Domesticação do caos ou: Maria Mãe de Deus (tríptico)

Título:Domesticação do caos ou: Maria Mãe de Deus (tríptico)


Autor: Gabriel Cid de Garcia

Produtor cultural, Casa da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professor-tutor da Escola de História do Centro de Educação à Distância da Universidade da Universidade do Rio de Janeiro (Cead- Unirio). Doutor em Literatura Comparada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).


Resumo: As raízes podadas de uma árvore são pouco visíveis à distância. Nas cidades, o asfalto e as calçadas aparecem como protagonistas de um modo de vida organizado, erguido sobre as raízes caóticas das árvores. Apenas quando nos aproximamos de seu tronco, conseguimos perceber o emaranhado castrado, resquício dos excessos inaceitáveis de algum projeto urbanístico. Tal projeto de cidade ecoa uma cisão que reverbera um projeto político e uma disposição metafísica, admitindo como natural sua separação do ambiente. Próximas aos pés e à sujeira, as raízes evocam uma condição oposta ao homem da razão, que almeja a verticalidade hierárquica, priorizando a cabeça e a proximidade do céu. O tríptico fotográfico “Domesticação do caos ou: Maria Mãe de Deus”, parafraseando um recurso celebrado em atividades de divulgação científica (as potências de dez), busca chamar a atenção para o que é baixo, para a dimensão do chão, desafiando o automatismo das ações cotidianas. Inspirado por algumas referências de Georges Bataille acerca da noção de informe e baixo materialismo, assim como pela elaboração de Gilles Deleuze e Félix Guattari sobre a relação do pensamento com o caos, as três fotografias compõe um cenário movente que convida o espectador a pensar acerca do contraste explicitado pelas fotografias, salientado pela inscrição encontrada na árvore: “Maria Mãe de Deus”. Assegurando a verticalidade divina e o vínculo com uma dimensão transcendente, a referência à figura bíblica da mãe de Deus sugere um diálogo inusitado com outra possível imagem da maternidade, a Terra ou Gaia, mais próxima do solo e da matéria. Porém, a ênfase no elemento caótico da disposição das raízes possui como objetivo a fuga das garantias tranquilizadoras, preferindo a manutenção da tensão entre o aspecto racional (organizado, esquadrinhado) da cidade e a evidência de seu caráter tardio em relação ao solo, ao caos. Deste modo, aproxima-se o projeto da tradição do pensamento ocidental a uma espécie de projeto urbanístico de transcendência, onde as forças que povoam o real aparecem apenas de modo domesticado, relegadas aos canteiros que pontuam o calçamento. O esquecimento de seu pertencimento ao ambiente, portanto, pode fazer com que o homem acelere a sua ruína, uma vez cortados os laços com a dimensão produtiva e criativa da vida, aproximando-se cada vez mais do informe do qual buscava se afastar.

 

FICHA TÉCNICA

Domesticação do caos ou: Maria Mãe de Deus

Autor: Gabriel Cid de Garcia

Fotógrafo: Gabriel Cid de Garcia Rio de Janeiro, Brasil

2014