAÇÃO À MUDANÇA CLIMÁTICA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A abordagem científica explica parte da evolução do conceito de adaptação dentro do contexto da mudança climática. A relevância da tomada de decisão agregou um caráter político à acepção que tem implicações, relativamente pouco exploradas, para a inserção do tema na agenda de desenvolvimento.

O texto base da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC) fundamenta-se no princípio da adicionalidade, segundo a qual a adaptação seria apenas o ajuste aos impactos oriundos da “mudança climática antropogênica” (UNITED NATIONS FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE, 1992). A adaptação como ajuste à variabilidade climática natural foi deliberadamente excluída da definição. Tal exclusão tinha como objetivo evitar que a agenda da CQNUMC se sobrepusesse à de outras agendas da ONU, associadas ao desenvolvimento (i.e. Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA e PNUD), mais antigas e indiretamente associadas à variabilidade climática (HUQ; REID, 2004).

A autonomia entre as agendas contou com o apoio de muitos países em desenvolvimento, os quais temiam que os recursos já destinados à ajuda humanitária internacional fossem convertidos em financiamento de adaptação, sem que recursos adicionais fossem mobilizados (AYERS; HUQ, 2009). Apesar da justificativa política, a estreiteza conceitual sobre adaptação adotada pela CQNUMC vem sendo duramente criticada à medida que ficam evidentes os riscos de distorções políticas (PIELKE et al., 2007).

Desse incômodo, durante a década de 2000, surge uma abordagem integrativa que defende que a normalização (ou mainstreaming) da adaptação na agenda do desenvolvimento (ADGER et al., 2009; DOVERS, 2009; HOWDEN et al., 2007; HUQ; REID, 2004; LAHSEN et al., 2010; SMIT; WANDEL, 2006). As críticas à perspectiva da CQNUMC trazida pelos teóricos da linha da normalização baseiam-se em quatro pontos.

Primeiro, o fato de o princípio da adicionalidade ser difícil de ser mensurado na prática. Isso se deve, por um lado, à dificuldade em estabelecer uma linha de base a partir da qual o impacto humano adicional seria calculado. Diante de um desastre climático, como uma seca ou um furacão, é muito difícil discriminar o quanto do fenômeno se deve a interferência humana no clima do quanto é natural. Por outro lado, o impacto adicional também depende do sucesso dos esforços de mitigação. Se as metas de redução das emissões de GEE forem cumpridas, o impacto humano será menor do que aquele esperado em cenários nos quais as metas são ignoradas ou parcialmente atingidas. Em ambos os casos, as incertezas científicas e/ou políticas inibem qualquer prognóstico confiável que possa servir de referência para guiar a necessidade de adaptação à mudança climática de origem antropogênica (ADGER et al., 2009; SMITH et al., 2010). Portanto, o princípio da adicionalidade, subentendido no conceito da ONU de adaptação, subordina a ação à efetividade dos esforços de mitigação, reforçando a proeminência da mitigação na agenda climática e retardando a adaptação (PARRY et al., 2009).

Segundo, reduzir a adaptação a ajustes à mudança climática antropogênica ignora o déficit adaptativo já existente na gestão da variabilidade natural do clima, especialmente em países em desenvolvimento, que são periodicamente afetados por desastres climáticos. Alguns entendem como contraproducente fazer investimentos complexos em adaptação pensando em cenários extremos futuros, em vez de mirar em hiatos mais imediatos na gestão de desastre naturais e relativos à variabilidade natural. Estes teriam resultados amplos na redução do risco climático, tanto no de causa humana quanto no de causa natural (PIELKE et al., 2007). Distorções políticas graves poderiam resultar, como a adoção de medidas pouco efetivas e de alto custo, visando reduzir impactos climáticos adicionais, projetadas em detrimento de outras mais eficazes e baratas, voltadas para impactos de causas climáticas naturais (GOKLANY, 2004; RODOLFO; SIRINGAN, 2006; HOWDEN et al., 2007). Essas considerações são importantes em um mundo no qual a atenção política é escassa (PIELKE et al., 2007).

Terceiro, políticas de desenvolvimento, em geral, interferem (tanto positivamente quanto negativamente) na adaptação à mudança climática. Frequentemente, setores e sistemas estão inseridos em contextos de multiexposição, no qual vetores socioeconômicos e ambientais diversos são mais relevantes que os climáticos na determinação da vulnerabilidade (O’BRIEN et al., 2006). Globalização, dinâmicas demográficas (i.e. emigração, crescimento da população), rearranjos na estrutura social e guerras somam-se aos fatores climáticos como distúrbios que desencadeiam o processo adaptativo (IBNOUF, 2011; JONES; BOYD, 2011; O’BRIEN; LEICHENKO, 2000; O’BRIEN et al., 2004; SANCHES-CORTÉS; CHAVERO, 2011). Investimentos em aspectos socioeconômicos e político-institucionais – alvos costumeiros das políticas de desenvolvimento e independentes do estímulo climático – são frequentemente adaptativos à mudança climática (ADGER et al., 2009; LAHSEN et al., 2010, PIELKE et al., 2007).

Quarto, os impactos climáticos ameaçam objetivos do desenvolvimento sustentável, como promoção da equidade, redução da pobreza, viabilidade de comunidades e manutenção da herança cultural (HUQ; REID, 2004; AYERS; HUQ, 2009; O’BRIEN et al., 2006; YOHE et al., 2007). Assim, a adaptação bem sucedida vai ao encontro das diretrizes do desenvolvimento sustentável.

Em suma, a adaptação e o desenvolvimento são processos empiricamente indissociáveis. Isolar o vetor climático talvez seja útil em um primeiro momento da análise, mas raramente a adaptação ocorre exclusivamente em resposta a ele (BERRANG-FORD et al., 2011; SMIT; WANDEL, 2006; LAHSEN et al., 2010). Compreender essa inter-relação é o primeiro passo para aproximar as agendas políticas e científicas (SIMÕES et al., 2010). Contudo, isso traz questões normativas para as definições de adaptação, de forma semelhante a que traz para as acepções de desenvolvimento sustentável (DS). Enquanto é possível estabelecer critérios objetivos para avaliar a saúde dos ecossistemas ou a viabilidade econômica de uma atividade, as necessidades humanas como felicidade, bem-estar, liberdade, equidade são noções normativas (VUCETICH; NELSON, 2010). O quanto de degradação ambiental é aceitável para produzir “prosperidade” econômica? Qual o contexto material mínimo para a felicidade? O que define liberdade e equidade: ampla capacidade de consumo? Direito irrestrito de ir e vir? Apesar da história da ciência estar repleta de tentativas, tais questões não estão sujeitas ao escrutínio objetivo da academia, verificáveis por meio de hipóteses, método e experimentação científica (BERLIN, 2009).

Isso implica que na trajetória do desenvolvimento sustentável, a sustentabilidade é uma escolha coletiva baseada em critérios diversos sobre o que é socialmente desejável. Tal característica incorpora um caráter dúbio na ciência produzida sobre sustentabilidade: por um lado positiva no que tange as questões sobre como é o desenvolvimento; por outro lado, normativa quando trata sobre como o desenvolvimento deveria ser. É por esse motivo que desenvolvimento sustentável não é objetivo a ser atingido, mas um caminhar que pode adotar um amplo conjunto de trilhas. O resultado é um campo discursivo no qual desenvolvimento sustentável é interpretado segundo diferentes interesses, objetivos, valores e visões de mundo que dialogam e travam embates na definição da trajetória a ser seguida no processo de desenvolvimento (HOPWOOD et al., 2005).

A adaptação à mudança climática se insere nesse debate, quando compreendida para além de seu aspecto objetivo (redução de vulnerabilidade ou construção de resiliência) e entendida dentro de um contexto político embebido no próprio processo de desenvolvimento. Uma opção adaptativa pode ser ponderada diante de sua capacidade em moderar sensibilidades ou fomentar capacidades adaptativas ao clima. Porém, sua relevância e efetividade só fazem sentido na medida em que dialogam com os objetivos mais amplos vinculados ao desenvolvimento sustentável.

Por esse motivo, as definições científicas sobre adaptação à mudança climática são insuficientes quando transitam para a agenda política. Nem toda adaptação está em sintonia com os objetivos do desenvolvimento sustentável (HILHORST; BANKOFF, 2008; AYERS; HUQ, 2009). Por exemplo, Cissé et al. (2012) discutem a expansão da cultura do arroz em regiões semidesérticas do Mali, viabilizada graças a grandes projetos de irrigação, uma estratégia comumente tida como adaptativa em regiões de chuvas erráticas. Os autores argumentam que o desenvolvimento agrícola prosperou à custa de grande passivo socioambiental, como contaminação dos recursos hídricos e do solo por agroquímicos, concentração fundiária e erosão cultural. Já em comunidades agrícolas no Sudão, Ibnouf (2011) descreve a migração masculina como uma das principais repostas à seca. Em um primeiro momento, essa estratégia é adaptativa, uma vez que a remessa de recursos pelos migrantes serve como um suporte importante em momentos de crise. Todavia, a autora observou que a lacuna de mão de obra masculina é preenchida pelas mulheres, que agregam às suas atividades domésticas cotidianas, tarefas agrícolas. Por conseguinte, a sobrecarga de trabalho feminino compromete a qualidade de vida das mulheres e levanta questões sobre equidade de gênero.

No caso brasileiro, temos exemplos recentes emblemáticos. A construção de termoelétricas foi uma das respostas após a crise energética de 1999-2001, conferindo uma fonte estratégica a ser acionada caso os reservatórios hidrelétricos chegassem a níveis críticos novamente. Esse foi o caso em 2014/2015, quando as termoelétricas funcionaram a todo vapor. Todavia, essa medida tem implicações negativas: encarecimento do custo da energia e o aumento nas emissões nacionais de GEE. Situação semelhante pode ser observada na crise hídrica de São Paulo, no mesmo período. Redução da pressão da água distribuída para as residências, interligação dos sistemas paulistas com reservatórios que abastecem outros estados, diminuição na oferta de água para indústrias e agricultura foram algumas das medidas adaptativa elencadas para lidar com a escassez hídrica – que tem, entre as raízes, uma sequência de estações chuvosas abaixo da média. Essas opções têm efeitos colaterais negativos, como deficiência no abastecimento hídrico humano, potenciais conflitos políticos e prejuízos econômicos. No sentido estrito do conceito de adaptação adotado na literatura cientifica, como ajuste nos sistemas humanos para reduzir impactos climáticos, todas essas medidas são adaptativas. Mas será que são desejáveis? O objetivo deste trabalho não é responder a esta pergunta, mas evidenciar que a adoção de estratégias adaptativas envolve decisões normativas que fogem a abordagens exclusivamente científicas sobre adaptação à mudança climática.

De forma semelhante, nem todo desenvolvimento é adaptativo. Por exemplo, programas de urbanização, em um primeiro momento, absorvem a demanda habitacional. Todavia, se implementados em áreas sujeitas a risco de enchentes e deslizamentos de terra resultam, no longo prazo, em maladaptações que terão de ser administradas com alto custo social e econômico (O’HARE; RIVAS, 2005). Um exemplo emblemático foi o caso do deslizamento de terra que matou, em janeiro de 2010, centenas de pessoas no Morro do Bumba, em Niterói. A comunidade, construída sobre um antigo lixão desativado, localizado em uma encosta de morro, foi alvo de processo de urbanização governamental mesmo diante dos riscos climáticos evidentes. Tomando apenas do ponto de vista do desenvolvimento urbano, a medida pode ser vista como positiva, mas legitimou um contexto de alta vulnerabilidade que resultou em desastre com prejuízos irreparáveis.

Um processo de desenvolvimento não pode ser sustentável se aumenta a vulnerabilidade dos sistemas e setores ao clima. Portanto, o Desenvolvimento Sustentável é, por princípio, adaptativo (BAUER; SCHOLZ, 2010). Por sua vez, a adaptação à mudança climática, ao criar contextos mais estáveis, viabiliza condições favoráveis para que os objetivos do desenvolvimento sustentável sejam implementados (PIELKE et al., 2007). Dessa forma, o desenvolvimento autônomo e pouco articulado das agendas de adaptação à mudança climática e ao desenvolvimento sustentável pode levar a maladaptações, aumento de desigualdades socioeconômicas e sobrecarga ecossistêmica, pouco claras aos atores envolvidos exclusivamente com uma ou outra agenda. Os trade-offs e sinergias entre adaptação e desenvolvimento precisam ser evidenciados e incorporados na governança ambiental e social, de modo a planejar e empreender ações políticas que se somam e complementam em vez de se sobreporem ou, até mesmo, se anularem.

Este trabalho finaliza propondo o emprego de dois conceitos normativos que sintetizam a interdependência das agendas: adaptação sustentável e desenvolvimento adaptativo.

Adaptação sustentável refere-se às ações de adaptação que atendem aos critérios do Desenvolvimento Sustentável (DS): ser economicamente viável, atuar dentro da capacidade de suporte dos ecossistemas e promover equidade política e socioeconômica. Cada opção, estratégia e medida de adaptação deveria ser avaliada segundo esses critérios. Ademais, considerando que os efeitos adversos da mudança climática irão retardar e até mesmo impedir esforços rumo a metas do DS, a adaptação sustentável também abrange ações que reduzem vulnerabilidades e, por consequência, estabelecem ambientes mais estáveis para que ele possa ocorrer.

desenvolvimento adaptativo refere-se à normalização da adaptação na agenda do desenvolvimento. Abrange programas, políticas e ações de desenvolvimento cujos resultados conciliam os objetivos da sustentabilidade e da redução da vulnerabilidade climática. Um primeiro passo no sentido da normalização é identificar arcabouços político-institucionais que possam servir de pontos de entrada para explorar as relações entre desenvolvimento e adaptação (DOVERS, 2009). Setores tradicionalmente associados à gestão de risco climático, como recursos hídricos, gestão de zonas costeiras, agricultura, desenvolvimento urbano são alvos potenciais (HUQ; REID, 2004; HOWDEN et al., 2007). Nesses casos, incorporar cenários climáticos no planejamento do desenvolvimento setorial de longo prazo é uma forma de promover a normalização (AYERS; HUQ, 2009; SMITH et al., 2010). Políticas que atacam as causas sociais subjacentes da vulnerabilidade também são adaptativas, mesmo que a mudança climática não seja o objetivo explícito (Ford et al., 2010). Redução da pobreza, gestão do uso da terra e manejo dos recursos naturais são alguns exemplos (LAHSEN et al., 2010). Somam-se a esses a promoção da equidade no acesso a recursos adaptativos, o fomento a educação, a difusão de informação/tecnologias e o fortalecimento da capacidade institucional (YOHE et al., 2007; LAHSEN et al., 2010). Nesse sentido, o resultado são sociedades mais robustas e resilientes, não só às mudanças climáticas, mas às mudanças em geral (PIELKE et al., 2007).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A noção científica de adaptação permaneceu, em essência, a mesma dos primórdios da biologia evolutiva e de seu emprego no âmbito da mudança climática. Há um continum científico que foi sendo ajustado à medida que a noção rompeu os limites da biologia e foi usada como noção explicativa em contextos socioecológicos complexos. Há uma tendência natural das formações disciplinares aprisionarem o cientista no interior de bairrismos epistêmicos que o impossibilitam de enxergar conexões entre teorias, abordagens e perspectivas diferentes das suas. Esse é um dos desafios centrais da agenda científica climática, visto que ela é por essência interdisciplinar. Nesse âmbito, mais que uma disputa entre teorias sobre adaptação, existe uma complementariedade entre elas, cada qual compartilhando uma noção comum, mas debruçando-se sobre diferentes recortes e processos da realidade, e lançando mão de mecanismos, temporalidades e abordagens científicas próprias de cada disciplina.

A pesquisa sobre adaptação à mudança climática surge como uma dessas abordagens, com a particularidade de transitar na interface ciência e política. Uma das implicações conceituais desse caráter anfíbio é a natureza normativa da adaptação, que se soma à natureza objetiva oriunda da abordagem científica. Essa questão não é muito desenvolvida na literatura científica, nem na literatura política, nas quais, geralmente, a adaptação é definida de forma genérica, dada a priori, sem reflexões críticas. Mas à medida que a adaptação deixa de ser um conceito descritivo de fundo e ganha materialidade na prática política, fica evidente que nem toda adaptação à mudança climática é desejável ou vai ao encontro dos objetivos do desenvolvimento sustentável. Ao mesmo tempo, dá-se a aproximação natural entre as agendas de desenvolvimento e climática, e incompatibilidades entre medidas de desenvolvimento setoriais, tidas como positivas, revelam-se fonte de vulnerabilidade climática quando vistas de uma perspectiva mais ampla.

A necessidade de evidenciar, na agenda política, as sinergias e antagonismos entre desenvolvimento e adaptação à mudança climática levou à proposição, neste artigo, dos conceitos normativos de adaptação sustentável e desenvolvimento adaptativo. Essa distinção é um recurso discursivo, uma diferenciação retórica para explicitar olhares transversais na tomada de decisão. Entretanto, empiricamente, desenvolvimento sustentável e adaptação são parte do mesmo processo. Exercitar essa perspectiva é um dos desafios centrais na agenda climática das próximas décadas.

 


 

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[1] Doutor em Desenvolvimento Sustentável (CDS/UnB), pesquisador da Sub-rede Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Regional, Rede Clima. Email: diegoplindoso@gmail.com

[2] Eugenia: estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente

[3] Antropologia ecológica, ecologia histórica, economia política e ecologia política.

[4] “Adjustment in natural or human systems in response to actual or expected climatic stimuli or their effects, which moderates harm or exploits beneficial opportunities” (http://www.grida.no/publications/other/ipcc_tar/).

[5] No debate inicial sobre as formas de enfrentamento da mudança climática, era empregado o termo limitação (limitation) para se referir ao controle das emissões de GEE. O termo mitigação passa a ser amplamente adotado no início da década de 1990

Adaptação à mudança climática: ciência, política e desenvolvimento sustentável


Diego Pereira Lindoso[1]


RESUMO: A adaptação é um tema historicamente secundário na agenda climática frente a mitigação, ganhando expressão significativa apenas a partir de meados da década de 2000. Como noção, entrou na pauta cientifica no século XIX e seguiu uma longa trajetória até ganhar a espaço na pauta política climática no século XXI. O presente artigo se propõe a analisar essa trajetória como continum científico interdisciplinar que rompe a barreira da academia e ganha novos contornos, não objetivos, como conceito político-científico. Na primeira parte descreve a evolução científica do conceito, incluindo suas acepções e tipologias na pesquisa sobre mudança climática. A segunda parte aborda o desenvolvimento do tema na agenda política internacional, enquanto a terceira discute as implicações do conceito para a agenda do desenvolvimento sustentável. Dois conceitos normativos são propostos no intuito de evidenciar as sinergias e antagonismos entre desenvolvimento e adaptação no discurso político: adaptação sustentável e desenvolvimento adaptativo.

PALAVRAS-CHAVE: Mudança climática. Adaptação. Desenvolvimento sustentável.


ABSTRACT: Historically, adaptation was marginal in climate change agenda compared to mitigation, until the late 2000s, when it gained expression in the debate. As a notion, adaptation had been introduced in scientific arena during the 19th century and since then presented a long development until it reached climate change discussions in early 21th century. The present paper analyses such development as an interdisciplinary scientific continum that breaks academic walls and receive non-objective outlines as a political-scientific concept. The first part of the paper describes the scientific evolution of the adaptation concept, including definitions and typologies used in climate change research. The second part points out how adaptation developed on the international agenda. Finally, the third part discusses the implications of the concept to sustainable development agenda. Two normative concepts are proposed in order to highlight synergies and antagonisms between development and adaptation on the political debate: sustainable adaptation and adaptive development.

KEYWORDS: Climate change. Adaptation. Sustainable development.